Este material foi adaptado pelo laboratório de acessibilidade da universidade federal do rio grande do norte, em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998, capítulo IV, artigo 46. Permitindo o uso apenas para fins educacionais de pessoas com deficiência visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins comerciais.

 

Revisado por: Andressa Raniely

Natal, setembro de 2018.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Recuperação Extrajudicial. In_____. Novo manual de direito comercial: direito de empresa. 29. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 30, p. 367-373.

 

 

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Capítulo 30

RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

 

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1.         REQUISITOS DA RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

Muitas vezes pode ocorrer de a recuperação judicial depender da revisão de determinados créditos, cujos titulares resistem a qual­quer proposta de renegociação. Se esses credores representam uma minoria do passivo da empresa em crise, não é justo que se frustre a recuperação pela falta do apoio deles. A recuperação representa a possibilidade de todos os credores virem a receber seus créditos, em razão do sacrifício que eles (ou parte deles) concordam em suportar. A negativa de uma parcela minoritária dos credores em aderir ao plano de recuperação não deve comprometer a chance de superação da crise. Para evitar o comprometimento, a LF prevê que o plano de recuperação extrajudicial apoiado pela maioria dos credores atingidos pode ter seus efeitos estendidos aos demais, mesmo contra a vontade desses (hipótese em que a homologação judicial é obrigatória).

Para simplesmente procurar seus credores (ou parte deles) e tentar, em conjunto com eles, encontrar uma saída negociada para a crise, o empresário não precisa atender a nenhum dos requisitos da lei para a recuperação extrajudicial. Estando todos os envolvidos de acordo, assinam os instrumentos de novação ou renegociação e assumem, por livre manifestação da vontade, obrigações cujo cumprimento espera-se que proporcione o reerguimento do devedor. Quando a lei estabelece requisitos para a recuperação extrajudicial, ela está se referindo apenas ao devedor que pretende oportunamente levar o acordo à homologação judicial. Se essa não é necessária (por­que todos os atingidos aderiram ao plano) nem conveniente (porque não tem interesse o devedor em arcar com as despesas do processo), é irrelevante o preenchimento ou não das condições legalmente estabelecidas.

Os requisitos legais para a homologação do plano de recupe­ração extrajudicial são de duas ordens: subjetivos (dizem respeito ao requerente) e objetivos (são pertinentes ao plano submetido à homologação).

 

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Assim, o devedor que precisa ou pretende requerer a homologação da recuperação extrajudicial deve preencher os seguintes requisitos: a) atenderás mesmas condições estabelecidas pela lei para o acesso à recuperação judicial; b) não se encontrar em tramitação nenhum pedido de recuperação judicial dele (LF, art. 161, § 3.°, primeira parte); c) não lhe ter sido concedida, há menos de 2 anos, recuperação judicial ou extrajudicial (art. 161, § 3.°, segunda parte).

De outro lado, são cinco os requisitos objetivos: a) não pode ser previsto no plano o pagamento antecipado de nenhuma dívida (LF, art. 161, § 2.°, pri­meira parte); b) todos os credores sujeitos ao plano devem receber tratamento paritário, vedado o favorecimento de alguns ou o desfavorecimento apenas de parte deles (art. 161, § 2°, segunda parte); c) o plano não pode abranger senão os créditos constituídos até a data do pedido de homologação (art. 163, § l.°, in fine); d) do plano só pode constar a alienação de bem gravado ou a supressão ou substituição de garantia real se o credor garantido (hipotecário, pignoratício etc.) concordar expressamente (art. 163, § 4.°); e) o plano de recuperação não pode estabelecer o afastamento da variação cambial nos créditos em moeda estrangeira sem contar com a anuência expressa do respectivo credor (art. 163, § 5.°).

 

2.         HOMOLOGAÇÃO FACULTATIVA

Na lei, há duas hipóteses distintas de homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial. A primeira, que denomino facultativa, é a homologa­ção do plano que conta com a adesão da totalidade dos credores atingidos pelas medidas nele previstas. Dela cuida o art. 162 da LF Quando todos os credores cujos créditos são alcançados pelo plano (isto é, nele altera-se seu valor, venci­mento, condições de pagamento, garantias etc.) aderiram às suas cláusulas, a homologação judicial não é obrigatória. Se o plano de recuperação extrajudicial ostenta a assinatura de todos os credores por ele atingidos, a homologação não é condição para os obrigar. Eles já se encontram obrigados nos termos do plano, por força da adesão resultante de manifestação de vontade. O ato judicial não é necessário para que o crédito seja alterado em sua extensão ou condições.

Dois são os motivos que podem justificar a homologação facultativa. O primeiro é revestir o ato de maior solenidade, para chamar a atenção das partes para a sua importância. O segundo é possibilitar a alienação por hasta judicial de filiais ou unidades produtivas isoladas, quando prevista a medida (LF, art. 166).

Ao requerer a homologação facultativa, o devedor deve instruir o pedido com a justificativa do pleito e o instrumento de recuperação extrajudicial (plano, acordo, termo etc.) assinado por todos os credores aderentes.

 

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Após receber a petição inicial devidamente instruída, o juiz determina a publicação de edital convocando os credores a apresentarem eventuais impugnações. O prazo para impugnar o plano de recuperação extrajudicial é de 30 dias, seguintes à publi­cação do edital. Nos mesmos 30 dias, o devedor requerente deve provar que comunicou, por carta, todos os credores sujeitos ao plano, domiciliados ou sediados no Brasil, informando-lhes a distribuição do pedido de homologação extrajudicial, as condições do plano apresentado e o prazo para a impugnação.

Processada a impugnação, se houver, o juiz decide o pedido, homologando o plano de recuperação extrajudicial ou denegando a homologação.

3.         HOMOLOGAÇÃO OBRIGATÓRIA

Ao lado da homologação facultativa do plano de recuperação extrajudicial, prevê a LF também a homologação obrigatória. Trata-se da hipótese em que o devedor conseguiu obter a adesão de parte significativa dos seus credores ao plano de recuperação, mas uma pequena minoria resiste a suportar suas con­sequências. Nesse caso, é injusto que a oportunidade de superação da crise da empresa se perca em razão da recusa de parcela minoritária dos credores.

Com a homologação judicial do plano de recuperação extrajudicial, estendem-se os efeitos do plano aos minoritários nele referidos, suprindo-se desse modo a necessidade da adesão voluntária.

Para ser homologado com base no art. 163, o plano de recuperação extrajudicial deve ostentar a assinatura de credores titulares de pelo menos 3/5 de todos os créditos de cada espécie. Por “espécies” de crédito se deve entender, para os fins de aplicação desse dispositivo, as classes referidas nos incs. II, IV, V, VI e VIII do art. 83: a) crédito com garantia real; b) crédito com privilégio especial; c) crédito com privilégio geral; d) crédito quirografário; e) crédito subordinado. São essas cinco as espécies de crédito a serem consideradas na recuperação extrajudicial. A adesão ao plano, para autorizar sua homologação obrigatória, deve ser de credores titulares de pelo menos 3/5 dos créditos com garantia real, de pelo menos 3/5 dos com privilégio especial, de pelo menos 3/5 dos com privilégio geral e assim por diante.

Só têm relevância considerar, na aferição do elevado grau de adesão ao plano de recuperação extrajudicial, os créditos alcançados pelo plano (LF, art. 163, § 2.°).

 

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O processamento da homologação obrigatória é idêntico ao da facultati­va, exceto no que diz respeito à instrução da petição inicial. Para o pedido de homologação facultativa, a lei estabeleceu instrução singela, consistente na justificativa e no plano. Não há mesmo sentido em exigir-se mais do devedor nessa hipótese, porque os efeitos da homologação facultativa são modestos. O plano conta com a adesão de todos os credores por ele alcançado, e a homolo­gação não lhes afeta os direitos creditórios.

Contudo, a instrução do pedido de homologação obrigatória, em vista do maior alcance dos efeitos desta, deve ser mais complexa. Além da justificativa e do plano (com a assinatura da maioria aderente), deve o devedor apresentar em juízo: a) exposição de sua situação patrimonial; b) demonstrações contábeis relativas ao último exercício; c) demonstrações contábeis referentes ao período desde o fim do último exercício e a data do plano, levantadas especialmente para o pedido; d) documento comprobatório da outorga do poder para novar ou transigir para os subscritores do plano em nome dos credores (por exemplo: ato de investidura do administrador de sociedade empresária acompanhado do estatuto ou do contrato social, instrumento de procuração com poderes específicos etc.); e) relação nominal de todos os credores, com endereço, clas­sificação e valor atualizado do crédito, além da origem, do vencimento e da remissão ao seu registro contábil (LF, art. 163, § 6.°).

 

4.         OS CREDORES NA RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL

Alguns dos credores estão preservados da recuperação extrajudicial; mesmo a homologada judicialmente. A recuperação extrajudicial não altera minimamente os direitos dessas categorias de credores. São, por isso, sujeitos de direito que não podem renegociar os créditos que detêm perante a sociedade empresária por meio do expediente da recuperação extrajudicial. A renegociação só pode se fazer por regras próprias da disciplina legal do crédito em questão ou, quando inexistentes, pelas do direito das obrigações.

Os credores preservados da recuperação extrajudicial são: a) titulares de créditos derivados da relação empregatícia ou de acidente de trabalho; b) credor tributário; c) proprietário fiduciário, arrendador mercantil, vendedor ou promitente vendedor de imóvel por contrato irrevogável e vendedor titular de reserva de domínio; d) instituição financeira credora por adiantamento ao exportador (ACC).

Todos os demais credores estão expostos aos efeitos da recuperação extra­judicial homologada. Se o plano tiver obtido a adesão da maioria (60% do valor do passivo de cada espécie atingida), a extensão dos seus efeitos aos minoritários renitentes é consequência da homologação judicial.

 

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Após a distribuição do pedido de homologação, o credor que tiver aderido ao plano de recuperação extrajudicial não pode dele desistir, a menos que os demais signatários concordem. A anuência do devedor e de todos os credores é condição para a existência, validade e eficácia do arrependimento porque o plano de recuperação extrajudicial deve sempre ser considerado em sua integralidade. Se faltar qualquer um de seus elementos, é possível que o objetivo pretendido (isto é, a recuperação da empresa) não seja alcançado. Desse modo, como a adesão de cada credor é sempre feita no pressuposto de que todos os signatários vão dar sua parcela de contribuição para a realização desse objeti­vo, a desistência de qualquer um deles afeta os interesses dos demais. Atenta a isso, a lei exige a concordância tanto do devedor como dos outros credores aderentes, para que um desses últimos possa se liberar do previsto no plano.