Título: Fundo
público e políticas sociais na crise do capitalismo.
Autor: Evilasio Salvador.
Este
material foi adaptado pelo Laboratório de Acessibilidade da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, em conformidade com a Lei 9.610 de 19/02/1998,
não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins comerciais.
Adaptado
por: Milena Brito.
Revisado
por: Francisca Maria.
Adaptado
em: Abril de 2025.
Padrão
vigente a partir de março de 2022.
Referência:
SALVADOR, Evilasio. Fundo público e políticas sociais na crise do capitalismo. Serviço
Social & Sociedade, São Paulo,
n. 104, p. 605-631, out./dez. 2010.
P. 605
Evilasio
Salvador[nota**]
Resumo: A
característica comum a todas as crises financeiras dos últimos trinta anos é o
comparecimento do fundo público para socorrer instituições financeiras falidas
durante as crises bancárias, à custa dos impostos pagos pelos cidadãos. Com a
financeirização da riqueza, os mercados financeiros passam a disputar cada vez
mais recursos do fundo público, impedindo a expansão dos direitos sociais. Este
artigo tem por objetivo discutir a crise do capital a partir do papel exercido
pelo fundo público e seus rebatimentos no financiamento da seguridade social no
Brasil.
Palavras-chave: Crise. Fundo público.
Tributação. Seguridade social.
Abstract:
The characteristic that has been common to all financial crises in the last 30
years is the appearance of the public fund to bail out bankrupt financial
institutions during the banking crises, at the expense of taxes paid by the
citizens. Financing wealth, financial markets dispute resources from the public
fund more and more, which impedes the expansion of social rights This article
aims to discuss the crisis of the capital from the role played by public funds
and their impact on the financing of social security in Brazil
Keywords: Crisis.
Public fund. Taxation. Social security.
P. 606
Introdução
A característica comum a todas
as crises financeiras dos últimos trinta anos é o comparecimento do fundo
público para socorrer instituições financeiras falidas durante as crises
bancárias, à custa dos impostos pagos pelos cidadãos.
A financeirização da riqueza
implica em pressão sobre a política social, especialmente as instituições da
seguridade social, pois aí está o nicho dos produtos financeiros. Com isso, as
propostas neoliberais incluem a transferência da proteção social do âmbito do
Estado para o mercado, a liberalização financeira passa pela privatização dos benefícios
da seguridade social.
É no mercado que deve ser
comprado o benefício de aposentadoria, o seguro de saúde, que são setores
dominantes nos investidores institucionais. Ou seja, benefícios da seguridade
social são transformados em mais um “produto” financeiro, alimentando a
especulação financeira, tornando as aposentadorias de milhares de trabalhadores
refém das crises financeiras internacionais.
Com a financeirização da
riqueza, os mercados financeiros passam a disputar cada vez mais recursos do
fundo público, pressionando pelo aumento das despesas financeiras do orçamento
estatal, o que passa pela remuneração dos títulos públicos emitidos pelas
autoridades monetárias e negociados no mercado financeiro, os quais se
constituem importante fonte de rendimentos para os investidores institucionais.
Com isso, ocorre um aumento da transferência de recursos do orçamento público
para o pagamento de juros da dívida pública, que é o combustível alimentador
dos rendimentos dos rentistas. Nesse bojo, também se encontram generosos
incentivos fiscais e isenção de tributos para o mercado financeiro à custa do
fundo público
Este artigo tem por objetivo
discutir a crise do capital a partir do papel exercido pelo fundo público e
seus rebatimentos no financiamento da seguridade social no Brasil. Para tanto,
o artigo está organizados em quatro seções, além desta
introdução. A próxima seção analisa a crise e a instabilidade do capitalismo
com o socorro realizado pelo fundo público ao grande capital, além das
modificações ocorridas na proteção social sob a égide da financeirização da
riqueza. A segunda seção é dedicada ao estudo do fundo público no Brasil,
particularmente a regressividade do financiamento tributário e as suas
consequências no financiamento da seguridade social. Em seguida apresentam-se
P. 607
rebatimentos da
crise do atual do capital sobre o financiamento da seguridade social. Por fim,
na última seção são apresentadas algumas propostas para garantir e ampliar os
direitos sociais no Brasil.
Crise
e instabilidade do capitalismo: o papel do fundo público
Os países capitalistas
desenvolvidos passaram por profundas transformações ao longo do século XX, que
marcaram avanços na proteção social, particularmente após a Segunda Guerra
Mundial, com a consolidação do chamado Estado social A luta dos trabalhadores
por melhores condições de vida e por uma situação mais digna de trabalho
construiu a experiência de determinado padrão de proteção social, no período de
1945 a 1975, nos países do centro do capitalismo.
Para tanto, foi decisiva a
intervenção do Estado acoplada com as políticas de cunho keynesiano/fordista,
destacando-se as modificações redistributivas no orçamento público: pelo lado
do financiamento, a implantação de sistemas tributários mais justos tendo como
base a cobrança de impostos diretos e progressivos; pelo lado dos gastos,
destaca-se, entre as políticas sociais, a edificação da seguridade social,
articulando as políticas de seguros sociais, saúde e auxílios assistenciais
(Salvador, 2010).
Com isso, ocorre na sociedade
também uma disputa por recursos do fundo público no âmbito do orçamento
estatal. O orçamento público é um espaço de luta política, onde as diferentes
forças da sociedade buscam inserir seus interesses. Na sua dimensão política, o
orçamento pode ser visto como uma arena de disputa ou um espaço de luta (ou
cooperação) entre os vários interesses que gravitam em torno do sistema
político (Inesc, 2006).
O fundo público envolve toda a
capacidade de mobilização de recursos que o Estado tem para intervir na
economia, além do próprio orçamento, as empresas estatais, a política monetária
comandada pelo Banco Central para socorrer as instituições financeiras etc. A
expressão mais visível do fundo público é o orçamento estatal. No Brasil, os
recursos do orçamento do Estado são expressos na Lei Orçamentária Anual (LOA)
aprovada pelo Congresso Nacional.
A Lei Orçamentária Anual (LOA)
de 2010 fornece pistas dos valores em disputa no fundo público brasileiro: R$
1.860.428.516.577,00. Excluindo o
P. 608
refinanciamento da
dívida e orçamento de investimento das empresas estatais, os orçamentos fiscal
e da seguridade social totalizam R$ 1,170 trilhão. No entanto, quase um quarto
desse valor (R$ 271 bilhões) está previsto para o pagamento de juros e
amortização da dívida pública, ou seja, destinado à esfera da financeirização
da riqueza, beneficiando, conforme Pochmann (2007), apenas 20 mil famílias
O acelerado crescimento
econômico do Brasil, por mais de 50 anos no século XX, não foi capaz de obter
resultado da mesma magnitude dos países do capitalismo central, mantendo grande
parte de sua população com condições precárias de vida e trabalho. Para
Francisco de Oliveira (1990), no caso brasileiro, a intervenção estatal que
financiou a reprodução do capital não financiou no mesmo nível a reprodução da
força de trabalho, pois teve como padrão a ausência de direitos. A mudança mais
importante ocorreu na CF/88, destacadamente o orçamento social — expresso na
política da seguridade social, com financiamento exclusivo.
O fundo público ocupa um papel
relevante na articulação das políticas sociais e na sua relação com reprodução
do capital. A presença dos fundos públicos na reprodução da força de trabalho e
gastos sociais é uma questão estrutural do capitalismo. Para Francisco de
Oliveira (1998, p. 19-20), “o fundo público, em suas diversas formas, passou a
ser o pressuposto do financiamento da reprodução da força de trabalho,
atingindo globalmente toda a população por meio dos gastos sociais”.
Existe uma miríade de formas
de gastos sociais e de financiamento, incluindo a questão da manutenção e da
valorização dos capitais pela via da dívida pública A formação do capitalismo
seria impensável sem o uso de recursos públicos, que, muitas vezes, funcionam
como uma “acumulação primitiva”. Como se mostra na atual da crise do
capitalismo.
De acordo com Behring (2004,
p. 164):
Há no
argumento de Oliveira um elemento indiscutível: o lugar estrutural do fundo
público no capitalismo contemporâneo, como expressão da sua maturidade e
imensas contradições. A produção e a realização do valor vão requisitar que o
Estado se aproprie de parcela bastante significativa da mais-valia socialmente
produzida para assegurar as condições gerais de produção e reprodução; dentro
desse processo comparece o desenvolvimento de políticas sociais como lugar
relevante de alocação do fundo público, a pender, claro, da correlação de forças
políticas e de elementos culturais em cada formação nacional.
P. 609
Para compreendermos a crise
atual do capitalismo e seus rebatimentos
sobre
o Brasil é necessário estudar as dinâmicas da financeirização da riqueza e as consequências sobre a proteção social. Nesse
sentido, esta seção faz um resgate histórico para compreender a situação da
crise atual do capital, e que tudo indica ser uma crise sem precedência na
história do capitalismo e distante do seu fim. Pois a Europa está entrando em
uma profunda recessão, e esta situação deve durar ao longo dos próximos anos.
Entre o final dos anos 1960 e
começo da década de 1970, o desenvolvimento fordista, as políticas keynesianas
e o projeto de Estado social, que vigorou nos países centrais, são postos em xeque,
e consigo os direitos derivados da relação salarial. A nova fase de acumulação
capitalista vai ser capitaneada pela esfera financeira, e no campo ideológico o
velho liberalismo se veste com a “nova” roupagem, rebatizado de neoliberalismo.
A crise se manifesta junto com
a reação do capital contra o Estado social. A onda de expansão do capitalismo
expõe também a contradição do próprio sistema, e o avanço tecnológico com uso
intensivo de capital vem acompanhado de economias com a força de trabalho,
solapando o pacto dos anos de crescimento com pleno emprego e o arranjo da
social-democracia para as políticas sociais.
O baixo retorno dos
investimentos produtivos, ou seja, a queda na rentabilidade leva a uma fuga do
capital do setor produtivo para a esfera financeira, agindo de forma
especulativa.[nota 1]
A especulação financeira vai ganhar novos contornos a partir de meados da
década de 1970, com a criação dos novos “produtos” financeiros A economia
americana conviveu nesse período com um processo inflacionário cercado de
incertezas financeiras, gerando uma instabilidade internacional das taxas de
juros e de câmbio. Nos anos 1960, quando os Estados Unidos passaram a conviver
com inflação ascendente e com incertezas financeiras, que levaram à extinção
da conversibilidade ouro do dólar[nota 2] e, por consequên
P. 610
cia, à
explosão da instabilidade mundial das taxas de juros e de câmbio, a moeda
deixou de ser plenamente estável, mesmo nos países desenvolvidos.
No novo cenário econômico
mundial, há uma busca irrestrita de mobilidade global por parte do capital para
a qual a flexibilização e as políticas liberalizantes são imperativas. Em
verdade, a expansão do capitalismo, na busca de um mercado global, não é
novidade na história desse modo de produção.
Uma das novidades no processo
de globalização, no século XX, é a acentuação da esfera financeira no processo
de acumulação capitalista, em que as alterações em curso trazem maior
instabilidade econômica e taxas de crescimento medíocres ou negativas. Por
outro lado, são realizadas com o aprofundamento da globalização financeira
(Fiori e Tavares, 1993), evidente com a crescente autonomia do capital
financeiro relativamente ao setor produtivo industrial e à maior dependência
dos investimentos dos fluxos internacionais de capitais, que se tornam mais
voláteis e atomizados, trazendo sérias consequências ao “mundo do trabalho”
(Mattoso, 1996).
A análise da macroeconomia
financeira feita por Aglietta (2004) revela que a partir dos anos 1980 ocorreu
uma forte expansão financeira, paralelamente à desaceleração do crescimento
econômico nos países desenvolvidos. O novo ambiente financeiro foi propício
para a acumulação patrimonial das famílias mais ricas
Para Aglietta (2004, p. 25;
grifos nossos):
A
desregulamentação das finanças abriu novas perspectivas para a poupança, que
saiu de seus refúgios tradicionais, nos bancos e nas cadernetas de poupança,
rumo a mercados de títulos e a aquisições imobiliárias. Esse redirecionamento
foi canalizado pelos investidores institucionais (companhias de seguros e
fundos de pensão) que foram forçados pela concorrência a realizar
administrações mais dinâmicas das carteiras que lhes eram confiadas. Ele também
foi acelerado por novos intermediários do mercado, fundos de participação e
negociadores de títulos de todos os tipos A atração das famílias foi garantida
pelas esperanças de
P. 611
ganhos de capital suscitados
pelos mercados abertos, desregulamentados
e vitaminados por incentivos fiscais.
As
transformações que vêm ocorrendo no sistema financeiro internacional têm levado
os bancos, a partir dos anos 1980, a adotar estratégias que possam garantir formas de acumulação de
capital num quadro de maior concorrência no setor bancário. Nesse contexto nascem os novos instrumentos
financeiros, como a securitização das dívidas e os derivativos. Esses produtos
ganham agilidade com os avanços tecnológicos em informática e telecomunicações
no sistema financeiro.
O
desenvolvimento desses mercados especulativos permitiu um enriquecimento
privado, sem encorajar o investimento produtivo. Aglietta (2004, p. 27) destaca
que nos anos 1980 ocorre uma “orientação da poupança rumo aos investidores institucionais, graças ao desenvolvimento de regimes de
aposentadoria por capitalização em numerosos países, estimulado pelas
perspectivas do envelhecimento demográfico”.
Por
outro lado, a vulnerabilidade do sistema financeiro pode levar à existência do
risco sistêmico,
ocasionando a reestruturação global das instituições financeiras, dada a natureza
especulativa da atuação destas, dos preços dos ativos financeiros extremamente flexíveis e de política
monetária restrita à taxa de juros. Com isso, o “efeito dominó” mundial é de
risco permanente em tempos
de globalização financeira
Historicamente,
os recursos financeiros centralizados pela dívida sempre foram cativos dos
mercados financeiros Com a nova etapa da acumulação financeira, os dividendos tornam-se também um mecanismo importante de transferência de riqueza e de acumulação A pressão
dos mercados sobre os grupos industriais impõe novas normas de rentabilidade e
exigências de redução de custos salariais, aumento de produtividade e
flexibilidade nas relações de trabalho. O corolário da liberalização financeira
é a ressurreição de ciclos econômicos, que são intensamente
influenciados pelos preços dos ativos financeiros.
A
partir da década de 1980, a economia norte-americana passa a conviver com crises bancárias repetidas, além de
um craque da Bolsa (outubro, 1987) e de crise imobiliária ao final do século
XX, e que vem a se repetir em 2008. Com crises
financeiras recorrentes, a
principal função dos bancos torna-se impossível, pois o efeito
delas é exatamente a desorganização da intermediação
financeira Diante disso, os bancos não têm mais informações sobre seus
devedores, o que
P. 612
leva ao
estrangulamento do crédito, o qual tem rebatimento sobre toda a economia,
acarretando, por consequência, a depressão econômica (Aglietta, 2004).
Na última década do século XX,
a liberalização financeira chegou aos países em desenvolvimento Os governos das
grandes potências que se debatiam com as sequelas da crise imobiliária
(1990-91) e as grandes instituições financeiras que buscavam novos terrenos de
expansão elaboraram uma doutrina batizada de “Consenso de Washington”. Por
intermédio do FMI, tratava-se de persuadir os governos dos países em
desenvolvimento e dos países desorientados pelo desabamento do comunismo a se
engajar rapidamente na liberalização financeira para um ajuste estrutural rumo
à economia de mercado Os países que aderiram aos novos rumos da globalização
financeira ficaram conhecidos como “mercados emergentes”. Sendo alvo para os
grandes intermediários financeiros internacionais de uma convenção financeira
otimista, atraíram uma avalanche de capitais especulativos com regras
tributárias favorecidas.
O mundo das finanças
globalizadas tem sido marcado por uma sucessão de crises financeiras. A
fragilidade sistêmica das crises, conforme Chesnais (2005), está no volume
elevado de créditos sobre a produção futura que os detentores de ativos
financeiros consideram pretender, assim como na busca de resultados das
aplicações financeiras dos administradores de fundos de pensão. Em contexto de
baixo crescimento econômico comparativamente aos capitais que buscam se
valorizar nos mercados financeiros, as crises financeiras decorrentes da
especulação e da instabilidade sistêmica são inevitáveis
A liberalização financeira tem
sido marcada por sucessivas crises. Na realidade como lembra Lordon (2007, p.
1):
Desde que ela
se impôs, tem sido difícil passar mais de três anos seguidos sem um incidente
de envergadura. Quase todos poderiam figurar nos livros de história econômica:
1987, quebra dos mercados de ações; 1990, quebra dos junk bonds (“títulos
podres”) e crise das savings and loans (instituições financeiras de poupança e
empréstimos) norte-americanas; 1994, crise de debêntures norte-americanos;
1997, primeira fase da crise financeira internacional (Tailândia, Coreia, Hong
Kong); 1998, segunda fase (Rússia, Brasil); 2001-2003, estouro da bolha da
internet. [nota 3]
P. 613
As crises financeiras nos anos
1990, nos chamados países emergentes (Rússia, México, Argentina, Brasil,
Tailândia, Indonésia e Filipinas), são resultados diretos da liberalização e da
desregulamentação comercial e privatização dos sistemas produtivos desses
países. Para Chesnais (2005), os investidores institucionais incorporaram esses
países à mundialização financeira, mas também perceberam a submissão completa
às políticas neoliberais para a captação dos fluxos de renda.
Em 2008, o mundo é novamente
abalado por uma crise financeira de proporções ainda não dimensionadas, mas
para muitos comparada ao que o capitalismo vivenciou nos anos 1930. O
cataclismo econômico tem como epicentro os Estados Unidos.[nota 4] A
crise teve origem nos empréstimos hipotecários norte-americanos, se arrastando
inicialmente para os bancos de investimentos, as seguradoras e os mercados
financeiros, enfim, a crise se espalhou rápido pela economia dos Estados Unidos
e atinge, atualmente, a Europa e o Japão. Os desdobramentos são para a economia
global, que entra em recessão.
Lordon (2007) destaca o fato
de a bolha especulativa nos mercados financeiros ser muito próxima à fraude,
que requer a atração e a entrada constante de novos investidores para manter o
mercado em alta e a ilusão de que ganharão sempre.
O segredo é a adesão
especulativa por meio de produtos financeiros de alta rentabilidade que atraem
aplicadores cada vez mais comuns e numerosos, porém cada vez menos
esclarecidos. Para prolongar o crescimento do mercado imobiliário
norte-americano, se possível eternamente, era necessário que as famílias fossem
levadas a procurar o mercado de empréstimos hipotecários, seduzidas pelo sonho norte-americano
da propriedade.
A criatividade do sistema fez
com que surgissem as hipotecas de segunda linha (subprime mortgages) com
beneficiários de duvidosa capacidade de pa-
P. 614
gamento.
Mesmo que existam dificuldades de honrar os empréstimos, os tomadores e os
emprestadores avaliam que o imóvel poderá ser vendido com valorização para uns
e comissão para outros, honrando assim o pagamento da hipoteca.
A criatividade do mercado
financeiro para se desfazer do risco aumentou consideravelmente com a
liberalização financeira e a falta de regulamentação do mercado. Os bancos
ficam com os lucros e socializam os possíveis prejuízos. Assim, os novos
produtos financeiros, como os derivativos — absolutamente sem regulação e
controle do Estado —, levaram os bancos dos EUA a se livrar do problema de
créditos de duvidosa liquidação (empréstimos imobiliários), que ficam
registrados nos balanços, por meio da securitização das dívidas.
Os investidores
institucionais, entre eles os fundos de pensão que devem honrar o pagamento de
aposentadorias, são alguns dos clientes desses produtos, que, apesar do alto
risco, oferecem elevado retorno, obviamente quando tudo vai bem. Os
investidores fazem isso por meio de fundos de investimentos aplicados em
diversos mercados, visando diminuir riscos e reduzir eventuais prejuízos ao
mesmo tempo (hedge funds).
Mas na crise o contágio será
global. O pacote dos produtos derivados do mercado imobiliário prometendo
elevado retorno foi vendido no mercado financeiro globalizado, encontrando-se
nas mãos de inúmeros portadores. Porém o início da história está no mundo real,
ou seja, nos créditos imobiliários que devem ser honrados.
A crise financeira se instala
primeiro nos bancos; a partir disso, há uma grande perda e o colapso tem seu
início. Com a globalização financeira, a situação não se limita às fronteiras
norte-americanas, uma vez que a securitização dos títulos gerou créditos
espalhados em vários mercados financeiros no mundo. Quando a crise se instala, todo o
discurso e a defesa da eficiência do mercado, da privatização, da
desregulamentação se “desmancham no ar”, chamem o Estado, ou melhor, o fundo
público para socializar os prejuízos. Rapidamente o discurso da eficiência dos
mercados parece ter sido esquecido.
Uma amostra que a crise
econômica global ainda não se esfacelou pode ser encontrada nas dificuldades
expostas recentemente pelos países europeus, que compõem o chamado PIIGS:
Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha. Esses países europeus apresentam
elevada dívida pública, e há dúvidas no mercado financeiro internacional da
capacidade de honrar o pagamento. A Itá-
P. 615
lia e a
Grécia têm dívidas que superam o tamanho do Produto Interno Bruto (PIB). A
moeda da União Europeia, euro,
vem sofrendo forte desvalorização frente ao dólar, e diversos analistas veem
risco para o sistema bancário da Europa. É
importante observar que a moeda é unificada, mas os títulos públicos são
nacionais.
As regras da União Europeia definidas pelo Tratado de Maastricht
impõem o teto de 3% sobre o déficit público.[nota 5] Esse limite não vem sendo respeitado por
alguns países, como a Alemanha, que tem déficit acima 6% do PIB Contudo, os
países do PIIGS apresentam déficit entre 10% e 12,7% do PIB — como é o caso da
Grécia —, e devido à menor robustez dessas economias existe o risco de default.
A situação se agravou a partir
da crise financeira que fez elevar ainda mais o déficit público no Sul da
Europa, pois, na tentativa de tirar a economia da recessão, esses países
aumentaram seus gastos públicos para socorrer o capital, principalmente os
bancos. Hoje, com o aperto do crédito, o endividamento da economia e o
“descontrole” fiscal aliado à baixa competitividade da região, coloca-se em
risco o prolongamento da crise econômica mundial O paradoxo é que a “receita”
neoliberal capitaneada pelo FMI, que aprofundou a crise atual do capital,
ressurge das “cinzas” e aparece nas políticas econômicas adotadas há pouco
pelos países europeus, notadamente o ajuste fiscal e o corte nos gastos sociais
Está em curso uma nova onda conservadora no cenário mundial.
Hoje é importante notar que a
liberalidade financeira, os instrumentos de curto prazo (como novos produtos
financeiros) de sustentação dos lucros das empresas e de proteção dos
portfólios do setor bancário privado, as políticas de geração de déficit e a
criação da nova dívida pública trazem consequências danosas e expectativas nada
animadoras para o futuro desses países.
A tendência é de um brutal
corte de direitos e de conquistas sociais, sobretudo no campo da seguridade
social. O que está em jogo é a avaliação que o mercado fará, particularmente o
capital portador de juros, acerca da direção da política fiscal, do
endividamento público e da redução do déficit externo. O corolário poderá ser o
arrocho fiscal com seus efeitos colaterais: recessão, redução do salário e do
emprego nos setores público e privado.
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O capital portador de juros está
localizado no centro das relações econômicas e sociais da atualidade e da
atual crise financeira em curso no capitalismo contemporâneo. Os juros da
dívida pública pagos pelo fundo público ou a conhecida despesa “serviço da
dívida” do orçamento estatal (juros e amortização) são alimentadores do capital
portador de juros por meio dos chamados “investidores institucionais” que
englobam os fundos de pensão, fundos coletivos de aplicação, sociedades de
seguros, bancos que administram sociedades de investimentos. Tudo isso
agrava-se diante da crise dos países europeus, que, oprimidos pela dívida,
poderão minar a economia do continente como um todo, situação que, persistirá
por anos. Esses países deverão fazer pesados pagamentos de juros para honrar as
suas dívidas, limitando os gastos em outras áreas e a expansão de despesas
orçamentárias com políticas públicas que efetivem direitos, que poderiam ajudar
a impulsionar suas economias.
Para Pochmann (2004), nos
países capitalistas desenvolvidos no segundo pós-guerra privilegiou-se a
redistribuição da renda gerada por meio dos fundos públicos, com tributação
sobre os mais ricos e transferências dos recursos dos fundos para os mais
pobres. O Estado social não tratou apenas de disponibilizar serviços sociais e
garantir renda aos pobres, mas tratou principalmente de retirar das forças de
mercado o monopólio da expansão econômica e da gestão sobre a força de
trabalho.
Pela primeira vez, os ricos
passaram a pagar impostos, especialmente com o mecanismo da progressividade
sobre a renda e patrimônio, assim como a população pauperizada passou a ser
beneficiada tanto pelo acesso aos serviços públicos básicos (educação, saúde,
transporte e moradia) como pelos programas de garantia de renda para estudo
(bolsa de estudos), aposentadoria (inatividade por velhice), situação de
invalidez ocupacional (pensão para deficientes físicos e mentais e doenças
profissionais) e condição de desemprego (seguro-desemprego) Em resumo,
consolidou-se uma nova estrutura secundária (fundo público) de redistribuição
da renda, que veio a se sobrepor à já existente estrutura distributiva primária constituída pela
própria dinâmica capitalista Enquanto os ricos passaram a ser tributados
consideravelmente (impostos sobre a renda, patrimônio e herança), foi possível
formar fundos públicos capazes de financiar a transferência de renda para a
população de menor rendimento, permitindo reduzir a pobreza, o desemprego e a
desigualdade social no centro do capitalismo mundial (Pochmann, 2004).
P. 617
Contudo este não é o caso do
Brasil O fundo público no nosso país historicamente favoreceu a acumulação de
capital e apresenta características regressivas, tanto no lado do financiamento
tributário, quanto na destinação dos recursos. Em uma única frase é possível
definir as características do orçamento público no Brasil: financiado pelos mais pobres e trabalhadores
e apropriados pelos ricos.
Fundo
público, tributação e seguridade social no Brasil
Historicamente, o
financiamento tributário no Brasil é regressivo, ou seja, feito por tributos
indiretos que incidem sobre o consumo, sendo que a tributação direta fica
limitada à tributação sobre os salários. Essa situação piorou de 1995 para os
dias atuais, devido às alterações realizadas na legislação tributária infraconstitucional,
que modificaram a reforma tributária realizada na Constituição Federal (CF) de
1988.
A nossa pesquisa (Salvador,
2010) revela que a CF determina uma série de princípios norteadores da política
tributária. Assim, por exemplo, o imposto de renda deverá obedecer, entre
outros critérios, ao da progressividade. Além disso, o Estado deve respeitar o
princípio da capacidade contributiva (CF, art 145, III, § 1°), e os tributos
sobre bens e serviços não devem ser cumulativos. A Constituição, em 1988,
estabeleceu um conjunto de princípios tributários (eles ainda estão lá
escritos) que constituíam uma base importante para edificação de um sistema
tributário baseado na justiça fiscal e social. A começar pela solidariedade que
está subjacente a todos os princípios tributários: a isonomia, a
universalidade, a capacidade contributiva, a essencialidade. A tributação deve
ser, preferencialmente, direta, de caráter pessoal e progressiva.
A CF estabelece ainda que os
contribuintes e os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que
incidem sobre mercadorias e serviços. Até hoje, esse preceito não foi
regulamentado e não está sendo cumprido. O parágrafo 1° do art. 145 estabelece
que os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade
econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente
para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os
direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as
atividades econômicas do contribuinte. No art. 150 fica
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assegurada a
isonomia tributária ao proibir o tratamento desigual entre contribuintes que
se encontrem em situação equivalente.
Ao longo do governo FHC foi
sendo alterada, paulatinamente, a legislação infraconstitucional, solapando ou
tornando nulos os princípios básicos da reforma tributária realizada na
Constituição de 1988, agravando as distorções e, sobretudo, aprofundando a
regressividade do sistema tributário brasileiro. As modificações realizadas nos
anos neoliberais no Brasil constituem verdadeira contrarreforma tributária,
conduzida de forma sorrateira.
As modificações ocorreram nas
leis ordinárias e nos regulamentos tributários, que transferiram para a renda
do trabalho e para a população mais pobre o ônus tributário, alterando o perfil
da arrecadação. Hickmann (2003) observa que as mudanças foram no sentido de
viabilizar o processo de mundialização do capital financeiro, sob a batuta do
Fundo Monetário Internacional (FMI) e facilitando o livre fluxo de recursos
financeiros, e, com isso, permitir a realização de sucessivos superávits
primários de forma a cumprir o ajuste fiscal acertado com o organismo
multilateral.
A contrarreforma tributária sorrateira iniciada no governo FHC e
continuada no governo Lula destruiu os artigos constitucionais dos princípios
tributários, via mudanças na legislação infraconstitucional. Solapou o artigo
150, pois os lucros e dividendos recebidos pelos sócios capitalistas estão
isentos de imposto de renda desde 1996. A título de exemplo, das 23,5 milhões
de declarações de ajuste de imposto de renda do ano-base de 2006 (exercício de
2007), apenas 5.292 contribuintes apresentaram rendimentos tributáveis acima
de R$ 1 milhão.[nota
6] Paradoxalmente, o número de milionários no país não para de
crescer. Conforme revelou o levantamento da The Boston Consulting Group (BCG), o Brasil tinha, em 2008, 220 mil
milionários, uma expansão de 15,7% em relação ao ano anterior (Wiziack, 2008).
A fortuna desses milionários está estimada em aproximadamente US$ 1,2 trilhão,
o que equivale a
praticamente metade do PIB brasileiro. Para o BCG, milionários são aqueles que
têm mais de US$ 1 milhão aplicado no mercado financeiro. Os juros têm
tributação exclusiva e bem menor que os trabalhadores assalariados.
No governo Lula foi editada a
Medida Provisória (MP) n. 281 (15/2/2006), reduzindo a zero as alíquotas de IR
e da (extinta) CPMF para “investidores”
P. 619
estrangeiros no
Brasil. As operações beneficiadas pela MP são cotas de fundos de investimentos
exclusivos para investidores não residentes que possuam no mínimo 98% de títulos públicos federais. Novamente, os
grandes beneficiados pela benevolência tributária do Estado brasileiro são os bancos Após a MP n. 281, vem crescendo o interesse dos
bancos estrangeiros com filiais no Brasil em emitir bônus indexados em reais no exterior. Eles emitem títulos em reais fora do país pagando juros abaixo do Depósito
Interfinanceiro (DI) e depois ingressam com esses recursos como investidores estrangeiros no Brasil,
comprando títulos públicos que pagam DI. Assim, ganham a diferença realizando uma operação de arbitragem (Lucchesi, 2006). Essa é mais uma modificação da legislação que fere a isonomia tributária entre as diferentes espécies de renda, conforme
a Constituição Federal A legislação atual não submete à tabela progressiva do
IR os rendimentos de capital, que são tributados com alíquotas inferiores aos demais
rendimentos (Hickmann, 2002).
A
Lei n. 11.033, de 21/12/2004, promoveu significativas alterações no tratamento tributário
das aplicações financeiras, favorecendo os aplicadores do
mercado financeiro e da Bolsa de Valores. Com isso, a alíquota
do IR sobre os ganhos líquidos auferidos em operações
realizadas em Bolsas de Valores, de Mercadorias, de Futuros e assemelhadas, foi
reduzida de 20% para 15%. Além disso, estão isentos do IR os ganhos
líquidos auferidos por pessoa física em operações no mercado à vista de ações,
cujo valor das alienações realizadas
em cada mês seja igual ou inferior a R$ 20 mil para o
conjunto de ações.
Em linhas gerais, as
principais tendências que marcam as modificações no financiamento tributário no Brasil após 1994 são: a)
aumento da regressividade da carga tributária com a maior incidência de tributos sobre o consumo de bens e serviços; b) apesar da baixa
participação da renda dos salários sobre o total da renda nacional da economia,
a tributação direta no Brasil tem
se limitado e incidido cada vez mais sobre a renda dos assalariados, usando como
mecanismo a não correção integral
pela inflação da tabela do IR; c) tratamento diferenciado da tributação das rendas no país, violando o princípio da isonomia tributária ao tratar com
critérios diferenciados a renda do capital (lucros, dividendos e juros) e do
trabalho, pois há concentração cada vez maior de imposto sobre a renda dos trabalhadores assalariados;
e d) maior
beneficiamento do sistema financeiro pelas modificações
ocorridas nas legislações tributárias do período recente, o que faz com que, assim,
seja proporcionalmente menos tributado que os trabalhadores e outros setores
da economia (Salvador, 2010).
P. 620
Estudo realizado com base na
Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE, de 1996, revela que, no Brasil,
quem ganha até dois salários mínimos gasta 26% de sua renda no pagamento de
tributos indiretos, enquanto o peso da carga tributária para as famílias com
renda superior a trinta salários mínimos corresponde apenas a 7% (Vianna et
al., 2001). Com base nos dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE
de 2002-03, estima-se que as famílias com renda de até dois salários mínimos
arcam como uma carga tributária indireta de 46% da renda familiar, enquanto
aquelas com renda superior a 30 salários-mínimos gastam 16% da renda em tributos
indiretos (Zockun, 2005). O resultado é uma carga tributária regressiva, o que
significa que o Estado brasileiro é financiado, em grade parte, pelas classes
de menor poder aquisitivo e pelos trabalhadores, com a população de baixa renda
suportando uma elevada tributação indireta. Pochmann (2008) também destaca, com
base nos dados da POF do IBGE 2002-03, que o décimo mais pobre da população
sofre uma carga total equivalente a 32,8% da sua renda, enquanto o décimo mais
rico, apenas 22,7%.
Essa estrutura regressiva do
sistema tributário repercute no financiamento da seguridade social. Um olhar
sobre o financiamento seguridade social, no período de 2000 a 2007,
identificando as bases econômicas de incidência tributária (renda, consumo e
patrimônio), que compuseram o custeio das três políticas da seguridade, revela
uma estrutura tributária regressiva, confirmando as características presentes
no sistema tributário brasileiro O resultado apresentado, com base na média
anual das fontes de financiamento da seguridade social, no período de 2000 a
2007, em valores constantes, revela que os tributos diretos responderam por
30,87%, dos quais somente 6,88%
referem-se à tributação direta da renda do capital. Isto significa que os
próprios beneficiários da seguridade social pagam direta ou indiretamente seus
benefícios (Salvador, 2010).
No lado dos gastos, a
prioridade do fundo público tem sido o pagamento de juros e a amortização. As
despesas financeiras que representavam 26,86% dos orçamentos da seguridade
social e fiscal em 2004, sobem para 30,77% em 2007 (Tabela 1). Os valores pagos
com juros e amortização da dívida nos quatro anos de execução do PPA 2004-07
são duas vezes superiores ao montante do gasto da União com assistência social,
saúde, trabalho, educação, cultura, direitos da cidadania, habitação,
saneamento, gestão ambiental, organização agrária, desportos e lazer.
P. 621
TABELA 1
Despesas com a Dívida, 2004 a 2007 — R$
milhões
Ano |
Juros e encargos (a) |
Amortizações (b) |
Despesas financeiras (c) =
(a) + (b) |
Refinanciamento |
|
2004 |
74.373,39 |
71.677,57 |
146.050,96 |
364.418,01 |
|
2005 |
89.839,64 |
49.274,21 |
139.113,85 |
495.579,15 |
|
2006 |
151.151,88 |
120.929,46 |
272.081,34 |
376.832,92 |
|
2007 |
140.311,78 |
97.093,32 |
237.405,11 |
374.783,32 |
|
Total |
455.676,70 |
338.974,55 |
794.651,25 |
— |
|
|
|
|
|
|
|
Participação no Orçamento em % |
|||||
2004 |
13,68% |
13,18% |
26,86% |
||
2005 |
14,80% |
8,12% |
22,92% |
||
2006 |
18,73% |
14,99% |
33,72% |
||
2007 |
18,18% |
12,58% |
30,77% |
||
Média |
16,35% |
12,22% |
28,57% |
||
Em valores deflacionados pelo
IGP-DI |
|||||
Ano |
Juros e encargos (a) |
Amortizações (b) |
Despesas financeiras (c) = (a) +
(b) |
||
2004 |
92.164,11 |
88.823,43 |
180.987,54 |
||
2005 |
101.762,45 |
55.813,49 |
157.575,93 |
||
2006 |
161.572,94 |
129.266,85 |
290.839,79 |
||
2007 |
147.442,01 |
102.027,31 |
249.469,33 |
||
Total |
502.941,50 |
375.931,08 |
878.872,59 |
||
Média |
125.735,38 |
93.982,77 |
219.718,15 |
||
Em % do PIB |
|||||
Ano |
Juros e encargos (a) |
Amortizações (b) |
Despesas financeiras (c) = (a) +
(b) |
||
2006 |
3,83% |
3,69% |
7,52% |
||
2005 |
4,18% |
2,29% |
6,48% |
||
2006 |
6,48% |
5,18% |
11,66% |
||
2007 |
5,48% |
3,79% |
9,28% |
||
Fonte: Siafi/SIGA Brasil.
P. 622
Mandel (1990) argumenta que no capitalismo tardio há uma
tendência inevitável de que o Estado incorpore um número crescente de setores
produtivos e reprodutivos às condições gerais de produção que financia. Sem
essa socialização dos custos, esses setores não seriam nem mesmo remotamente
capazes de satisfazer as necessidades do processo capitalista de trabalho. Com
isso, ocorre o uso crescente do orçamento do Estado para o financiamento de pesquisas e dos custos
do desenvolvimento, e as despesas estatais são destinadas a financiar ou
subsidiar grandes projetos industriais.
O fundo público não pode ser
considerado o antivalor, como afirma Chico de Oliveira. O fundo público está
presente na reprodução do capital (Salvador, 2010):
1)
Como
fonte importante para a realização do investimento capitalista. No capitalismo
contemporâneo, o fundo público comparece por meio de subsídios, de
desonerações tributárias, por incentivos fiscais, por redução da base
tributária da renda do capital como base de financiamento integral ou parcial dos
meios de produção, que viabilizam, como visto anteriormente, a reprodução do
capital.
2)
Como
fonte que viabiliza a reprodução da força de trabalho, por meio de salários
indiretos, reduzindo o custo do capitalista na sua aquisição. Além disso, é a
força de trabalho a responsável direta, no capitalismo, pela criação do valor.
3)
Por meio
das funções indiretas do Estado, que no capitalismo atual garante vultosos
recursos do orçamento para investimentos em meios de transporte e
infraestrutura, nos gastos com investigação e pesquisa, além dos subsídios e
renúncias fiscais para as empresas.
4)
No
capitalismo contemporâneo, o fundo público é responsável por uma transferência
de recursos sob a forma de juros e amortização da dívida pública para o capital
financeiro, em especial para as classes dos rentistas.
Portanto, o fundo público
participa indiretamente da reprodução geral do capital, seja por meio de
subsídios, negociação de títulos e garantias de condições de financiamento dos
investimentos dos capitalistas, seja como elemento presente e importante na
reprodução da força de trabalho, única fonte de criação de valor na sociedade
capitalista.
P. 623
Os rebatimentos
da crise no financiamento da seguridade social
Em
um mundo capitalista dominado pela globalização financeira, é importante analisar
os desdobramentos dessa nova
face da crise
para o Brasil A moeda brasileira, que tem seguido a variação dos preços das commodities, tende a se depreciar enquanto persistirem
as incertezas na economia global O movimento esperado é
que os investidores financeiros ou, melhor dizendo, os especuladores
financeiros retirem recursos dos países emergentes para se refugiarem no dólar e em títulos do governo americano, dificultando o financiamento do balanço de pagamentos do Brasil.
Esse
movimento já é sentido no Brasil, cuja apreciação da moeda norte-americana é superior a 8% neste ano. Ou seja, a situação econômica
de alguns países europeus cria pânico nos mercados e
encarece o dólar no Brasil. Caso ocorra uma desvalorização ainda maior do real,
poderá
haver alguma consequência desagradável para a economia brasileira,
decorrente do encarecimento do
crédito externo, da pressão inflacionária
e das dificuldades a ser enfrentadas pelos produtos brasileiros que são exportados
para a Europa Convém atentar para o desdobramento sobre os bancos de capital
estrangeiro com matriz nos países europeus e agências no Brasil, uma vez que o sistema
financeiro se internacionalizou de forma considerável nos últimos anos.
O
Brasil não foi poupado da crise financeira internacional, contudo, foi um dos
últimos atingidos e um dos primeiros a sair dela Isto por diversos motivos, entre eles menor endividamento comparado com as
economias mais ricas do planeta e por ser grande produtor de commodities,
que cresceram consideravelmente
no segundo semestre de 2009, puxada pelas importações da China (hoje o maior parceiro comercial do Brasil).
Além
disso, o volume de operações de crédito fechou 2009 com novo recorde, após
crescer por dez meses consecutivos. De acordo com dados divulgados pelo Banco
Central, o estoque total de dinheiro emprestado cresceu 1,6% em dezembro em
relação ao mês anterior e chegou ao valor recorde de R$ 1,41 trilhão No ano, o
crescimento foi de 14,9%.
Contudo, essa situação poderá indicar problemas futuros de endividamento das
famílias.
Associada
à expansão
do crédito destaca-se o potencial do consumo interno
proporcionado pelas políticas sociais no campo da seguridade social:
previdência e assistência social.
Essas políticas, que têm sido alvo permanente de
P.
624
ataques do
neoliberalismo, transferem renda para mais de 39 milhões de pessoas. Em 2009,
foram pagos 15,5 milhões de benefícios no Regime Geral de Previdência Social
(RGPS) aos trabalhadores urbanos; 7,9 milhões aos trabalhadores rurais; 3,4
benefícios assistenciais (BPC e RMV); e, 12,3 milhões de famílias receberam o
benefício do Programa Bolsa Família (PBF). Esses benefícios foram responsáveis
pela injeção
de R$ 257,2 bilhões na economia em 2009, o que garantiu a
continuidade do consumo, independentemente da renda advinda do trabalho, e são
importantes conquistas da cidadania brasileira na Constituição de 1988. [nota 7]
No
âmbito das políticas monetárias e fiscais, o governo brasileiro agiu rápido no
socorro ao grande capital, especialmente o financeiro. Considerando as medidas
de combate à crise, que não têm impacto direto no caixa do governo (orçamento público), o montante de
recursos que foi despendido alcançou R$ 475 bilhões. Nesse valor estão,
sobretudo, as medidas adotadas no
campo da política monetária, destacadamente as mudanças nas regras do depósito
compulsório, leilões com dólar e a linha de troca de moeda com o Federal Reserve
(FED), que somaram R$ 284 bilhões. Com isso, o Banco Central socorreu os bancos
mais uma vez.
A flexibilização
nas regras dos depósitos compulsórios foi também uma
oportunidade para que algumas instituições financeiras pudessem elevar os
recursos que têm em caixa com a venda de ativos para os maiores bancos. De forma que o fundo público no Brasil atuou no âmbito das políticas monetárias no sentido de liberar
recursos para as instituições financeiras, sem quaisquer contrapartidas
de manutenção ou ampliação de postos de
trabalhos e dos direitos sociais. A rapidez e a agilidade do fundo público brasileiro usadas para
socorrer o mercado financeiro são mais
uma amostra
da influência dos bancos no domínio da agenda econômica
do nosso país.
No
campo política
fiscal, as medidas adotadas pelo Brasil foram bem mais modestas. A Organização Internacional do Trabalho (OIT)
divulgou, em março de 2009, que o Brasil foi o país que
teve em 2008 o menor gasto relativo, entre os aqueles que integram o G-20, em
medidas para
reduzir o impacto da crise financeira global. De acordo
com a OIT, o Brasil gastou o equivalente a 0,2%
P. 625
do PIB
em incentivos fiscais, ficando com o pior desempenho entre os 32 países que
também anunciaram recursos A Organização conclui, com base nas medidas contra
a crise anunciadas por 32 países, que o montante destinado a pacotes de
estímulo chegou a US$ 1,19 trilhão, mas que apenas 1,8% do total foi investido
em ações de proteção social e somente 9,2% das despesas foram destinadas a
promover o emprego. Portanto, o conservadorismo fiscal no Brasil é bem mais
rígido que alhures.
Mesmo com a crise de 2009,
diante da qual que se esperava uma atitude mais ousada do governo brasileiro
para a expansão de gastos com direitos que protegessem os cidadãos da
instabilidade econômica, o governo optou por fazer um superávit primário
efetivo do setor público de 1,93% do PIB, ou seja, já descontando o resultado
dos investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Esse resultado implica forte
restrição na ampliação das despesas orçamentárias destinadas a garantir
direitos da seguridade social. Esse resultado financeiro superavitário foi
também garantido pelas medidas extraordinárias tomadas pelo governo federal no
fim de 2009 para elevar as receitas fiscais, como o recolhimento de depósitos
judiciais e a antecipação de dividendos da Eletrobrás.
A pressão pelo ajuste nas
contas públicas deverá recair sobre as despesas sociais, particularmente do
orçamento da seguridade social. Aliás, essa situação fiscal deverá ser tema
dominante na pauta econômica da eleição presidencial deste ano, com setores
conservadores defendendo a realização de déficit nominal zero para o próximo
governo Para este ano, as declarações do secretário do Tesouro Nacional, Arno
Augustin, é que o governo vai cumprir a “meta cheia” do superávit primário de
3,3% do PIB em 2010, sem abater investimentos do PAC como em 2009. E de acordo
com o secretário deve ocorrer queda nominal das despesas públicas, após a
elevação de 15% no ano passado.
Em relação às despesas
públicas, é importante dizer que se constitui um mito a afirmação que há um
descontrole nas despesas com pessoal, pois os gastos públicos com ativos,
aposentados e pensionistas, que representavam 5,36% do PIB em 1995,
reduziram-se para 4,76% em 2009, conforme dados da Secretaria do Tesouro
Nacional (STN). Além disso, as despesas com saúde e educação estão bem abaixo
dos padrões internacionais dos países do OCDE Assim como a Previdência Social
está distante da universalização no Brasil, pois metade dos trabalhadores
ativos está fora do sistema.
P. 626
Uma questão importante a ser
destacada é que as medidas de desonerações tributárias adotadas para combater a
crise afetaram o financiamento do orçamento da seguridade social,
enfraquecendo a capacidade deste orçamento para cobrir com suas receitas
exclusivas as despesas previdenciárias, de assistência social e de saúde.
De acordo com a Secretaria da
Receita Federal do Brasil (SRFB), ao longo de 2009, o desempenho da
arrecadação tributária em relação a 2009 encolheu 3,05%. Em termos reais, em
valores deflacionados pelo IPCA, o equivalente a uma perda de R$ 21,5 bilhões.
Os tributos que mais contribuíram para essa queda de arrecadação foram a
Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e a
contribuição social para o PIS/Pasep, que são fontes importantes no
financiamento da seguridade social brasileira, respondendo por 49% do declínio
da arrecadação tributária em 2009.
Essa queda na arrecadação da
Cofins e do PIS/Pasep é atribuída pela Receita Federal a uma conjunção de
fatores relacionados, em grande parte, à crise econômica. Em decorrência da
crise ocorreu uma piora dos indicadores macroeconômicos, que influenciaram
diretamente a arrecadação tributária, entre eles a produção industrial, a
lucratividade das empresas e a queda no volume geral de vendas no varejo no ano
de 2009 em relação a 2008. E, destacadamente, as desonerações tributárias
estimadas em R$ 24,9 bilhões.
Acontece que o orçamento da
seguridade social continua perdendo recursos de suas fontes tributárias “exclusivas”
devido à transferência de recursos para o orçamento fiscal por meio da
Desvinculação das Receitas da União (DRU). A DRU transforma os recursos destinados ao
financiamento da seguridade social em recursos ficais para a composição do
superávit primário e, por consequência,
a
sua utilização em pagamento de juros da dívida.
O “Relatório resumido da
execução orçamentária do governo federal e outros demonstrativos” divulgado
pela Secretaria do Tesouro Nacional, com dados de 2009, revela que a DRU desviou
do Orçamento da Seguridade Social para o Orçamento Fiscal o montante de R$ 39,2
bilhões. Já foram surrupiados desde 2000 mais de R$ 300 bilhões da seguridade
social.
Além disso, com os recursos da
seguridade social o governo também paga os benefícios previdenciários dos
servidores públicos federais que, por princípios constitucionais, não
incluiriam esse tipo de gasto. Apesar de legítimas, as despesas com inativos e
com pensionistas da União devem pertencer ao
P. 627
Orçamento Geral, o qual é financiado por
tributos, e não por recursos exclusivos da política de proteção social. A
União transferiu para a responsabilidade do orçamento da seguridade social um
estoque de gastos com aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais
que deveriam ser honrados pelo caixa do orçamento fiscal.[nota 8] As
despesas com inativos e pensionistas da União pagas com recursos da seguridade
social superam R$ 50 bilhões, o que representa 15% do montante gasto nas
funções orçamentárias de previdência, assistência social e saúde.
Esse quadro pode delinear
maior pressão por uma nova “reforma” na Previdência Social e por cortes no
orçamento social do governo no próximo mandato presidencial. Com a volta do
ataque dos conservadores aos direitos da seguridade social, especialmente na
Previdência Social, como a instituição da idade mínima, o fim da vinculação dos
benefícios com o salário mínimo e as mudanças nas regras das pensões, entre
outros. O falso argumento do déficit da Previdência Social que insistentemente
tem sido anunciado pelos profetas do
caos (Fagnani, 2008) deve ser o tom do debate político e econômico. Os profetas do caos não mostraram
nenhuma preocupação com o “equilíbrio” fiscal, quando o Banco Central voltou a
aumentar a taxa básica de juros da economia no primeiro semestre deste ano.
Aliás, caso seja confirmada a previsão do mercado financeiro que o aumento da
taxa básica de juros chegue 11,75% neste ano, haverá um aumento de, no mínimo,
R$ 8 bilhões nas despesas do governo em 2010 e R$ 12,1 bilhões no próximo ano
(Khair, 2010). No final de abril a dívida pública alcançou R$ 1,9 trilhão,
sendo que 36% dela está atrelada à Selic (taxa de juros básica da economia)
Aqui reside o verdadeiro “rombo” das contas públicas brasileiras, pois o
pagamento de juros e a amortização da dívida pública compromete 30% do
orçamento público brasileiro. No período de 2000 a 2009, o Fundo Público
transferiu o equivalente a 45% do PIB produzido em 2009 para os rentistas, o
que seria suficiente para o governo federal custear a educação durante 40 anos,
se mantido o mesmo valor gasto 2009 Ou ainda pagar por sete anos os benefícios
previdenciários para mais de 23 milhões de aposentados e pensionistas.
P. 628
Propostas
para garantir os direitos sociais na crise do capital[nota 9]
Como demonstrado neste artigo,
o fundo público no Brasil é financiado de forma regressiva. Nesse sentido, uma
verdadeira reforma tributária garantidora de direitos passa por alterações no
sistema tributário, visando assegurar o caráter progressivo e redistributivo
dos tributos que promova a justa distribuição de renda e de riqueza. A Proposta
de Emenda Constitucional n. 233/2008, em tramitação no Congresso, deve ser
rechaçada, pois sepulta o financiamento das políticas sócias. Torna-se
necessário elevar a participação dos tributos diretos, ampliando a
progressividade do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), tributando os
lucros, dividendos e juros; instituir o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF)
previsto na Constituição Federal de 1988 como de competência da União.
No tocante ao financiamento
das políticas sociais, é necessário restabelecer, imediatamente, as bases de
financiamento dos direitos sociais assegurados pela Constituição Para tanto é
fundamental:
a)
Extinguir a DRU e carrear a totalidade desses
recursos para a área social, em respeito aos princípios inaugurais da Carta de
1988.
b)
Aplicação integral dos recursos do orçamento da
seguridade social na seguridade social em cumprimento aos artigos 194 e 195 da
Constituição Federal.
c)
Elaboração dos orçamentos da seguridade social,
fiscal e das estatais, de forma segregada, conforme o art. 165 da Constituição
Federal.
d)
Assegurar bases sustentadas de financiamento do
Sistema Único de Saúde (SUS), com a regulamentação da Emenda Constitucional n.
29.
e)
Assegurar que, a médio prazo, parte da
capitalização do Fundo Soberano que está sendo constituído com recursos das
taxas e royalties da exploração do pré-sal seja canalizada para o financiamento
de programas sociais visando o combate à pobreza e a concentração da renda.
P. 629
Em relação ao sistema de
seguridade social, é urgente o cumprimento dos artigos 195 e 59 (Atos das
Disposições Constitucionais Provisórias) da CF, que tratam da responsabilidade
do Poder Público na “organização da seguridade social” O cumprimento da
Constituição Federal exige que o planejamento das ações da seguridade seja
realizado forma integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, pela
Previdência Social, pela assistência social e pelo seguro-desemprego. No
entanto, desde o final dos anos 1980, em desacordo com a Constituição, governos
optaram pelo caminho da fragmentação. Recriar o Conselho Nacional de Seguridade
Social (extinto em 1998) com a responsabilidade de coordenar o planejamento
integrado das ações dos setores que integram a seguridade social, bem como pelo
controle social sobre as fontes e usos do orçamento da seguridade social. Além
da ampliação dos direitos para proteger o trabalhador face a gama variada de
ameaças que o afetam, com destaque para os riscos clássicos incapacitantes do
trabalho — que se potencializam na atual crise do capital —, ainda não
atendidos pela proteção da seguridade social, principalmente a universalização
dos direitos da Previdência e da assistência social.
Artigo recebido em ago./2010 ■
Aprovado em ago./2010
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propostas de reforma na relação econômica do governo com o setor privado. São
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Página notas de rodapé
Nota *, página 605: Este
artigo é resultado da exposição realizada na mesa “Cenários da crise do
capitalismo e as alternativas econômicas e políticas” durante o 3° Seminário
Anual de Serviço Social realizado pela Cortez Editora no dia 10 de maio de
2010, em São Paulo. As reflexões aqui apresentadas estão aprofundadas, em
parte, no livro de minha autoria Fundo público e seguridade social no Brasil,
publicado pela Cortez em 2010.
Nota **, página 605: Economista,
doutor em política social; professor do Departamento de Serviço Social e do
programa de pós-graduação em Política Social da Universidade de Brasília (UnB),
Brasília/DF, Brasil. E-mail: evilasiosalvador@gmail.com.
Nota 1, página 609: De acordo
com Aglietta (2004), o conceito de especulação foi definido, em 1939, pelo
economista Nicholas Kaldor: “a compra (ou venda) de mercadorias tendo em vista
uma revenda (ou recompra) em data posterior, onde o móbil de tal ação é
antecipação de uma mudança dos preços em vigor, e não uma vantagem resultante
de seu uso, ou uma transformação ou transferência de um mercado para outro”
(Kaldor, 1987, apud Aglietta, 2004, p. 44). Completa Aglietta (2004, p. 44):
“especular, portanto, é antecipar em condições nas quais as variáveis que
participam na formação do preço são incertas. É uma atividade orientada para a
percepção do futuro”
Nota 2, página 609: Refere-se
ao fim do acordo de Bretton Woods, que permitiu, a partir de julho de 1944, a
condução do dólar norte-americano à condição de moeda referencial do sistema
financeiro internacional, estabelecendo a hegemonia norte-americana no sistema
monetário, pois nos EUA estava a maior parte do ouro que lastreava o dólar. Em
15 de agosto de 1971, o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, anunciou
ao mundo o fim da conversibilidade do dólar em ouro, acabando com o acordo de
Bretton Woods, rompendo com o sistema de câmbio fixo, que regulava as economias
dos países centrais e, portanto, os fluxos financeiros e de comércio que
funcionavam desde o segundo pós-guerra.
Página notas de rodapé
Nota 3, página 612: Refere-se
ao estouro da bolha especulativa das empresas “pontocom”. Conforme Duménil e
Lévy (2008): “Após as recessões de 1982 e 1990, a atividade foi efetivamente
sustentada pelo impulso miraculoso das novas tecnologias, ditas ‘da
informação’. Lentamente no começo, mas de modo particularmente tenaz, a onda
agigantou-se na segunda metade da década de 1990: quatro anos de boom, durante
os quais os valores tecnológicos foram propelidos a alturas sem precedentes: a
bolsa Nasdaq, que negociava ações de 1.053 empresas em janeiro de 1996, passou
a abrigar 5.132 em março de 2000. O capital estrangeiro afluiu precipitadamente
para aproveitar a inesperada vantagem. Mas ao boom seguiu-se o crackestrondoso:
em outubro de 2002, o número de empresas com ações na Nasdaq havia despencado
para 1.114”.
Nota 4, página 613: Uma
análise jornalística crítica da crise financeira de 2008 pode ser lida no Le Monde Diplomatique (edição
brasileira) escrita pelo jornalista Antonio Martins com o título “Para compreender
a crise financeira”, em 7/10/2008. Disponível em:
<http://diplo.uol.com.br/2008-10,a2623>.
Nota 5, página 615: Note-se
que, por esse critério, o Brasil poderia participar da Zona do Euro, pois vem
praticando, nos últimos anos, um superávit primário acima de 3% do PIB.
Nota 6, página 618: Informações
fornecidas pela SRFB ao Observatório de Equidade do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (Brasil, 2009).
Nota 7, página 624: Dados
extraídos dos dados do Sistema Integrado da Administração Financeira (Siafi),
disponibilizados pelo sistema. Siga (www.senado.gov.br).
Página notas de rodapé
Nota 8, página 627: No governo
FHC, em 1998, foi feita uma alteração no art. 17 da Lei n. 8.212 (que dispõe
sobre a organização da seguridade social e institui plano de custeio) para
permitir que o pagamento dos EPUs seja feito com os recursos da seguridade
social que incidem sobre o faturamento (Cofins) e com o lucro das empresas
(CSLL), desde que assegurada a destinação de recursos para as ações de saúde e
assistência social (Lei n. 9. 711, de 20/11/1998). Porém o governo não atende
plenamente as despesas da seguridade social.
Nota 9, página 628: Algumas
dessas propostas foram aprovadas no seminário “Direitos sociais: avanços e
perspectivas”, que reuniu especialistas de instituições acadêmicas, movimentos
sociais e populares para refletir e debater sobre as conquistas sociais de 1988
e os novos desafios que se colocam no presente para avançar na ampliação e
universalização dos direitos sociais no Brasil. Maiores informações podem ser obtidas
em <www.direitosociais.org.br>