Este material foi adaptado pelo laboratório de acessibilidade da universidade federal do rio grande do norte, em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998, capítulo IV, artigo 46. Permitindo o uso apenas para fins educacionais de pessoas com deficiência visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins comerciais.

 

Revisado por: Andressa Raniely

 

Natal, setembro de 2018.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Regime jurídico dos credores do falido. In:_____. Novo manual de direito comercial: direito de empresa. 29. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 28, p. 346-351.

 

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Capitulo 28

REGIME JURÍDICO DOS

CREDORES DO FALIDO

 

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1.         CREDORES ADMITIDOS

A falência, por ser processo de execução concursal de devedor empresário, compreende todos os credores do falido, civis ou co­merciais.

A lei só exclui da falência: à) credor por obrigações a título gratuito (LF, art. 5.°, I); e b) crédito por despesas individualmente feitas para ingresso na massa falida subjetiva, salvo custas em litígio com esta (inc. II).

A partir do início da verificação dos créditos e até o fim do processo falimentar (ou antes, se houver decisão judicial que não o admita na massa ou dela o exclua), o credor tem os seguintes direitos no processo falimentar:

a)         intervir, como assistente, em qualquer ação ou incidente em que a massa seja parte ou interessada;

b)         fiscalizar a administração da massa;

c)         requerer e promover, no processo de falência, o que for do interesse dos credores, tendo direito à indenização pelas despesas que fizer na defesa do interesse geral da massa (desde que ela tenha auferido vantagem e até o limite desta);

d)         examinar, sempre que desejar e independentemente de auto­rização judicial, os livros e demais documentos da massa.

Os credores podem constituir procurador para representá-los na falência. Se o mandatário for advogado, basta a outorga deprocuração com a cláusula ad judicia. A procuração com a cláusula aà negotia habilita o outorgado a representar o credor apenas nos atos que in­dependem de advogado, como a declaração tempestiva de crédito.

Os credores debenturistas serão representados pelo agente fiduciário (LSA, art. 68, § 3.°, d). Caso não exista, os debenturis­tas se reunirão em assembleia para eleger um representante.

 

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Os debenturistas são os únicos credores que podem fazer a declaração coletiva de crédito, dispensando-se a apresentação de todos os títulos originais.

2.     EFEITOS DA FALÊNCIA QUANTO AOS CREDORES

A sentença declaratória da falência produz quatro principais efeitos em relação aos credores: a) formação da massa falida subjetiva; b) suspensão das ações individuais contra o falido (art. 6.°); c) vencimento antecipado dos cré­ditos (art. 77); d) suspensão da fluência dos juros (art. 124).

A massa falida subjetiva é o sujeito de direito despersonalizado voltado à defesa dos interesses gerais dos credores de empresário falido. Por vezes, na defesa desses interesses, age a massa falida como sucessora do falido, cobrando judicial ou amigavelmente os devedores; em outras ocasiões, a massa falida age na defesa dos interesses gerais dos credores contra o próprio falido, como na ação revocatória. No primeiro caso, sendo sucessora do falido, não terá mais direitos que os ele titulava antes da quebra.

A massa falida objetiva é o conjunto de bens arrecadados do falido. Não se confunde com a massa falida subjetiva, que é a comunhão de interesses dos credores. A lei chama as duas simplesmente de massa falida, mas são figuras diversas, referindo-se uma (massa objetiva) a um objeto de direito e outra (massa subjetiva) a um sujeito de direito.

A suspensão das ações individuais dos credores contra o falido é consequência da sentença declaratória da falência. Ela dá início ao processo de exe­cução concursal do devedor empresário, sendo despropositado que os credores continuassem a buscar individualmente a cobrança dos seus créditos.

Há exceções à regra de suspensão das execuções individuais. São as seguintes: a) as ações que versam sobre quantia ilíquida, coisa certa, prestação ou abstenção de fato (art. 6.°, § l.°), inclusive reclamações trabalhistas; e b) as execuções fiscais fundadas em certidão da dívida ativa para cobrança de crédito tributário, não tributário ou parafiscal (CTN, art. 187).

Não se incluem nas exceções as execuções individuais promovidas pelo credor com direito real de garantia ou com privilégio geral ou especial.

As ações e execuções que não se suspendem com a falência terão prosseguimento com a massa falida. Ela será representada pelo administrador judicial. Tais ações não serão atraídas ao juízo universal da falência (Cap. 25, item 1). Para eficiente resguardo de seus interesses, o autor de ação judicial não suspensa deverá solicitar ao juiz reserva (LF, art. 6.°, § 3.°).

 

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Outro efeito da sentença declaratória da falência é o vencimento antecipado dos créditos contra o falido. Do valor deles serão abatidos os juros legais (LF, art. 77). Excetuam-se deste efeito as obrigações sujeitas à condição suspensiva, cujos credores devem participar da verificação dos créditos. Neste caso, contudo, o pagamento é postergado até que se verifique a condição.

Finalmente, a quebra acarreta a suspensão da fluência de juros. Apenas os juros devidos à data da quebra podem ser habilitados na falência. Os juros posteriores à falência serão pagos apenas após o pagamento de todos os credo­res, caso restem recursos na massa (LF, art. 124). Excetuam-se desta regra as obrigações com garantia real, em relação à qual serão pagos os juros posterio­res à decretação, sempre que o possibilitar o valor da venda do bem dado em garantia. Também os credores debenturistas são mencionados como exceção, mas se cuida apenas dos titulares de debêntures com garantia real.

O pagamento da correção monetária não segue a regra estabelecida para os juros. A correção monetária não representa qualquer acréscimo ao valor devido, uma vez que apenas atualiza a expressão em moeda do mesmo valor; deverá ser paga, então, junto com o principal.

3.         CLASSIFICAÇÃO DOS CRÉDITOS

Os credores do falido não são tratados igualmente. A natureza do crédito influi na definição de uma ordem de pagamento, que deve ser rigorosamente observada pelo administrador judicial na liquidação.

A ordem é a seguinte:

a) os créditos extraconeursais (LF, art. 84), como a remuneração do administrador judicial, as despesas com a arrecadação e administração dos bens do falido, as custas judiciais, bem como os correspondentes às restituições em dinheiro etc.;

b) créditos por acidentes de trabalho e créditos trabalhistas, compreenden­do toda a sorte de pagamentos devidos pelo empresário aos seus empregados (CLT, art. 449, § 1.º); nessa mesma classe, estão os créditos dos representantes comerciais (Lei 4.886/65, art. 44);

c) créditos com garantia real, até o limite do valor do bem gravado (art. 83,11);

d) dívida ativa, de natureza tributária ou não tributária, excetuadas as multas (CTN, art. 186; Lei 6.830/80, art. 4.°, § 4.°; LF, art. 83,III);

e) créditos com privilégio especial (art. 83, IV);

 

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f) créditos com privilégio geral (art. 83, V);

g) créditos quirografários (art. 83, VI);

h) as multas contratuais e penas pecuniárias por infração à legislação penal ou administrativa, incluindo as tributárias (art. 83, VII); e

i) créditos subordinados (art. 83, VIII).

A preferência dos créditos trabalhistas (derivados da relação empregatícia) está limitada ao valor de 150 salários mínimos por credor. O que ultrapassar esse limite é reclassificado como crédito quirografário. Por outro lado, para a proteção dos trabalhadores de menor renda, a lei determina que o administra­dor judicial proceda à antecipação do devido a título de salários vencidos nos 3 meses anteriores à quebra, desde que limitados a 5 salários mínimos por credor trabalhista. Essa antecipação deve ser feita mesmo que não tenham sido ainda atendidos os credores extraconcursais (LF, art. 151).

Os créditos com garantia real são aqueles em que a satisfação do direito do credor encontra-se garantida, por exemplo, por uma hipoteca incidente sobre imóvel do falido ou penhor sobre bem móvel dele. A preferência está limitada ao valor do bem onerado. Vendido este na liquidação da falência, destina-se o produto da venda à satisfação do credor titular da garantia. Se os recursos aferidos pela massa com a venda do bem gravado não forem suficientes ao pagamento integral do crédito garantido, o saldo concorrerá juntamente com os quirografários.

São credores por dívida ativa a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias. Esta dívida pode ter origem tributária ou não. Estabelece a lei uma ordem interna de pagamento entre os credores desta ca­tegoria. Assim, primeiro são satisfeitos os créditos da União e suas autarquias; em seguida, os dos Estados, Distrito Federal, Territórios e suas autarquias, conjuntamente e pro rata; finalmente, os Municípios e suas autarquias, con­juntamente e pro rata (Lei 6.830/80, art. 29, parágrafo único). São exemplos de créditos incluídos nesta categoria; impostos, taxas, contribuição devida à Seguridade Social (Lei 8.212/91, art. 51), anuidade de órgão profissional (Con­selho Regional dos Representantes Comerciais Autônomos, p. ex.) e outros.

Gozam da mesma prioridade da dívida ativa federal os chamados créditos parafiscais: contribuições para entidades privadas que desempenham serviço de interesse social, como o SESC, SESI etc., ou o devido a programa social ad­ministrado por órgão do governo, como o PIS e o FGTS.

São exemplos de credores com privilégio especial: a) o credor por ben­feitorias necessárias ou úteis sobre a coisa beneficiada (CC, art. 964, III);

 

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b) o autor da obra, pelos direitos do contrato de edição, sobre os exemplares dela na falência do editor (CC, art. 964, VII); c) os credores titulares de direito de retenção sobre a coisa retida (LF, art. 83, IV, c); d) os titulados por microem- prcendedores individuais (MEI), microempresários e empresários de pequeno porte (LF, art. 83, IV, d); e) os subscritores ou candidatos à aquisição de unidade condominial sobre as quantias pagas ao incorporador falido (Lei 4.591/64, art. 43, III);/) o credor titular de Nota de Crédito Industrial sobre os bens referidos pelo art. 17 do Decreto-Lei 413/69; g) crédito do comissário (CC, art. 707); h) os segurados e beneficiários credores de indenização ajustada ou a ajustar sobre as reservas técnicas, fundos especiais ou provisões da seguradora ou resseguradora falidas (Decreto-Lei 73/66, com a redação dada pela LC n. 126/2007) e outros.

Por sua vez, é exemplo de crédito com privilégio geral, além dos mencio­nados no art. 965 do CC, o decorrente de debêntures com garantia flutuante (LSA, art. 58, § l.°).

Os créditos quirografários correspondem à grande massa das obrigações do falido. São dessa categoria os credores por títulos de crédito, indenização por ato ilícito (salvo acidente de trabalho), contratos empresariais em geral etc. Após o pagamento desses créditos, restando ainda recursos na massa, deve o administrador judicial atender às multas contratuais e penas pecuniárias por infração à lei, inclusive multas tributárias.

Por crédito subordinado (ou “subquirografário”) entende-se aquele que é pago somente após a satisfação dos credores sem qualquer garantia, prevendo a lei duas hipóteses: a) os créditos dos sócios ou administradores sem vínculo empregatício (LF, art. 83, VIII, b); b) crédito por debêntures subordinadas emitidas pela sociedade anônima falida (LSA, art. 58, § 4.°).

Em relação aos honorários de advogado, a classificação na ordem de pagamento na falência é um tanto complexa. Se devidos pelo falido ao seu próprio advogado, em razão de contrato, o crédito goza de privilégio geral (EOAB, art. 24), mas se decorre de sucumbência, é equiparado ao crédito trabalhista (CPC, art. 85, § 14).

Por força das exceções ao princípio da universalidade do juízo falimen- tar, ou das referentes à suspensão das ações individuais contra o falido, pode ocorrer de um credor ser satisfeito com inobservância da ordem estabelecida. Nesta hipótese, terá o pretendo direito creditício contra aquele que recebeu indevidamente, no valor do que lhe caberia, segundo a natureza de seu crédito e as forças da massa.