II CONGRESSO NACIONAL DE INCLUSÃO NA EDUCAÇAO SUPERIOR E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TECNOLÓGICA I Forum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Acessibilidade das IFES e I Encontro de Pesquisadores de Educaçao Especial da Região Nordeste

OFÍCIO CIRCULAR N.° 001/18-R

Natal, 29 de maio de 2018.

Ao (Às)

Ministério da Educação

Instituições de Ensino Superior e demais representações no âmbito da Educação Superior

Assunto: Carta de Natal pela defesa da inclusão das pessoas com deficiência, das pessoas com transtorno do espectro autista e das pessoas com altas habilidades/superdotação na Educação Superior e Educação Profissional Tecnológica no Brasil.

Senhor Dirigente,

1.                                         Nas últimas décadas, as discussões em tomo da inclusão social da pessoa com

deficiência no contexto internacional resultaram em avanços inquestionáveis no âmbito das políticas públicas e normativas legais, sobretudo no tocante à educação e, mais especificamente, ao acesso e permanência desse público no Ensino Superior.

2.                                         Mais recentemente, a Organização das Nações Unidas aprovou, em 2006, a

Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, sendo ratificada no Brasil como emenda constitucional em 2009 (BRASIL, 2009)[1]. No referido documento, é previsto que “os Estados Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência à educação [...] em todos os níveis, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida” (BRASIL, 2009, Art. 24, Inciso Io).

3.                                         Nesse sentido, a Educação Superior vem demonstrando avanços importantes

nos últimos anos quanto às possibilidades de ampliação de oportunidades no processo educativo, sobretudo a partir do desenvolvimento de Políticas Educacionais direcionadas ao aumento da oferta de vagas a grupos populacionais que se encontram em situações de vulnerabilidade socioeconômica, educacional e cultural, diferentemente da maioria dos jovens em idade de cursar esse nível de ensino no país.

4.                                         Os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio

Teixeira (INEP) indicaram que, em 2016, apenas 14,9% dos/as jovens entre 18 a 24 anos ingressaram no Ensino Superior brasileiro, representando um total de 8.048.701 matrículas, sendo que 35.891 matrículas (0,42%) eram de pessoas com deficiência. Vale, contudo, ressaltar que em 2004 o percentual referente a essa população era de 0,12% do total de matrículas, indicando um aumento exponencial do acesso desse público a esse nível de ensino.


MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

GABINETE DO REITOR                                       __

UjRN

5.                                         Corroborando com as orientações da Organização das Nações Unidas para a

Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, 2017)2, o desenvolvimento de Políticas de Ações Afirmativas adotadas na última década tem favorecido a inclusão de grupos sociais até então colocados à margem da Educação Superior, a exemplo de estudantes com deficiência, transtorno do espectro autista, altas habilidades/superdotação, identificados como “público alvo da Educação Especial” no Brasil.

6.                                         Nesse cenário, sob os preceitos dispostos em documentos nacionais que tratam

dos direitos das pessoas com deficiência e do reconhecimento de suas diferenças, é promulgada a Lei n.° 13.409/2016, que dispõe sobre a reserva de vagas para essa população nos cursos técnicos de nível médio e superior das Instituições Federais de Ensino, passando a ser obrigatória em todo o território nacional, alterando a redação da Lei n.° 12.711/2012 e demarcando na esfera legislativa brasileira o reconhecimento dessa população, no âmbito das ações afirmativas, nesses moldes:

Em cada instituição federal de Ensino Superior, as vagas de que trata o art. Io desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas c pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (Brasil, 2016. Art. Io)[3].

7.                                         Essa nova realidade, no contexto das Instituições Públicas de Educação

Superior brasileiras, pressupõe a necessidade de mudanças em diferentes âmbitos institucionais que favoreçam a construção de culturas e práticas inclusivas capazes de sobrepujar as barreiras que impedem o ingresso, a permanência, a participação, a aprendizagem e a conclusão de seus estudos neste nível de ensino.

8.                                         Com vistas a colocar em discussão, em nível nacional, essa nova realidade e

em construir coletivamente encaminhamentos que subsidiem ações concretas que contribuam efetivamente com esse processo, foi organizado, em 2017, o II Congresso Nacional de Inclusão na Educação Superior e Educação Profissional Tecnológica, I Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Acessibilidade das 1FES e I Encontro de Pesquisadores de Educação Especial da Região Nordeste[4].


9.                                       Na ocasião, o evento contou com mais de 400 participantes (dentre discentes,

docentes, técnicos e profissionais de diversas áreas), os quais representaram 50 universidades federais (cerca de 80% do total das instituições federais do Brasil), 4 universidades estaduais e 17 institutos federais. Vale ressaltar, ainda, que as discussões e atividades previstas no evento contaram com 28 participantes que declararam algum tipo de deficiência, dentre elas: deficiência visual (cegueira - 6, baixa visão - 4); deficiência auditiva (1); surdez (12); surdocegueira (1); deficiência física (2); deficiência intelectual (2). Além disso, a programação do evento contou com a apresentação de aproximadamente 100 trabalhos acadêmico-científicos.

10.                                   Esse panorama expressa a necessidade que as instituições de Educação

Superior têm de se articularem e proporem direcionamentos concretos e coletivos para a efetiva promoção de processos inclusivos à luz das normativas políticas e jurídicas nacionais e institucionais.

11.                                   As discussões realizadas nas palestras, nas mesas redondas, na apresentação de

trabalhos, nas rodas de conversas e no I Fórum Nacional de Coordenadores de Núcleos de Acessibilidade das IFES culminaram nas seguintes recomendações que constituem o presente documento, denominado “Carta de Natal”, que deverão ser encaminhadas ao MEC e às IES.

a)       Estabelecer, no Plano de Desenvolvimento Institucional - PD1, diretrizes e estratégias, que promovam inclusão e acessibilidade aos/as estudantes, técnicos/as e docentes que apresentam deficiência, transtorno do espectro autista e/ou altas habilidades/superdotação.

b)       Incentivar o fomento e desenvolvimento de ações e/ou projetos de ensino, pesquisa e extensão na área da inclusão e acessibilidade.

c)       Criar, normatizar e fortalecer núcleos de acessibilidade, de setores e/ou de unidades institucionais que se dediquem à efetivação de políticas de inclusão e acessibilidade na Educação Superior.

d)       Desenvolver, por meio de diversas instâncias institucionais, ações que visem à superação das barreiras atitudinais, arquitetônicas, metodológicas, programáticas, comunicacionais, instrumentais, tecnológicas e pedagógicas.

e)       Ter garantida a disponibilização, pelo Ministério da Educação - MEC, de recursos humanos, materiais e financeiros necessários para a implementação de núcleos de acessibilidade, setores e/ou unidades que promovam as políticas institucionais de inclusão e acessibilidade.

f)        Destinar recursos aos referidos núcleos de acessibilidade, setores e/ou unidades, por meio do Plano de Gestão Orçamentária anual da respectiva IES.

g)       Articular parcerias entre as IES e as diversas instâncias sociais, visando estabelecer e fortalecer uma rede de interlocução colaborativa.

UjRN

h)      Prever critérios que contemplem questões inerentes à inclusão e acessibilidade no âmbito de todas as áreas de conhecimento nos editais dos concursos públicos para docentes e técnicos das Instituições de Educação Superior.

i)        Incentivar e desenvolver programas de formação continuada, para docentes e técnicos/as, sobre temáticas relacionadas à inclusão, à acessibilidade e às necessidades educacionais especificas.

j)        Ter assegurado, pelo MEC, o reconhecimento do cargo de direção, e a gratificação de coordenador dos núcleos de acessibilidade, setores e/ou unidades da Educação Superior que se dediquem às questões do acesso, da permanência e da aprendizagem do público-alvo da Educação Especial, e a oferta de cursos de formação voltados especificamente aos/as gestores/as.

k)      Envolver os gestores/as das 1ES na construção e na tomada de decisões políticas de inclusão e acessibilidade junto ao MEC.

l)        Assegurar equipe multiprofissional para a realização das bancas de verificação/validação prevista no âmbito do sistema de reserva de vagas para pessoas que se autodeclaram com deficiência.

m)    Garantir a prestação de serviços em Educação Especial por meio de medidas individualizadas e coletivas nos ambientes em que as atividades acadêmico- cientificas são desenvolvidas, favorecendo o acesso, a permanência, a participação e a aprendizagem do público-alvo da Educação Especial na Educação Superior.

n)      Garantir, de acordo com a legislação vigente, a flexibilização de tempo (para menos ou para mais) que permita a adequada realização das atividades acadêmicas e a conclusão de curso, considerando-se as especificidades de cada caso.

o)      Incluir disciplinas que abordem temáticas inerentes à inclusão e acessibilidade nos projetos pedagógicos e nas matrizes curriculares dos cursos de graduação e pós-graduação das cinco grandes áreas de conhecimento (Ciências Humanas, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Exatas e da Terra, Ciências Biológicas e Ciências da Saúde).

p)      Ter assegurado, pelo MEC, códigos de vagas que garantam a contratação de tradutores e intérpretes de Língua Brasileira de Sinais - Nível Superior (Categoria E); transcritor braille; revisor braille; audiodescritor; guia-intérprete; profissional de apoio (cuidador), de modo a assegurar o atendimento às demandas, em consonância com as políticas em vigor.

q)      Assegurar o exercício profissional inerente ao cargo concursado, prevendo-se regimentos específicos de atuação e condições de trabalho adequadas aos/as técnicos/as.


r)        Fomentar sistemáticas institucionais de monitoramento, avaliação e suportes que contribuam com o aprimoramento dos serviços prestados pelos núcleos de acessibilidade e suas respectivas equipes.

s)       Incentivar a inserção das 1ES na Rede Brasileira de Estudos e Conteúdos Adaptados - REBECA[5].

t)        Estimular a criação de coletivos de estudantes que compõem o público-alvo da Educação Especial nas IES, possibilitando seu protagonismo e participação ativa nas políticas de inclusão e acessibilidade.

u)       Formar redes nacionais representativas de estudantes e de profissionais que integrem equipes multidisciplinares envolvidas nos processos de inclusão e acessibilidade.

12.                                  Sendo assim, a CARTA DE NATAL reafirma a importância da luta pela

democratização do Ensino Superior público e de qualidade para todos/as, à luz de uma cultura inclusiva e de reconhecimento das diferenças, que busque uma sociedade mais justa e solidária.

Atenciosamente,

Ângela Maria PaivuXTuz

Reitora


2 Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (2017b, abril). Six ways to ensure higher education leaves no one bchind. Paris, íle de France: Global Education Monitoring Report. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0024/002478/247862E.pdf>. Acesso em: 30 de nov. 2017.



[1] BRASIL. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto n.° 6.949, de 25 de agosto de 2009. Brasília, 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D6949.htm>.

Acesso em: 30 nov. 2017.

[3] Brasil (2016, 28 de dezembro). Lei n.° 13.409. Altera a Lei n.° 12.711. de 29 de agosto de 2012, para dispor sobre a reserva de vagas para pessoas com deficiência nos cursos técnicos de nível médio e superior das instituições federais dc ensino. Brasília: Casa Civil da Presidência da República/Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível cm: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/L13409.htm>. Acesso em: 30 dc nov. 2017.

[4] O referido evento foi realizado em novembro de 2017, em Natal/RN, sob a coordenação geral da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em parceria com Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

[5] A Rede Brasileira de Estudos e Conteúdos Adaptados (REBECA) tem como proposta a cooperação técnica de informações e o compartilhamento dos acervos digitais em formatos acessíveis entre Instituições de Ensino Superior (IES) no atendimento às demandas das pessoas com deficiência visual.

A ideia de implementação da REBECA surge da necessidade de conhecer e socializar práticas sobre produtos e serviços e adaptação do material adaptado nos diversos centros, núcleos e laboratórios de acessibilidade presentes nas IES.

A iniciativa teve como objetivo reunir as instituições de ensino, com o propósito de discutir soluções para os serviços de atendimento às pessoas com a deficiência visual, dentre eles: formatos e padronização de documento digital adaptado.

No momento, as IES que integram a REBECA são: Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade de Brasília (UNB), Universidade Federal do Ceará (UFC) e Universidade de Campinas (UNICAMP). E também se inicia o diálogo com outras IES. o que contribuirá para ampliação da rede. A REBECA representa uma ação afirmativa de profissionais conscientes de que a formação de uma rede brasileira de cooperação de acervos adaptados contribuirá para uma sociedade igualitária no acesso à informação e conteúdos para a cidadania dos indivíduos.