Este material foi adaptado pelo laboratório de acessibilidade da universidade federal do rio grande do norte, em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998, capítulo IV, artigo 46. Permitindo o uso apenas para fins educacionais de pessoas com deficiência visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins comerciais.

 

Revisado por: Sarah Cristina

 

Natal, agosto de 2018.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Sócio da sociedade contratual. In:______. Novo manual de direito comercial: direito de empresa. 29. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 11, p. 162-167.

 

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SÓCIO DA SOCIEDADE CONTRATUAL

 

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1. REGIME JURÍDICO DO SÓCIO DA SOCIEDADE CONTRATUAL

            A natureza da situação jurídica do sócio é sui generis, quer dizer, insuscetível de rigorosa sujeição a um regime jurídico próprio ou aproximado de alguma outra figura jurídica, com vistas à definição de parâmetros que auxiliassem a solução das pendências relativas aos seus direitos, deveres e obrigações perante a sociedade. Neste sentido, não se revela correto entendê-lo seja como um proprietário da sociedade empresária (esta, sendo pessoa jurídica, é inapropriável) ou como seu credor (embora tenha direito a participar dos lucros sociais, em caso de falência, o sócio não poderá concorrer à massa, obviamente, se não dispuser de outro título). Desta forma, o sócio submete-se a um regime jurídico que lhe é próprio, composto por um conjunto de obrigações e direitos que a lei e, por vezes, o contrato social lhe reservam.

            Na província das obrigações, há que se mencionar duas de índole legal: participar da formação do capital social e das perdas sociais até o limite da correspondente responsabilidade subsidiária, segundo o tipo societário e outras circunstâncias juridicamente relevantes.

            O sócio que não cumpre com a sua obrigação de contribuir para a formação do capital social é denominado “remisso”. Ao assinar o contrato social, o sócio pode comprometer-se a integralizar a prazo a cota subscrita, fixando-se, no contrato, os vencimentos correspon­dentes. O atraso no cumprimento desta obrigação, ou seja, a não integralização do prometido dentro dos prazos contratualmente fixados, importa a mora do sócio inadimplente. Deverá, então, indenizar a sociedade dos danos emergentes da mora. Permanecendo inadim­plente, os demais sócios poderão optar entre cobrar judicialmente o remisso ou excluí-lo da sociedade. A ação para a cobrança do principal a integralizar, acrescido de juros, poderá adotar a forma executiva e o título será o próprio contrato social, desde que assinado por duas testemunhas.

 

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Já para a apuração da indenização devida será necessária ação de conhecimento.

            Os demais sócios, no entanto, podem optar pela exclusão do sócio remisso, com diminuição do capital social e restituição das entradas feitas. É também lícito aos demais sócios descontarem, destas entradas, quando da restituição, o crédito da sociedade por juros de mora ou por indenização pelo dano emergente da mora, além de outras prestações contratualmente previstas - por exemplo: correção monetária ou multa. Cabe igualmente a alternativa de redução do valor da quota do remisso ao montante integralizado, reduzindo-se o capital social. Finalmente, se não desejarem que a sociedade sofra qualquer efeito em seu crédito, por força da diminuição do capital social decorrente da exclusão do sócio remisso, e sendo ela limitada, poderão os demais sócios atribuir a si ou a terceiro ou mesmo à própria sociedade, as cotas tomadas do sócio inadimplente (CC.arts. 1.004 e 1.058).

            No campo dos direitos, podem ser citados os seguintes:

            a) Participação nos resultados sociais - os lucros gerados pela sociedade, em função do que for deliberado pela maioria societária, observadas eventuais disposições contratuais pertinentes, terão uma das seguintes destinações: capitalização, constituição de reserva ou distribuição entre os sócios. Nesta última hipótese, cada sócio será credor de parte proporcional à sua participação no capital social, salvo previsão contratual diversa (que só não poderá excluir qual­quer dos sócios dos lucros). No término dos negócios sociais, dissolvendo-se a sociedade, terá o sócio o direito de participar do acervo social, na proporção ainda de sua cota, se solução diversa não houver no contrato social. Outro pressuposto para o exercício do direito de participação nos resultados sociais é a inexistência de débito previdenciário da sociedade, isto porque a sociedade empresária devedora do INSS está legalmente proibida de distribuir lucros (Lei 8.212/91, art. 52; Lei 4.357/64, art. 32).

            b) Administração da sociedade - o sócio da sociedade contratual tem o direito de intervir na administração da sociedade, participando da escolha do adminis­trador, da definição da estratégia geral dos negócios etc. É claro que a vontade da minoria societária não prevalecerá em confronto com a da maioria, mas é assegurado a todos os sócios o direito de participação nas deliberações sociais.

            c) Fiscalização da administração - o sócio tem o direito de fiscalizar o andamento dos negócios sociais, especificando a lei duas formas de exercício deste direito: exame, a qualquer tempo ou nas épocas contratualmente estipuladas, dos livros, documentos e do estado de caixa da sociedade (CC, art. 1.021); e prestação de contas aos sócios pelos administradores (CC, art. 1.020), na forma prevista contratualmente ou no término do exercício social.

 

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            d) Direito de retirada - o sócio pode, em determinadas condições, retirar-se da sociedade, dissolvendo-a parcialmente. Terá, então, direito de receber, do patrimônio líquido da sociedade, a parte equivalente à sua cota do capital social.

            Na maioria das sociedades contratuais de prazo indeterminado, o sócio pode retirar-se sem necessidade de motivação. Deverá notificar os demais sócios, os quais devem, em 60 dias, providenciar a alteração contratual correspondente (CC, art. 1.029). Nas contratadas com prazo determinado, somente se houver justa causa comprovada em juízo, poderá o sócio retirar-se antes de vencido o prazo de duração. Em sendo limitada a sociedade com prazo, o direito de retirada surge também quando houver alteração contratual, incorporação ou fusão da qual divirja o sócio (CC, art. 1.077).

            No tocante à propriedade dos lucros gerados pela sociedade empresária, há quem defenda a tese de que eles pertencem à pessoa jurídica sempre, sendo as distribuições periódicas meras antecipações daquilo que os sócios teriam direito ao término dos negócios sociais. Os dividendos, assim, seriam simples amortização de investimento. Esta não é, no entanto, a forma predominante de se entender o assunto. Se os lucros sociais pertencessem sempre à sociedade, falindo esta, os sócios responderiam, perante os credores da pessoa jurídica, também pelo que teriam recebido, até a falência, a título de participação nos lucros sociais, o que não acontece. Os lucros sociais pertencem à sociedade até o exato momento em que a maioria societária, deliberando acerca da destinação do resultado, opta por distribuí-lo, total ou parcialmente, entre os sócios. A partir desta deliberação, os sócios são credores da sociedade pelos dividendos correspondentes e poderão cobrá-los, inclusive judicialmente, salvo em caso de falência da sociedade. Os lucros sociais destinados à capitalização ou à consti­tuição de reservas continuarão no patrimônio da sociedade.

            O pagamento dos sócios, a título de participação nos lucros sociais, não se confunde com outros tipos de remuneração a que o sócio pode ter direito. Assim, o contrato social poderá destinar um pro labore aos que, além da integralização da parte por ele subscrita do capital social, dedicam também trabalho para o desenvolvimento da empresa na função de administrador. Enquanto o lucro remunera o capital investido, e é, por isto, devido mesmo para o sócio que sequer comparece à sede da empresa, o pro labore remunera o trabalho des­pendido pelo sócio. Esta última remuneração, bem como a definição do sócio ou sócios que terão direito a ela, deve constar do contrato social e observar o disposto na legislação tributária.

 

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2. EXCLUSÃO DE SÓCIO

            O sócio da sociedade contratual - a regra não se aplica aos de sociedade institucional - pode ser excluído quando ocorrer uma das hipóteses estabele­cidas em lei:

            a) Mora na integralização — quando o sócio deixa de cumprir, nos prazos, com a sua obrigação de integralizar a cota por ele subscrita, os demais sócios poderão, conforme já estudado, optar pela exclusão do sócio (CC, art. 1.004).

            b) Justa causa - caracterizada pela violação ou falta de cumprimento das obrigações sociais como, por exemplo, no caso de o sócio concorrer com a sociedade empresária, explorando (individualmente ou em outra sociedade) a mesma atividade.

            Para a exclusão de um dos sócios, é necessária a ocorrência de alguma destas causas. A exclusão não é, propriamente, assunto de deliberação da sociedade. Não é a sociedade que expulsa o seu sócio. São os demais sócios que, à vista da ocorrência de fato que a lei define como ensejador da expulsão, passam a titularizar o correspondente direito. A efetiva ocorrência de fato dessa natureza é condição inafastável da exclusão. Se inexistiu a causa legalmente prevista, ela não será possível por mera disposição de vontade dos demais sócios.

            Outro aspecto de alguma imprecisão doutrinária diz respeito à necessidade de vontade majoritária para deliberação da ocorrência de causa de exclusão. Para certos autores, a exclusão sempre seria de sócio minoritário e correspon­deria a direito da maioria societária. Nada mais equivocado, porém, posto que o sócio majoritário também pode ser remisso ou entrar em concorrência com a sociedade; cabe, nestes casos, à minoria societária o direito de exclusão daquele.

            Nas sociedades em nome coletivo e em comandita simples, a expulsão do sócio (minoritário ou majoritário) só pode ser extrajudicial, quando fundada na mora do remisso. Se o fundamento é diverso (descumprimento de outras obrigações sociais), a expulsão deve ser sempre judicial (CC, art. 1.030).

            Na sociedade limitada, a exclusão de sócio minoritário pode-se operar por simples alteração contratual levada a registro na Junta Comercial, devendo o sócio excluído socorrer-se do Poder Judiciário para provar eventual inocorrência de causa de exclusão. A exclusão do sócio minoritário por simples alteração contratual somente é cabível se o contrato de sociedade a permitir e houver deliberação em assembleia de sócios, para a qual tenha sido convocado o excluído (CC, art. 1.085).

 

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Caso o contrato social não permita a expulsão do sócio minoritário, esta deverá necessariamente ser feita por via judicial.

            Já se a hipótese é a de exclusão de sócio majoritário da sociedade limitada, deverão os demais sócios postulá-la perante o Poder Judiciário, cabendo-lhes o ônus da prova da causa de exclusão.

            Expulso da sociedade, o sócio terá direito ao valor patrimonial de sua participação societária. Opera-se, em decorrência da expulsão, a dissolução parcial da sociedade, com diminuição do capital social. Se os sócios o desejarem, evidentemente, poderão evitá-la, subscrevendo e integralizando novas cotas.