Título: História da educação de surdos: uma decolonialidade
possível contra a colonialidade de poder linguístico
Autor: Simone Aparecida dos Santos Silva; Hélio José Santos Maia; Regina
Lúcia Sucupira Pedroza.
Este material foi adaptado pelo Laboratório de
Acessibilidade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em conformidade
com a Lei 9.610 de 19/02/1998, não podendo ser reproduzido, modificado e
utilizado com fins comerciais.
Adaptado por: Milena Brito.
Revisado por: Alessandra Camile.
Adaptado em: Abril de 2025.
Padrão vigente a partir de março de 2022.
Referência: SILVA, Simone Aparecida dos Santos; MAIA, Hélio
José Santos; PEDROZA, Regina Lúcia Sucupira. História da educação de surdos:
uma decolonialidade possível contra a colonialidade de poder linguístico. Revista
Brasileira de Educação Especial, Corumbá, v. 30, e0156,
2024. p. 1-20.
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História da Educação de Surdos: uma
Decolonialidade Possível Contra a Colonialidade de Poder Linguístico[nota 1]
History of Education
for the Deaf: a Possible Decoloniality Against the Coloniality of the
Linguistic Power
Simone Aparecida dos Santos SILVA[nota 2]
Hélio José Santos MAIA[nota 3]
Regina Lúcia Sucupira PEDROZA[nota 4]
RESUMO: Faz-se importante discutir a
história da Educação de Surdos a partir de narrativas questionadoras da
colonialidade de poder linguístico imposta a esses sujeitos. Como hipótese,
tem-se que o ouvintismo impactou negativamente a historicidade do povo surdo,
subjulgando seu processo educacional. Nesse viés, o presente estudo teve por
objetivo investigar caminhos decoloniais para refletir a colonialidade de poder
que afeta o povo surdo em sua forma de narrar sua história educacional e seu
direito linguístico. Como viés metodológico, fez-se uso da abordagem
qualitativa, norteada por investigação bibliográfica com revisão de literatura
sobre a história da Educação de Surdos, partindo de uma
práxis decolonial. Assim, ratificou-se a suspeita da imposição dos
ouvintes, como maioria linguística, que domina, via colonialidade do poder
linguístico, a história e o presente da educação do povo surdo, por meio da
desvalorização de sua cultura, identidade e língua. Concluiu-se que há
necessidade de busca ativa de processos decoloniais.
PALAVRAS-CHAVE: História
da Educação. Educação de surdos. Libras. Colonialidade. Decolonialidade.
ABSTRACT: It is important to
discuss the history of Education for the Deaf based on questioning
narratives of the coloniality of the linguistic power imposed on these
subjects. As a hypothesis, it is assumed that listening has negatively impacted
the historicity of the deaf people, subjugating their educational process. In
this bias, the present study aimed to investigate decolonial ways to reflect
the coloniality of power that affects the deaf people in their way of narrating
their educational history and their linguistic right. As a methodological
perspective, a qualitative approach was used, guided by bibliographical
investigation with a literature review on the history of Education for the
Deaf, starting from a decolonial praxis. Thus, it was ratified the suspicion of
the imposition of listeners, as a linguistic majority, which dominates, via the
coloniality of linguistic power, the history and present of the education of
the deaf people, through the devaluation of their culture, identity and
language. It was concluded that there is a need for an active search for
decolonial processes.
KEYWORDS: History of Education.
Education for the Deaf. LIBRAS.
Coloniality. Decoloniality.
Historicamente, a Educação de
Surdos tem sido marginalizada em suas dimensões cultural, econômica, política,
social e educacional. Os surdos eram percebidos no mundo como pessoas incapazes
de aprender devido à questão linguística. Por conseguinte, não tinham direitos
religiosos, civis, políticos, socioeconômicos, entre outros. Assim, a pressão
histórica submetida aos surdos, suas organizações, suas comunidades, em todo o
mundo, requer um novo olhar
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para que
sejam denunciadas as ações
fundamentadas na colonialidade de poder que perduram desde seu passado
(Fernandes & Lopes, 2019; Leite & Cabral, 2021; Sá, 2006).
Nesse viés, compreende-se a
colonialidade do poder como um processo contínuo e permanente constituído pelo
poder moderno/colonial, mundial capitalista, eurocêntrico, que toma contornos a
partir do surgimento da ideia racial,
idealizada como uma construção biológica imaginativa e autorgada pelas
ciências, para naturalizar os colonizados como seres inferiores por seus
colonizadores, em prol da manutenção do domínio social, mesmo após a
descolonização (Quijano, 2005, 2009).
A colonialidade do poder atua no presente via desvalorização da língua, de grupos de
identidades de minorias e de suas histórias. Como resistência e recusa ao
colonialismo e à colonialidade,
surge, necessariamente, a decolonialidade como forma derivada de resposta à condição colonial em curso. Segundo Mignolo e
Walsh (2018), têm-se as ações de pensar, agir, refletir e indignar-se, com mais
de 500 anos, “de luta e sobrevivência, uma resposta e prática epistêmica e
baseada na existência — mais especialmente por colonizados e racializados —
contra a matriz colonial de poder em todas as suas dimensões, e para as
possibilidades de outros saberes” (p.
17). Ainda que os autores não tratem diretamente dos sujeitos surdos, ao
descreverem grupos de minoria, suas ideias ressignificam
o povo surdo, tendo em vista que, historicamente, são tidos como grupos
inferiorizados e, portanto, atingidos diretamente pelo colonialismo e suas
derivações na desvalorização de sua cultura, de sua história e de seu poder
linguístico no decorrer dos tempos.
Apesar de contemporânea, a
discussão sobre a educação da pessoa surda e sua histórica opressão teve início
com a bipolaridade nas práticas educacionais no século XIX, influenciada em
vários países com o advento do Instituto Nacional de Surdos de Paris, criado no
século XVIII (Berthier, 2006; Sofiato et al., 2021). Por um lado, destaca-se a
arbitrariedade da defesa do ensino da língua oral para surdos como o único
caminho de inseri-los no mundo audista. Por outro lado, tem-se a luta que
defende a Língua de Sinais — língua materna da comunidade surda — como forma linguística autêntica, em que o surdo pode
se desenvolver em todas as dimensões.
Nessas duas abordagens
educacionais, têm-se as vertentes da colonialidade e da decolonialidade. Como
parte da colonialidade, reverbera-se
o
“ouvintismo” — termo cunhado por Skliar (1998, 2015), análogo às práticas
colonizadoras das pessoas ouvintes sobre as pessoas surdas (as colonizadas);
evidencia um “conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo
está obrigado a olhar-se e a narrar-se como se fosse ouvinte” (Skliar, 2015, p.
15). São ações e reações do colonizador sobre o colonizado que vislumbram uma
superioridade, uma imposição cultural e linguística
aos
surdos, por dominarem a habilidade de ouvir ou de se portar como quem ouve (Humphries, 1977; Sá, 2006; Santana &
Santana, 2020; Skliar, 1998, 2015).
Discorridas as considerações
iniciais, como objetivo de pesquisa, o presente estudo buscou refletir
brevemente sobre a colonialidade linguística
imperada
sobre as pessoas surdas no Brasil, tendo como pressuposta desvalorização da
Língua Brasileira de Sinais (Libras), que alicerça a Língua de Sinais desses
sujeitos, presente nas legislações
e nas políticas educacionais inclusivas.
Partiu-se, conscientemente, da
orientação em não transcender ou desvincular totalmente da colonialidade por
compreender que suas raízes estão imbricadas,
perfazendo
no
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conhecimento do ser,
do poder e do saber, uma vez que todo ser humano detém um pouco de condenado na terra, colonizado e, por vezes, colonizador
(Fanon, 2015; Maldonado-Torres, 2019). Dessa feita,
propõe-se, aqui, um exercício decolonial da Educação de Surdos, tratando de sua
historicidade com as contribuições de pesquisadores surdos que possuem outras
lentes de auxílio no contar suas histórias a partir do olhar do colonizado. E,
ainda, aventa-se a construção de um giro epistêmico decolonial, em que o sujeito surdo, o condenado, o
colonizado, surge como criador e ser pensante (Freire, 2005; Madonaldo-Torres,
2019; Santos, 2019; Spivak, 2010), cujo subalterno deve e pode falar a partir
de suas experiências, a fim de reconstruir suas resistências para novas ações.
Com
o intuito de fundamentar as reflexões propostas, têm-se as pesquisas de Berthier (2006), Freire (2005), Hall (2016), Karnopp (2006), Maldonado-Torres (2019), Perlin
(2015), Quadros e Karnopp (2004), Rezende (2022), Santos (2019), Skliar (1998,
2015), Spivak (2010), Strobel (2009, 2018), entre outras. E, ainda,
observaram-se os seguintes ditames legais: Decreto n° 5.626, de 22 de dezembro de 2005; Lei n° 10.098, de 19 de
dezembro de 2000; Lei n° 10.436, de 24 de abril de 2002; Lei n° 13.146,
de 6 de julho de 2015; e Lei n° 14.191, de 3 de agosto de 2021, a fim de
alicerçar as discussões empreendidas nas linhas que se seguem.
Diante
do exposto, a presente pesquisa foi organizada nas seguintes seções: introdução; breve história da Educação de Surdos, partindo das contribuições de autores surdos, como prática de
decolonialidade, em que o subalterno (o surdo) pode e necessita ocupar seu
lugar de fala; produção
de tensões propositivas, asseverando uma noção reflexiva contra a colonialidade
de poder linguística, a qual a pessoa surda é submetida, sinalizando as discussões sobre os processos de inclusão dos surdos,
a partir das legislações
vigentes; apresentação das possibilidades que buscam alternativas para um giro epistêmico
decolonial, na perspectiva educacional e linguística do sujeito surdo, via
produção cultural e linguística concernentes; e, considerações finais,
atentando para novas discussões sobre a temática em comento.
A
história da Educação de Surdos sempre foi marcada pelo binarismo ensino da
língua oral versus ensino da língua gestual. Tal modus operandi educacional foi reduzido à questão linguística de
qual seria a melhor forma de educar o surdo, deixando à margem discussões
importantes (as questões pedagógicas e metodológicas de se pensar essa
educação, por exemplo). Um dos fatores que alicerçavam os obstáculos em questão era que muitos
predecessores de surdos negavam trocas e revelações exitosas de suas práticas,
acarretando a perda de muitos fatos na história (Berthier, 2006; Coelho et al.,
2004; Strobel, 2009, 2018). Nesse viés, faz-se importante trazer algumas contribuições de Berthier
(2006) e Strobel (2009, 2018) — autores surdos[nota 5]
que auxiliam na reflexão sobre a
história da Educação de Surdos no mundo.
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Ferdinand
Berthier,
surdo congênito, nasceu em 1803, na cidade francesa de Louhans. Estudou desde
os 8 anos de idade no Instituto Nacional de Surdos de Paris. Era considerado,
pelo professor surdo Laurent Clerc, como
um dos mais brilhantes estudantes daquela instituição, ao qual devotava grande
admiração e inspiração para sua vida. Ali se formou e trabalhou como professor
por mais de 40 anos. Era conhecido por sua importância literária na comunidade
de sua época. Escreveu vários livros e diversos artigos sobre a Educação de
Surdos, seus direitos legais, defesa da Língua de Sinais, cultura surda,
artistas surdos e poesias de surdos franceses que utilizavam a Língua de Sinais
Francesa (LSF). Sua obra de destaque foi a bibliografia de Michael Charles de L’Epée, intitulada Les sourdes-muets avant et depuis l’abbé de l’Epée
[Um surdo antes e depois do Abade L’Epée], publicada originalmente em 1840, que culminou
em uma premiação especial ao abade, a qual era oferecida às pessoas ilustres da
sociedade francesa (Berthier, 2006; Lane & Philip, 2006; Strobel, 2009). A
obra foi proposta a Berthier pela Sociedade para as Ciências Morais, Letras e
Artes de Seine-et-Oise, e tinha por objetivo verificar a condição social dos
surdos antes das ações de L’Epée, descrevendo
e analisando os meios que ele utilizava para
a
Educação de Surdos, para saber se os resultados obtidos poderiam conferi-lo
como um benfeitor da humanidade.
Ferdinand
Berthier
reconhecia a importância e as contribuições de L’Epée para a história da Educação de
Surdos. Contudo, tinha críticas em relação ao ensino da gramática francesa aos
surdos que, por vezes, impunha a sobreposição da língua francesa à Língua de Sinais (Berthier 2006; Strobel, 2009,
2018). Com base nesse contexto histórico, houve um tempo em que a produção
cultural e linguística do sujeito surdo estava em ascendência. Nesse sentido, é
preciso revelar a forma reducionista e seccionada dos registros que muitos
pesquisadores retratam a história da Educação de Surdos. Tinha-se preocupação e
esforço constantes em determinar a sua história em curas para suas audições
ausentes, fundante ao modelo ouvinte (Strobel, 2009, 2018). Sobre a questão,
Berthier (2006) faz alusão que a Língua de Sinais era utilizada e pode ser
encontrada na história dos mosteiros trapistas antigos (em Citeaux, França, por
exemplo). Ali repassavam seus segredos nessa língua, por terem a ordem de
silêncio; portanto, não podiam falar entre si. Assim, nesses locais, era
possível encontrar “um dicionário de signos guardado desde tempos imemoriais”
(Berthier, 2006, p. 164).
De fato, faz-se importante
reconhecer a importância do saber histórico em diferentes percepções,
sobretudo, do colonizado, para fomentar novos exercícios decoloniais diante de
seus relatos. Assim, concebe-se como “história a ciência que estuda a forma de
como os homens se organizaram e viveram no passado” (Strobel, 2009, p. 5),
acrescentando em como os sujeitos influenciaram ou sofreram influências com
ações e reações dos outros, em si mesmos, no meio, no tempo ou na época em que
vivem.
Quando observados alguns
textos sobre a história da Educação de Surdos (Berthier, 2006; Carvalho, 2019;
Nascimento, 2008; Perlin & Strobel, 2008; Skliar, 2015; Strobel, 2009),
percebe-se um alerta quanto à forma
como a sua história vem sendo narrada, pois tem sido construída sobre base
dicotômica e de cariz positivista,
que resultou em uma história maniqueísta
(Carvalho,
2019). O mundo esquece que sempre existiu a surdez e, portanto, pessoas surdas.
Nessa perspectiva, faz-se necessário pensar na história da Educação de Surdos
não como uma tarefa difícil de ser analisada e compreendida, uma vez que ela se
transforma continuamente,
apesar da existência de diversos impactos marcantes.
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Tem-se um forjamento
caracterizado por mudanças, crises e turbulências, bem como o surgimento de
oportunidades (Strobel, 2009). Em comum aos pesquisadores surdos, Berthier
(2006) e Strobel (2009, 2018) apontam as atrocidades praticadas aos surdos na
Antiguidade. Em Roma, por exemplo, Berthier (2006) destaca que o imperador
Justiniano criou um sistema legal, o qual classificava os surdos em vários
tipos, entre eles como pessoas “surdas sem serem mudas ou pessoas que eram
mudas sem serem surdas” (p. 165). Tal ditame era uma desvantagem para quem
nascesse em condição natural de surdez congênita como os afônicos. Enquanto, em
Esparta, na Grécia, a Lei de Licurgo condenava a criança surda à morte, tendo
suas gargantas cortadas ou jogadas ao precipício (Berthier, 2006). Entre os
egípcios, especialmente entre os persas, os surdos eram percebidos como uma questão
religiosa, cuja deficiência era uma dádiva celeste, pois “era considerada um
sinal visível do favor do céu” (Berthier, 2006, p. 165). Com grande clareza,
Berthier (2006) advoga que coube à religião cristã romper “tantos laços
terrenos, soltar as correntes dos surdos e apagar os últimos vestígios dessas
atrocidades” (p. 165).
A história da Educação de
Surdos, em geral, é contada pelos ouvintes justamente por grande parte deles
não terem acesso a uma formação acadêmica que proporcione uma educação
emancipatória. Sobre a questão, Sá (2006) promove uma similitude entre a história dos surdos
com a história dos povos originários, em que ambos já existiam e eram
supostamente descobertos pelos ouvintes colonizadores, que, antes de tudo, os
colocavam em caixas isoladas para serem educados e civilizados, a fim de
normatizá-los de acordo com seus padrões dominantes; e, quando não mais
conseguem isolá-los, por formarem grupos que se fortaleciam, eram dissipados,
para não formarem guetos de resistência à dominação.
Como contraponto, a história
dos surdos pode ser contada com outras perspectivas a partir do olhar de quem
se narra. Strobel (2009), por exemplo, observa que a história dos surdos pode
ser contada com base no historicismo, na história crítica e na história
cultural.
O historicismo, no caso dos
surdos, se reduz e restringe a descrever a história segundo a visão hegemônica
de seus colonizadores audistas. Pode ser definido como sendo “a doutrina
segundo a qual cada período da história tem crenças e valores únicos, devendo cada
fenômeno ser entendido através do seu contexto histórico” (Strobel, 2009, p.
31). Nessa narrativa, infelizmente presente nos dias atuais, o que predomina na
história da pessoa surda é a visão corretiva clínico-terapêutica da surdez,
percebida como desvio ou doença que necessita de correção e cura. No
historicismo, os surdos são narrados como deficientes e patológicos. São
categorizados e classificados de acordo com o grau de surdez que apresentam na
escala médica. Nesse escopo, sua educação deve ter um caráter
clínico-terapêutico e reabilitante (Strobel, 2009).
Dentro da visão da história
cultural, os surdos são narrados como desditosos,
que
necessitam de auxílio para se promover ou se integrar, cabendo às pessoas
ouvintes sua tutela. São considerados como sujeitos que apresentam capacidades,
mas dependentes diretamente. Sua educação é vista como um ato de caridade, cujo
apoio escolar deve ser realizado, por considerar que apresentam dificuldade de
acompanhar as experiências de aprendizagem como os sujeitos ouvintes a
alcançam. A Língua de Sinais é utilizada como um recurso ou apoio às línguas
orais (Strobel, 2009, 2018).
A história cultural parte da
percepção do sujeito surdo como sujeito social, histórico e político, possuidor
de uma identidade cultural e linguística, tornando-o humano. Apresenta o
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surdo como
protagonista de sua própria narração de vida, de acontecimentos e fatos
históricos. Valoriza o seu envolvimento nas diversas contextualizações relacionais
que envolveram as produções humanas. Tem-se aí uma nova maneira de recontar a
história dos surdos a partir de seus feitos culturais, e não mais historicizar
a partir das visões dos colonizadores. Ela reflete movimentos mundiais de
surdos, buscando a não tendência de priorizar apenas fatos oriundos de
educadores ouvintes, que reforçam a história das instituições educacionais e
metodologias ouvintistas.
Tal recontar, a partir de
novas ações de decolonialidade, busca, sem dúvida, evidenciar relatos,
depoimentos, fatos vivenciados e observações do povo surdo, revolvendo “um
emaranhado de acontecimentos e ações, levadas a cabo por associações,
federações, escolas e movimentos surdos que são desconhecidas pela grande
maioria das pessoas” (Strobel, 2009, p. 31). Desse relato, a partir de uma
história crítica sobre o povo surdo, é possível narrar os feitos de pessoas
surdas dentro do contexto histórico. Assim, além de Berthier, que, entre muitos
feitos, fundou em Paris o comitê de surdos e a primeira associação de surdos,
servindo de semente para germinar outras associações pelo mundo inteiro, têm-se
outras personalidades surdas de destaque, quais sejam: Laurent Clerc, Ernest
Huet e Pierre Pelisser.
Laurent Clerc, professor surdo
do Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris (fundado pelo abade Michael Charles
de L’Epée), ensinou Língua de Sinais a Thomas Gallaudet. Ambos fundaram a
primeira escola para surdos nos Estados Unidos da América (EUA), onde
atualmente é a Universidade Gallaudet, localizada na capital estadunidense. Ali
se tem um programa educacional totalmente voltado à formação em diversas áreas
do conhecimento à pessoa surda, desde a escola primária até o Doutorado,
contando, em sua maioria, com docentes surdos ou professores bilíngues em Língua Americana de Sinais (LAS).
Ernest
Huet, surdo desde os 12 anos de idade, professor em Paris, veio ao Brasil
em 1855, com vista a fundar uma escola para
surdos. Apoiado por D. Pedro II, fundou e dirigiu, por cinco anos, o Imperial
Instituto de Surdos-Mudos, inaugurado em 26 de setembro de 1857, na capital
fluminense, onde atualmente é o Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES).
Pierre Pelissier, poeta e
professor surdo, membro ativo da Sociedade Central de Educação de Assistência
aos Surdos Mudos, elaborou a obra intitulada Iconografia de Sinais, que continha um manual de sinais,
reproduzido, posteriormente, pelo surdo brasileiro Flausino José da Costa de
Gama (Dias et al., 2021; Sofiato & Reily, 2012; Vieira, 2018).
A história cultural dos surdos
atualmente é escrita via produções e artefatos culturais do povo surdo em
consonância com a comunidade surda. Tem-se um movimento produtivo que resulta
em manifestações estéticas, tais como: poesia, literatura surda, teatro com
expressão de surdos, contação de piadas, narração de história em Libras, artefatos
tecnológicos com uso de software
para tradução em Libras, pesquisas acadêmicas, entre outras atividades
socioculturais. Estas surgem como processos reivindicatórios que suscitam a
decolonialidade e a descolonização do corpo surdo, com base em narrativas da
identidade cultural, permeada de experiências socioantropológicas coletivas da
comunidade surda (Fernandes & Lopes, 2019; Fernandes & Medeiros, 2020).
Como exemplo que legitima uma narrativa na perspectiva de história cultural dos
surdos, tem-se o dossiê intitulado Libras
e Arte: manifestações verbovisuais de artefatos culturais da comunidade surda
(Fernandes & Medeiros, 2020), que reúne artigos que materializam
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e
rompem com estruturas cânones de divulgação científica, enfatizando processos
históricos do atual cenário nacional sobre a produção sociocultural da
comunidade surda.
Na óptica da história
cultural, os surdos são narrados como sujeitos que vivenciam o mundo a partir
de suas experiências visuais, não existindo a valorização da ausência da
audição. São considerados sujeitos com múltiplas e multifacetadas identidades.
A Língua de Sinais também se mostra como a própria produção e manifestação da
diferença linguística-cultural dos surdos como enunciadores de discursos que
engendram sua forma de produzir linguagem e pensamento (Strobel, 2009, 2018).
Sem menosprezar os
historiadores convencionais que dividem a história em cincos grandes períodos
(Pré-História, Idade Antiga ou Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna e Idade
Contemporânea), faz-se importante ressaltar a apreciação de novos conhecimentos
existentes que sofreram epistemicídio com a colonização das epistemologias do
Norte, sendo necessário observar como o povo surdo contempla a divisão da
história (Santos, 2019; Strobel, 2009, 2018). Para tal provocação,
compreende-se por epistemicídio o cancelamento dos conhecimentos locais
praticados por um conhecimento alienígena (Santos, 2019), que colonializa
provocando, por vezes, a estereotipagem. Esta, por sua vez, é um organismo
mantenedor de uma ordem social e simbólica, que provoca divisões fronteiriças
entre o normal e o pervertido, o patológico e o normal, o aceitável e o
inaceitável, e o que pode ou não pode pertencer a algo, conferindo status de
insiders (dentro) e outsiders (fora), separando os “nós” dos “eles” (Hall,
2016).
É notável esse campo de luta e
resistência pleiteada pela comunidade surda. A primeira pós-doutora surda da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a Dra. Patrícia Luiza Rezende
Curione, é uma referência dessa nova jornada traçada com muito engajamento de
pesquisadores surdos. De sua pesquisa de pós-doutorado, ressurgem novas
reflexões sobre esse conceito de epistemicídio cunhado por Boaventura de Souza
Santos (2019), com uma vertente que evoca o epistemicídio para o campo
epistemológico e pedagógico sobre a marginalização da pessoa surda dentro dos
contextos sociais. Em sua pesquisa, evidenciou que muitos pesquisadores surdos
têm dificuldades para realizações de suas produções acadêmicas e nas
participações em políticas públicas voltadas aos seus interesses, devido aos
obstáculos atitudinais e de acessibilidade.
Nessa entoada para dar espaço
a novos saberes epistemológicos próprios da cultura surda, como as pesquisas de
Patrícia Rezende (2022), vem surgindo importantes pesquisadores surdos, como
Falk Rodrigues Moreira, Marianne Rossi Stumpf, Silvia Andreis Witkosky, Gladis
Terezinha Taschetto Perlin, Flaviane Reis, Gláucio Castro Júnior, Karin Lilian
Strobel, entre outros, que compõem o ativismo da cultura surda em prol de
melhores condições de vida, por meio da participação social e de pesquisas
acadêmicas que envolvem os artefatos dessa comunidade (Monteiro, 2018).
Nessa iniciativa de alteridade
em prol do renascimento de novas visões culturais sobre a história dos surdos,
têm-se as seguintes fases históricas: revolução cultural, isolamento cultural e
despertar cultural (Strobel, 2009). A revelação cultural pode ser compreendida
pelo fato de o povo surdo nunca ter tido valorosa ligação com a educação. De
fato, grande parte dos sujeitos surdos dominava a arte da escrita — antes do
Congresso de Milão, em 1880, existiam muitos escritores, artistas, professores
e outros sujeitos surdos que a sociedade considerava
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como
bem-sucedidos (Strobel, 2009). Nessa fase, existiam duas correntes para
Educação de Surdos: uma tinha suas bases na aquisição da oralidade, e outra com
suas vertentes ancoradas na Língua de Sinais. Uma espécie de maniqueísmo que
colocava a língua oral como a representante de heróis, considerada, portanto, o
lado do bem, e a Língua de Sinais diametralmente sendo classificada como uma
vilania, sendo colocada, por conseguinte, como representante do mal (Carvalho,
2019).
Berthier (2006) aponta
importantes contribuições sobre os professores dos surdos, não coadunando com
os métodos que preconizavam a fala oral em vez da fala sinalizada. Para o
autor, muitos métodos orais tinham resultados escassos se comparados com os
métodos que faziam uso da linguagem de gestos na Educação de Surdos. Em seu
texto, Berthier (2006) faz uso de várias nomenclaturas para se referenciar à
língua materna dos surdos; por vezes, utiliza a “mímica”, a linguagem de ação e
a linguagem de gestos e sinais.
De concepção oralista, têm-se
os professores ingleses Jonh Wallis, Jonh Brulwer, William Holder, Digby e
Gregory (Berthier, 2006). Jonh Wallis, “um dos famosos professores de Oxford,
foi o primeiro inglês a dedicar-se a esta tarefa humanitária. Ele ultrapassou
seus predecessores em habilidade pedagógica, bem como em solidez de julgamento”
(Berthier, 2006, p.170). Na Alemanha, tem-se Samuel Heinecke (1723-1790),
considerado o pai do método oral. Já na Espanha, Berthier (2006) enfatiza, com
indignação, ver Juan Pablo Bonet (1579-1629), autor da obra intitulada Arte para ensenar a hablar a los mudos, sendo considerado o primeiro
educador de surdos. Sobre a questão, Berthier (2006) assevera que tal mérito
deveria ser de Ramirez de Carrion, autor
da obra intitulada Maravilhas de
naturales, em que contienen dos mil secretos de casas naturales, de
1629. Carrion era surdo congênito e teve excelentes críticas favoráveis ao seu
método utilizado com o príncipe surdo de Carigan, Emmanuel Philibert.
De fato, na visão de Berthier
(2006), a sociedade audista já ditava a favor de sua forma dominante de colonizar
via percepções do mundo ouvinte. Em seus relatos, tem-se que somente L’Epée e
Sicard, apesar de colocarem a língua francesa em evidência em detrimento à
Língua de Sinais, e, Bebian, que era um conhecedor genuíno da língua surda dos
surdos, por ter estudado e convivido desde criança, com aqueles do Instituto de
Paris, demonstravam compreender as necessidades educacionais dos surdos a
partir de suas vivências.
A segunda fase histórica — o
isolamento cultural — pode ser apresentada com o retraimento da comunidade surda em
detrimento às conclusões do Congresso Internacional de Surdo e Mudo, em Milão,
Itália, em 1880. Tal evento tornou expressamente proibido o acesso à Língua de
Sinais na Educação de Surdos (Perlin, 2015; Strobel, 2009); e, dentro da história
da Educação de Surdos, é possível inferir que foi uma grande prática da
colonialidade do saber, caracterizando-se como uma visão de mundo que se
constitui como único conhecimento ou ponto de vista validado, inclusive com o
discurso da ciência ajudando a fomentar caminhos pelos quais a colonialidade
engendra mecanismos organizacionais em múltiplas instâncias para desumanizar
dentro da modernidade/colonialidade (Maldonado-Torres, 2019).
O Congresso em questão foi
promovido e organizado por vários especialistas da área da surdez — ouvintes e
defensores da abordagem oralista na Educação de Surdos. Além de subjugarem e
estereotiparem os estudantes surdos como preguiçosos para falarem, tal acontecimento
acusou a Língua de Sinais de auxiliá-los nesses comportamentos. Durante a
Assembleia
P. 9
Geral realizada no encontro científico em
comento, todos os professores surdos foram censurados de votar e excluídos das
arguições. Dos mais de 160 representantes ouvintes presentes, somente quatro,
dos EUA, votaram contra o oralismo puro (Lodi, 2005; Lulkin, 2015; Perlin,
2015; Silva, 2006; Skliar, 2015; Strobel, 2009).
Em realidade, tal Congresso
não constituiu o início do ouvintismo e do oralismo, mas serviu para legitimar
oficialmente as políticas e as práticas similares colonizadoras e opressivas
que permitiam a manutenção do controle social por parte dos dominantes
audistas, praticando uma devastação psíquica, cultural e sistemática aos seus
colonizados (os surdos). Contudo, estudos recentes (Rodrigues et al., 2019;
Vieira-Machado & Rodrigues, 2022) refletem que a língua de sinais, como
movimento de resistência, se manteve viva, apesar da proibição oriunda desse
congresso. Isso pode ser verificado em pesquisas sobre o Congresso de Paris, de
1900, as quais se debruçam sobre as 20 resoluções discutidas pelos surdos nesse
evento. Tal referência apresenta que, ao final do século XIX, essas resoluções
foram discutidas na seção de surdos e jamais perderam o vigor de refletir sobre
a Educação de Surdos, como nos faz pensar algumas narrativas reducionistas e
hegemônicas sobre o Congresso de Milão de 1880 (Rodrigues et al., 2019).
Nesse sentido, esse congresso
não pode ser apresentado como uma visão reducionista de língua de sinais versus
língua oral, no qual a primeira foi dizimada, mas que, apesar de todo conluio
para realizar esse congresso na cidade de Milão, para ter as condições
favoráveis para aprovação da língua oral como um método puro e mais adequado
para a Educação de Surdos, a língua de sinais se manteve, o que a fez realçar,
em 1960, com os estudos de William Stkoe sobre sua legitimidade quanto aos
critérios linguísticos.
Em suas lutas diárias, os
sujeitos surdos vivenciam a contraposição de colonialidade do poder, por
ocuparem lugares distintos, delineados pela sociedade vigente, marcados por um
consenso comum de condutas, regras morais e científicas, que permeiam as
experiências dos jogos de poder e orquestramento do dito mais válido
(Maldonado-Torres, 2019; Stam & Shohat, 1995). Nesse contínuo de assimetria
de poder, a colonialidade do poder se faz atuante nos dias atuais via
desvalorização da história da língua e da produção cultural, manifestações
políticas e mantendo seus excluídos à margem do mercado de trabalho.
São grupos de minoria,
mascarados por uma identidade inferiorizada, que legitima sua subalternidade,
para que não almejem pleitear possíveis estratos sociais dominantes (Spivak,
2010; Walsh, 2009). O povo surdo se encontra em tal contexto de mascaramento
social e linguístico no âmbito educacional, tendo em vista que muitos não obtêm
o desenvolvimento linguístico, no tocante à língua portuguesa escrita, em
comparação ao que se dá com o educando ouvinte, devido à forma como é imposta a
sua educação, ainda atrelada às metodologias e aos processos pedagógicos
audistas.
No decorrer da fase de
isolamento cultural, a Língua de Sinais foi oficialmente proibida por mais de
100 anos. Uma prática de colonialidade de ser e poder apoiada pela corrente do
ouvitismo. Contudo, ela não foi esquecida pelos surdos. Era praticada como
forma de resistência decolonial de ser e poder em associações de surdos e em
locais livres de controle oralista. Tal reação promoveu outras interpretações
sobre a opressão da ideologia dominante do oralismo (Perlin, 2015; Perlin &
Strobel, 2008; Skliar, 2015; Strobel, 2009). Fomentou e manteve vivo na mente
do povo surdo a necessidade de se decolonizar — o que perdura até os dias
atuais.
P. 10
A terceira fase histórica — o
despertar cultural — deu-se a partir dos anos de 19601970, com as investigações
sobre a Língua de Sinais com Stokoe (1960) e Klima e Bellugi (1979). Surgiram
as bases científicas que validaram o sistema linguístico da Língua de Sinais
com estruturas gramaticais na modalidade visuoespacial, comprovando sua
genuinidade como língua natural (Coelho et al., 2004; Klima & Bellugi,
1979; Lane, 1992; Perlin, 2015; Perlin & Strobel, 2008; Quadros &
Karnopp, 2004; Silva, 2006; Skliar, 1998, 2015; Stokoe, 1960; Strobel, 2009).
A fase em questão se estende
na contemporaneidade orientada por pautas reivindicatórias sobre a presença da
pessoa surda em todas as esferas da sociedade, sobretudo como diferença
política. Por diferença compreende-se uma construção histórica, política e social,
permeada de conflitos sociais, sustentada por práticas de significação e de
representações compartilhadas entre surdos (McLaren, 1997).
O engendramento cultural
construído pela comunidade surda, sem dúvida, é uma retomada do reconhecimento
da Língua de Sinais. É uma perspectiva decolonial de valorização de costumes,
histórias, tradições próprias, além da diferente forma de perceber-se no mundo
a partir da visão. Nessa linha argumentativa, a resistência do surdo forjou
outras parcerias com professores, famílias, ativistas e pessoas de vários
segmentos educacionais que, mesmo sendo ouvintes, compreendem e participam para
efetivar as garantias de seus direitos fundamentais, observando os dinamismos
de suas subjetividades e resguardando as identidades surdas. Tal união, antes
vista como antagônica, nutriu o surgimento de movimentos surdos —
desdobramentos sociais articulados, entre surdos e ouvintes, a partir de
aspirações, de lutas de pessoas surdas e de reivindicações com o intuito de
apreciação de sua língua e cultura (Klein, 2015; Perlin, 2015).
A partir desses engajamentos,
vigora nas escolas brasileiras, por exemplo, as seguintes propostas: educação
inclusiva e educação bilíngue — ambas acordadas na Lei no 10.436/2002, que
dispõe sobre a Libras e seu reconhecimento como língua oficial, culminando em
uma grande conquista.
Art. 1° É
reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de
Sinais — Libras e outros recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo
único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais — Libras a forma de
comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza
visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema
linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de
pessoas surdas do Brasil. (Lei no 10.436, 2002)
Nas propostas educacionais em
questão, a Libras é a língua natural tida como a primeira língua para o
desenvolvimento do pensamento e da linguagem à pessoa surda. Apesar de realçar
aspectos políticos identitários e culturais de empoderamento da pessoa surda,
têm-se ainda vários embates de como deve ocorrer seu ensino mediante as
vertentes supramencionadas.
Dentro da proposta da educação
inclusiva, é possível perceber vários aspectos de colonialidade de poder
disfarçados na égide de inclusão para todos. Nesse sentido, Foucault
P. 11
(1995) questiona o processo
de disciplinarização dos excluídos, como parte do
controle social e da manutenção da ordem dentro das desigualdades sociais,
por meio da inclusão, cujo objetivo é
incluir para dominar, extinguindo o sentido da diferença política. No caso
brasileiro, mostra-se, então, perceptível a negligência com a Educação de
Surdos com seus pares e educadores competentes em Libras, por partir do
princípio de que o público-alvo da escola inclusiva deve frequentar escolas
comuns, próximas às suas residências — o que reduz a inclusão apenas na
aceitação social da presença na escola (Lacerda et al., 2020). Nessa vertente
escolar, o imperativo continua sendo a língua portuguesa como língua de
instrução, mediada em Libras, pelo trabalho do profissional tradutor e
intérprete em Libras (Leite & Cabral, 2021).
A mediação em Libras em
questão é consequência da
mobilização da comunidade surda brasileira para o reconhecimento normativo da
língua como forma mais adequada de expressão e comunicação entre sujeitos
surdos e ouvintes sinalizantes. Não obstante, os dispositivos legais que
regulamentam o uso da Libras como direito linguístico (Decreto no 5.625,
2005; Lei no 10.436, 2002) deixam a oralidade subtendida como norma padrão. Assim, é
perceptível a existência de uma concepção de monolinguajamento, portanto de
colonialidade do poder ao colocar a língua portuguesa oral sobre a Língua de
Sinais, no caso a Libras (Mignolo, 2020), haja vista que tais legislações não
postulam o oferecimento, em todos os acessos, à educação a partir da
acessibilidade em Libras, deixando, por vezes, explícito o uso da língua
portuguesa escrita como insubstituível. Nesse viés, não se propõe que a Libras sobreponha
à língua portuguesa, mas que tenha seu espaço como direito linguístico oficial
respeitado.
Parte-se da concepção de que,
para as epistemologias do Sul, como são as Libras, não se delimita a
substituição das epistemologias do Norte, como as línguas orais, nem se
deslocar o Sul para o lugar do Norte. A busca é ultrapassar a dicotomia
hierárquica e hegemônica entre Norte e Sul, entre línguas orais e língua de
sinais. Por conseguinte, as pessoas surdas não almejam se sobrepor às pessoas
ouvintes — prova disso é a comunidade surda, que é composta por surdos e
ouvintes — tampouco sair do papel de oprimido para tornar-se opressor (Freire,
2005; Santos, 2019). A intenção é ter espaço de diferenças políticas e
singularidades respeitadas, para que seja possível a criação de caminhos
alternativos e artesanais da cultura e identidade surdas, como presença no
mundo.
Nesse exercício de alteridade,
vale o apoio à ecologia de saberes (Santos,
2019), que faz referência à necessidade de estudos e pesquisas sobre a questão
da colonização dos surdos pelas epistemologias modernas racionalistas (a Língua
de Sinais, por exemplo). A ecologia de saberes se dá por sujeitos
descentralizadores de normativas eurocêntricas (a comunidade surda, por
exemplo, que urge pela valorização de sua cultura, seus saberes e seus
conhecimentos científicos e não científicos).
O Decreto no
5.626/2005 discorre sobre a inclusão da Libras como disciplina curricular nos cursos de formação de
professores, promovendo o direito à educação bilíngue - ditame posteriormente referendado pela
Lei no 14.191/2021, que alterou a Lei no 9.394, de 20 de
dezembro de 1996 (Lei Diretrizes e Base da Educação Nacional — LDBEN) para
dispor tal modalidade.
P. 12
Tal conquista legislativa
organizou-se da conjunção dos movimentos de surdos via Federação Nacional de
Educação e Integração dos Surdos (FENEIS), pleiteada ao Senado Federal, cujo entendimento, no art. 60-A da Lei
14.191/2021, in verbis:
Art. 60-A. Entende-se por educação bilíngue de surdos,
para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar oferecida em Língua
Brasileira de Sinais (Libras), como primeira língua, e em português escrito,
como segunda língua, em escolas bilíngues de surdos, classes bilíngues de
surdos, escolas comuns ou em polos de educação bilíngue de surdos, para
educandos surdos, surdo-cegos, com deficiência auditiva sinalizantes, surdos
com altas habilidades ou superdotação ou com outras deficiências associadas,
optantes pela modalidade de educação bilíngue de surdos.
De
fato,
a sanção de tal normativa impacta singular e significativamente em novas
práxis de produção de caminhos artesanais para a Educação de Surdos rumo à
educação bilíngue, buscando traçar o fortalecimento de meios educacionais voltados ao fazer sociocultural dos
surdos e da Língua de Sinais como exercício decolonial. Nesse viés, a seguir,
propõe-se uma breve reflexão sobre esse possível
caminho decolonial para a Educação de Surdos.
A
decolonialidade na Educação de Surdos implica mudança de paradigmas. Tem-se
a saída da visão clínico-terapêutica da surdez para uma
visão socioantropológica, em que a necessidade de aprender e ensinar Libras é
processo fundamental na
inclusão a partir da acessibilidade comunicacional.
Por
um lado, tal ação descortina
a visão do colonizado, que vislumbra os surdos como intelectualmente atrasados,
primitivos e sem abstrações, linguisticamente pobres, psicologicamente agressivos e imaturos, socialmente sem articulações,
portanto isolados (Skliar, 2015). Por outro lado, desmitifica perceber o falar
do surdo como uma totalidade, com o agravamento de reproduzir a ideologia
dominante tanto criticada. Nesse contexto, segundo Skliar (2015), decolonizar é
inscrever o surdo fora da concepção de realizar “somente os surdos homens,
brancos, de classe média que
frequentam as instituições escolares, que fazem parte de movimento de
resistência, que lutam pelos seus direitos linguísticos e cidadania etc.”
(p. 14). Assim, mostra-se como
um equívoco perceber os surdos como um grupo homogêneo e com solidez em seus
processos identificatórios.
Ao mencionar os surdos,
descreve-se a inserção sem generalizações banalizadas, que são sujeitos
multifacetados e com tantas identidades móveis que podem se autodescrever quanto às possibilidades que a realidade pode
neles se inscrever. É preciso recordar que a existência dos surdos de classes
populares, daqueles que não sabem que são surdos, das mulheres surdas, dos
surdos negros, dos surdos meninos de rua, entre outros, bem como “os receios,
as assimetrias de poder entre surdos, os
privilégios, a falta de compromisso com [suas] reivindicações sociais etc.” (Skliar, 2015, p. 14-15).
Nesse contexto, as
possibilidades de processos decoloniais advindas da aprovação da Lei de Libras
(Lei no 10.436/2002) são ilimitadas, requerendo novas posturas
diante das pesquisas acadêmicas, em prol de novas ações que contribuam com as
práticas pedagógicas e
P. 13
as
políticas públicas educacionais que viabilizem a facilitação da inserção do
sujeito surdo em todos os âmbitos sociais.
Em sua trajetória, a
comunidade surda interagiu como protagonista em mobilizações e reivindicações
diversas a favor da aprovação da Lei em comento. Nesse sentido, tal ação
decolonial em conjunto foi uma unanimidade nos movimentos surdos (Thoma &
Klein, 2010). Nesse ponto, faz-se importante revisitar como se reflete a
decolonialidade, pois faz parte de uma gama de análises dentro dos estudos
pós-coloniais que fomentaram os estudos culturais, que buscam pesquisar o povo
surdo fazendo uso de outras lentes, sobretudo pelo viés político. Assim, convém
explicitar a decolonialidade sendo uma atitude desafiadora das “estruturas
sociais, políticas e epistêmicas da colonialidade — estruturas até agora
permanentes — que mantém padrões de poder enraizados na racionalização, no
conhecimento eurocêntrico e na inferiorização de alguns seres como menos
humanos” (Walsh, 2009, p. 24).
A decolonialidade pode ser
entendida, portanto, como os “momentos históricos em que os sujeitos coloniais
se revoltam contra os ex-impérios e reivindicam a sua independência. Refere-se
à luta contra a lógica da colonialidade e seus efeitos materiais, epistémicos e
simbólicos” (Maldonado-Torres, 2019, p. 36).
Atualmente, na necessidade de
estudos de temáticas emergentes à colonialidade, constata-se o discurso da
surdez sendo narrado para novas ressignificações. Uma delas é a aproximação
materializada que a surdez não é uma temática da audiologia, mas, sim, de
epistemologia. Esta, por sua magnitude e expansão, não pode ser compreendida no
sentido da Filosofia ou da Pedagogia do Desenvolvimento, pois perpassa sua
apreensão no sentido político interceptado pela conectividade entre
conhecimento e poder (Wrigley, 1996).
Assim, tem-se a geração da
crítica pós-colonialista dos estudos surdos, ou seja, uma aproximação
decolonial aos estudos culturais em Educação que visa investigar novas
representações dos surdos, novas concepções linguísticas (culturais,
antropológicas, identitárias), de modo a distanciar-se das marcas
clinicoterapêuticas e de deficiência sobre a surdez (Fernandes & Lopes,
2019; Lunardi, 2015; Skliar, 2015).
Tal ação também pode ser
compreendida como a redescoberta de um campo de pesquisa que estuda a diferença
linguística e cultural das comunidades surdas, via engendramentos da
problematização da história narrativa colonialista, sobrepujada aos surdos a
partir de uma óptica prevista da normalidade ouvinte. Como primícia, promove
uma ressignificação epistemológica para outros olhares sobre a produção
cultural, acadêmica e modo de conhecer, explicar, narrar a surdez e as
experiências surdas do cotidiano.
As investigações que envolvem
a cultura surda no âmbito nacional podem ser evidenciadas nos estudos de
Karnopp et al. (2011), Perlin e Miranda (2003), Skliar (2015) e Strobel (2009,
2018) sobre a identidade surda; Quadros e Karnopp (2004) no campo de pesquisa
sobre a Libras; Silveira et al. (2003) no tocante à literatura surda; Fernandes
e Lopes (2019) em letramento bilíngue para surdos; e Thoma e Klein (2010) em
movimento de surdos — contribuições incorporadas às políticas educacionais
nacionais e locais para surdos no Brasil.
Diante dessas análises, é
possível inferir que os estudos surdos inauguram um movimento denso e complexo
em favor da luta decolonial do povo surdo, por defender os aspectos
P. 14
singulares e as
peculiaridades de sua identidade, promovendo a subjetividade e o modo de ser
próprios dentro de uma sociedade marcada pela modernidade/colonialidade.
Na atual construção de sua
luta decolonial, o povo surdo tem na sua educação umas das mais promissoras
vertentes à educação bilíngue. Por suas características que orientam a educação
partindo da primeira língua (Libras) rumo à segunda língua (Português escrito),
coloca em questão as assimetrias entre surdos e ouvintes de forma propositiva.
Nesse viés, tanto a cultura quanto a identidade surda são alicerçadas em uma
perspectiva bilíngue, que vem transformando o cenário educacional brasileiro no
repensar de suas práticas educacionais e políticas públicas pedagógicas para
esses grupos de minoria.
Como forma de expressão
decolonial, vale destacar a literatura surda em geral e o slam do corpo
(Santos, 2018) — lembrando que não se almeja esgotar, no estudo aqui
apresentado, a definição ou a delimitação de cultura surda, por concebê-la como
ilimitada, promovida por ilimitados discursos que podem representá-la ou
inventá-la de acordo com as diversas realidades que a cercam (Pinheiro, 2012).
A literatura surda busca
romper com os perigos da fixação e do fetichismo sobre as identidades, que
podem ser classificadas ao delimitar a cultura surda. Ela visa o reconhecimento
e a importância da tradição cultural nativa e a recuperação das histórias
reprimidas do surdo colonizado. Sem romancear o passado ou fabricar uma
homogeneização da história atual, traz o hibridismo como um reflexo do viés
colonial presente, culminando na troca entre o sujeito surdo e o ouvinte. Serve
ainda como um instrumento pedagógico e cultural para desenvolver a memória das
vivências surdas através de suas gerações ou auxiliando no desenvolvimento
decolonial de sua identidade (Strobel, 2009).
Partindo desses pressupostos,
Karnopp (2006) defende que:
A literatura
surda começa a se fazer presente entre nós, se apresentando talvez como um
desejo de reconhecimento, em que busca um outro lugar e uma outra coisa. A
literatura do reconhecimento e de importância crucial para as minorias
linguísticas que desejam afirmar suas tradições culturais nativas e recuperar
suas histórias reprimidas. (p. 100)
Com essa mesma prerrogativa de
demanda por decolonizar as representações da cultura surda, nasce o slam do
corpo como fonte de poesia de resistência oriunda da comunidade surda (Santos,
2018). O slam são famosas batalhas de poesias autorais, com livre expressão
poética, em que questões de temática de problemas sociais de grupos de minoria
são discutidos (racismo, machismo, entre outros) — problemas que têm se
espalhado por vários lugares no mundo, sobretudo na América Latina (Santos,
2018).
O primeiro slam para surdos no
Brasil foi criado pelo grupo Corpo Sinalizante, integrado por surdos e ouvintes
que, de forma performática, apresentam as batalhas de poesia em Língua de Sinais
e língua portuguesa, concomitantemente. É importante destacar que não se trata
de uma tradução/interpretação da poesia em Libras para a língua portuguesa ou
vice-versa. Em realidade, apresenta-se como uma relação intermodal,
complementar, pois, aqui, nenhuma das duas línguas se sobrepõe a outra, mas
interagem entre si por meio dos performers (Santos, 2018).
P. 15
Os artefatos culturais do povo
surdo (normas e valores) abarcam-se nas diferentes representações
socioculturais e políticas que a educação bilíngue ilimitadamente pode entrever
(Strobel, 2018). Nesse sentido, segundo Santos (2018), “pensar na poesia surda
que se expressa através das mãos, do corpo, também é pensar no ato incansável
de luta e resistência das populações e comunidades surdas pelo empoderamento
linguístico e identitário” (p. 5). Assim, parte-se da compreensão de que a
identidade linguística é muito mais que código, símbolo ou instrumento de
comunicação. Ela, antes de qualquer enunciação, é uma bandeira política que
deixa suas marcas de identidade de um povo, como forma de existir de um grupo
de minoria (Miglioli & Santos, 2017; Rajagopalan, 2003).
Ao refletir sobre as questões
temáticas que envolvem a educação do povo surdo, vale direcionar rumo ao
aumento das escolas bilíngues, visando novos contornos às antigas demandas
históricas que se contrastam com o abandono e, ao mesmo tempo, com os avanços
na Educação de Surdos.
O resgate de seus artefatos
culturais, de sua história, de sua identidade e de seus direitos linguísticos
por meio da Língua de Sinais para fundamentar a descentralização da educação
bilíngue surge como agenda para uma educação com vista à decolonialidade do
poder, do ser e do conhecimento dos surdos no campo da deficiência, a fim de
justificar os meios ouvintistas empregados nela.
A seguir, com a intenção de
abrir para novos questionamentos importantes para a temática em comento, têm-se
as considerações finais sobre as reflexões aqui desenvolvidas.
A partir das discussões aqui
apresentadas, ainda se faz necessário refletir sobre a história da Educação de
Surdos a partir dos sujeitos que a engendram. Como um exercício de alteridade
para uma conduta científica com viés decolonial, têm-se nas linhas que se
seguiram um relevante registro de memória e validação de novos conhecimentos, a
partir de epistemologias que sofreram epistemicídio em fase ou em toda sua
história, por serem parte da modernidade/colonialidade que constitui a
sociedade vigente.
Ampliar novas formas de
leitura de mundo sobre os acontecimentos que subjugam um grupo de minoria
transforma a prática educativa para uma emancipação do conhecimento e de
saberes. Buscar observar a história da Educação de Surdos, a partir de uma
perspectiva da história crítica dos surdos, e devolver a eles seu papel de
protagonismo e de atores sociais, é uma das contribuições do presente estudo,
mesmo que feito de forma sucinta.
Atrela-se como pressuposto
dessa discussão o viés que a história da educação do povo surdo foi grifada
pela opressão da colonialidade do poder linguístico em todas as suas dimensões,
sobretudo na educação. Diante do exposto, vale refletir sobre a importância do
reconhecimento da Libras como status linguístico oficial, representando
ilimitada possibilidade decolonial para a presença participativa e visível do
povo surdo. Contudo, somente o reconhecimento da Libras não garante a
efetivação de propostas curriculares pedagógicas pautadas na Língua de Sinais
como uma língua majoritária, no sentido de contemplar as singularidades e as
subjetividades de seus interlocutores.
P. 16
Por fim, a presente pesquisa
possibilitou compreender que, como práxis decolonial, tem-se um movimento de
recusa do povo surdo quanto à sua opressão. Este resiste por meio da
valorização de sua cultura e identidade, de produções e artefatos culturais.
Tanto no campo artístico e estético como em novas epistemologias, como os
estudos surdos, a comunidade surda busca outros meios para enfrentar os
impactos colonizadores e de colonialidade que experienciaram e vivenciaram em
seu fazer histórico. As análises avançam nos discursões do campo da Educação de
Surdos por primar em elencar as contribuições de sujeitos surdos sobre sua
própria história educativa e sendo protagonistas de suas pesquisas. Nesse
sentido, aliar os Estudos decoloniais com a Educação de Surdos é ampliar a promoção
de uma proposta decolonial para novas práticas de participação dos sujeitos de
quem se fala.
Por fim, aspira-se que as
discussões aqui provocadas contribuam para o fortalecimento de estudos e ações
que visem uma forma decolonial das questões linguísticas, educacionais,
identitárias, entre outras dimensões sociais e culturais, para a efetivação do
povo surdo em todas as esferas sociais, bem como estimule ações decoloniais
criativas de fazer-pensar e pensar-fazer novas “posturas nos processos e nas
práticas que perturbem, transgridem, intervêm e insurgem, e que mobilizam,
propõem, provocam, ativam, e constroem outras formas” (Mignolo & Walsh,
2018, p. 34). Por via da presente pesquisa, buscamos não perpetuar os saberes
colonizados sobre a comunidade e o povo surdo bem como as aspirações outrora
apresentadas. Nesse sentido, é de valia considerar a necessidade de articular
novas práxis decoloniais em prol da libertação dos grilhões da colonialidade
que forja cada ser humano.
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Recebido em: 21/08/2023
Reformulado em: 26/11/2023
Aprovado em: 10/12/2023
P. 20
Página
notas de rodapé
Nota 1, página 1: https://doi.org/10.1590/1980-54702024v30e0156
Nota 2, página 1: Professora.
Secretaria do Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF). Doutoranda.
Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Humano e Escolar (PGPDE).
Psicologia. Universidade de Brasília (UnB). Mestra em Direitos Humanos e
Cidadania. Licenciada em Matemática e Libras. Brasília/Distrito Federal/Brasil.
E-mail: simone.silva061@gmail.com.
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9525-9610
Nota 3, página 1: Professor.
Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Departamento de
Métodos e Técnicas. Universidade de Brasília (UnB). Doutor em Educação. Mestre
em Ensino de Ciências. Graduado em Ciências Biológicas. Brasília/Distrito
Federal/Brasil. E-mail: heliomaia@unb.br. ORCID:
https://orcid.org/0000-0002-8162-1137
Nota 4, página 1: Professora.
Programa de Pós-Graduação em Psicologia na Universidade de Brasília (UnB).
Doutora e Mestra em Psicologia. Psicóloga. Brasília/Distrito Federal/Brasil.
E-mail: 57pedroza@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2251-5040
Nota 5, página 3: Ferdinand
Berthier é um autor surdo que evidenciava, em suas pesquisas, que os surdos já
tiveram protagonismo em suas produções acadêmicas e culturais, antes da
proibição do uso da língua de sinais pelo Congresso de Milão, em 1880. Foi
escolhido justamente por ser surdo e realizar importantes registros da
comunidade surda e seus contextos históricos (Berthier, 2006). Já Karin Strobel
é uma pesquisadora surda, que promove um recontar sobre a história dos surdos,
a partir de uma visão descolonizante dos próprios surdos, ao elencar as três
fases históricas que envolvem essa comunidade (Strobel, 2009, 2018). Observa-se
que esses autores escolhidos não descartam a importância dos demais
pesquisadores surdos, mas que atingem o objetivo deste artigo, por pertencerem
a séculos distintos e contextualizarem a educação de surdos, a partir de um
olhar de surdos.