Este material foi adaptado pelo laboratório de acessibilidade da universidade federal do rio grande do norte, em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998, capítulo IV, artigo 46. Permitindo o uso apenas para fins educacionais de pessoas com deficiência visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins comerciais.

 

Revisado por: Carlos Eduardo do Nascimento

 

Natal, agosto de 2018.

 

COELHO, Fábio Ulhoa. Teoria geral do direito societário. In:______. Novo manual de direito comercial: direito de empresa. 29. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 15, p. 200-234.

 

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SOCIEDADES POR AÇÕES

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1. INTRODUÇÃO

Duas são as sociedades por ações, também classificadas como institucionais: a sociedade anônima e a sociedade em comandita por ações. No seu estudo, cuido primeiro das normas relativas à sociedade anônima (também chamada de “companhia”), que são gerais para as sociedades por ações, reservando item próprio para as especificidades da sociedade em comandita por ações.

Á sociedade anônima sujeita-se às regras da Lei 6.404/76, a Lei das Sociedades por Ações (LSA). O Código Civil é aplicável apenas nas omissões desta (art. 1.089). Já a sociedade em comandita por ações é referida nos arts. 1.090 a 1.092 do CC, e se submete, em caso de omissão dessas normas, à LSA.

 

2.         CARACTERÍSTICAS GERAIS DA SOCIEDADE ANÔNIMA

 

As características gerais da sociedade anônima são quatro: a) o capital social é dividido em ações, respondendo o sócio pelo preço de emissão das que subscrever ou adquirir; b) a companhia se classifica como sociedade de capital; c) ela é sempre empresária; d) adota denominação na composição de seu nome empresarial.

Para fins didáticos, examino a primeira em separado (item 2.1) das demais (item 2.2).

 

2.1.     Responsabilidade limitada do acionista

 

O capital social deste tipo societário é fracionado em unidades representadas por ações. Os seus sócios, por isso, são chamados de acionistas, e eles respondem pelas obrigações sociais até o limite do que falta para a integralização das ações de que sejam titulares. Nas expressões usadas pelo legislador; o acionista responde pelo preço de emissão das ações que subscrever ou adquirir (LSA, art. 1.°).

Preço de emissão é um dos muitos valores que a ação de uma sociedade anônima pode ter. Se alguém indagar quanto vale uma  ação de determinada companhia, a resposta não poderá ser dada sem o prévio esclarecimento a respeito de que valor está sendo feita a pergunta. A ação de uma sociedade anônima vaie mais ou menos de acordo com os objetivos da avaliação.

 

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Uma analogia pode ajudar o entendimento da questão. Uma casa tem também diversos valores: se o objetivo é o cálculo e pagamento do imposto de propriedade, o que interessa é o valor venal da casa; se for o pagamento de imposto de transmissão, é o valor declarado na escritura; mas nenhum destes terá qualquer importância no momento da negociação desse bem, hipótese em que será levado em conta apenas o valor de mercado. Com a ação ocorre algo semelhante. Em função do objetivo perseguido, o seu valor é diferente.

Assim, a ação tem ou pode ter os seguintes valores:

a)        Valor nominal - o resultante da operação matemática de divisão do valor do capital social pelo número de ações é o valor nominal. O estatuto da sociedade pode expressar este valor ou não; no primeiro caso, ter-se-á ação com valor nominal, no segundo, ação sem valor nominal, apresentando, cada uma, algumas vantagens próprias, que serão examinadas em seguida.

b)        Valor patrimonial - o valor da participação do titular da ação no patrimônio líquido da companhia (constante de um balanço patrimonial). Resulta da operação matemática de divisão do patrimônio líquido pelo número de ações em que se divide o capital social. É o valor devido ao acionista em caso de liquidação da sociedade ou amortização da ação.

c)         Valor de negociação - é o preço que o titular da ação consegue obter vendendo-a. O valor de negociação, a ser pago pelo comprador ao vendedor da ação, é definido por uma série de fatores econômicos, como as perspectivas de rentabilidade, o patrimônio líquido da sociedade, o desempenho do setor em que ela atua, a própria conjuntura macroeconômica etc.

d)        Valor econômico - é o calculado por avaliadores de ativos, por meio de técnicas específicas (p. ex., a do “fluxo de caixa descontado”), e representa o valor que seria racional pagar por uma ação, tendo em vista as perspectivas de rentabilidade da companhia emissora.

e)        Preço de emissão - é o preço pago por quem subscreve a ação, à vista ou parceladamente. Destina-se a mensurar a contribuição que o acionista dá para o capital social (e, eventualmente, para a reserva de capital) da companhia, bem como o limite de sua responsabilidade subsidiária.

O preço de emissão, quando da constituição da sociedade, é fixado pelos fundadores. Neste momento, o único critério delimitador do preço de emissão é o valor nominal das ações, caso existente. Se a companhia tem o seu capital social representado por ações com valor nominal, o preço de emissão não poderá ser inferior a este valor. E se for superior, a diferença, chamada ágio, constituirá a reserva de capital (LSA, art. 13, § 2.°).

 

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No caso de aumento do capital social com emissão de novas ações, a companhia deve também atribuir-lhes o respectivo preço de emissão. Cabe a decisão à assembleia geral ou ao conselho de administração. A fixação do preço de emissão de ações emitidas por força de aumento do capital social deve obedecer a determinados critérios previstos em lei (art. 170, § l.°), dos quais se ressalta o seguinte: não se poderá impingir aos antigos acionistas uma diluição injustificada do valor patrimonial de suas ações. Assim, sempre que as novas ações forem subscritas por preço inferior ao valor patrimonial das existentes, este sofrerá uma redução (diluição). Tal redução poderá ser justificada ou não. Quer dizer: se a companhia efetivamente necessita dos recursos provenientes da emissão das novas ações, os acionistas antigos devem suportar a diluição do valor patrimonial de sua participação. Mas se não existe tal necessidade ou se os recursos de que carece a sociedade poderiam ser obtidos por outros meios, não se justifica a diluição. Essa regra vigora para a sociedade por ações com ou sem valor nominal. O acionista de qualquer companhia não pode sofrer injustificadamente diluição do valor patrimonial de suas ações.

Note-se que o acionista de sociedade por ações com valor nominal encontra-se mais protegido contra essa diluição, mesmo justificada, do que o acionista de sociedade por ações exclusivamente sem valor nominal. Em razão da proibição de fixação do preço de emissão de novas ações abaixo do valor nominal, terá aquele acionista uma relativa garantia contra a diluição do valor patrimonial de suas ações.

2.2.     Classificação, natureza e denominação

 

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A sociedade anônima é uma sociedade de capital. As ações representativas de parcela do capital social são livremente negociáveis. Nenhum dos acionistas pode impedir, por conseguinte, o ingresso de quem quer que seja no quadro de sócios. Por outro lado, será sempre possível a penhora da ação em execução promovida contra o acionista.

Além disso, falecendo o acionista, não poderá ser impedido o ingresso de seus sucessores na sociedade. Por se tratar de sociedade institucional, também não será possível aos sucessores do acionista morto pretender a dissolução parcial da sociedade anônima. Em regra, o herdeiro ou legatário de uma ação transforma-se, queira ou não, em acionista da sociedade anônima. A lei prevê uma única exceção, admitindo a dissolução parcial da sociedade anônima fechada (sem ações negociadas em Bolsa de Valores), quando acionistas titulares de pelo menos 5% do capital social provam que ela não está preenchendo o seu fim (CPC, art. 599, § 2.°).

A sociedade anônima é sempre empresária, qualquer que seja sua atividade econômica (CC, art. 982, parágrafo único; LSA, art. 2.°, § 1,°). Uma companhia constituída só por dentistas para a prestação de serviços de odontologia pelos próprios acionistas, embora tenha por objeto uma atividade não empresarial (CC, art. 966, parágrafo único), será empresária e estará sujeita ao regime jurídico-comercial, pela só adoção do tipo societário “anônima”.

A companhia adota denominação, obrigatoriamente. Desta constará referência ao tipo societário, pelas expressões “sociedade anônima” ou “companhia” , por extenso ou abreviadamente (S/A ou Cia.), sendo que esta última expressão somente poderá ser utilizada no início ou no meio do nome empresarial. A menção ao ramo do comércio na denominação é essencial (CC, art. 1.160).

3.         ESPÉCIES DE SOCIEDADE ANÔNIMA

 

Os títulos representativos da participação societária numa sociedade anônima são espécies de “valores mobiliários” (item 5) e denominam-se “ação”. As espécies de sociedade anônima variam segundo os ambientes de negociação da ação.

As sociedades anônimas podem ser de duas espécies: abertas ou fechadas. As companhias abertas têm as ações (e demais valores mobiliários) de sua emissão admitidas à negociação no “mercado de valores mobiliários” (MVM), enquanto as fechadas não podem ter suas ações negociadas neste mercado.

O critério é meramente formal: basta a admissão dos valores mobiliários à negociação no MVM para que a sociedade emissora seja considerada aberta. É irrelevante se os valores mobiliários são efetivamente negociados. O MVM é um ambiente de negociação que tende a conferir maior liquidez às ações neles admitidas. As ações de companhias abertas costumam ser, em suma, mais facilmente negociáveis, atraindo com isto o interesse de um conjunto maior de investidores.

Para que a companhia tenha seus valores mobiliários admitidos à negociação no MVM, ela necessita de prévia autorização do governo, dada por uma autarquia denominada Comissão de Valores Mobiliários - CVM.

O governo federal tem obrigação de acompanhar as sociedades anônimas abertas para proteção do investidor e tendo em vista o importante papel que  elas desempenham na economia em geral. Em virtude desse interesse é que a LSA prevê determinadas regras de aplicação específica às companhias abertas.

 

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O MVM (antigamente chamado de “mercado de capitais”) é composto por dois ambientes de negociação: a Bolsa de Valores e os mercados de balcão. A Bolsa de Valores é uma entidade privada (pode ser uma sociedade anônima, como é a BM&F Bovespa, ou uma associação de corretores), que exerce o serviço público de manter o pregão dos valores mobiliários; sua criação depende de autorização do Banco Central e seu funcionamento é controlado pela CVM. Mercado de balcão compreende toda operação relativa a valores mobiliários realizada fora da Bolsa de Valores, por sociedade corretora e instituição financeira ou sociedade intermediária autorizadas. A companhia aberta pode estar registrada na CVM para ter os seus valores mobiliários negociados somente no mercado de balcão ou neste e na Bolsa.

Negociam-se valores mobiliários em dois diferentes mercados: primário, referente à subscrição de valores mobiliários, negócio jurídico entre o investidor (acionista, debenturista etc) e a sociedade emissora; e o secundário, que compreende a compra e venda, negócio jurídico entre os investidores, do qual não participa a sociedade emissora. As Ofertas Públicas Iniciais (I.P.O. na sigla em inglês) é exemplo de operação do mercado primário, enquanto o pregão das ações registra negócios do mercado secundário.

A Lei 7.913/89 atribui legitimidade ativa ao Ministério Público para propor, de ofício ou a pedido da CVM, ação civil pública para evitar prejuízos ou obter ressarcimento de danos causados aos titulares de valores mobiliários e aos investidores do mercado, decorrentes principalmente de práticas irregulares.

4.         CONSTITUIÇÃO

 

O tema da constituição das companhias encontra-se fracionado em três níveis distintos: a) requisitos preliminares (arts. 80 e 81); b) modalidades de constituição (arts. 82 a 93); c) providências complementares (arts. 94 a 99). Não se trata, rigorosamente, de etapas da constituição, posto se intercruzarem as medidas disciplinadas em cada uma destas seções.

Qualquer companhia, para constituir-se, deve atender a três requisitos preliminares:

a)        Subscrição de todo o capital social por, pelo menos, duas pessoas. Todas as ações representativas do capital social devem ser subscritas como condição prévia para a constituição. A subscrição é contrato plurilateral complexo pelo qual uma pessoa se toma titular de ação emitida por sociedade anônima, negócio jurídico irretratável.

 

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b)        Realização, como entrada, de, no mínimo, 10% do preço de emissão dar ações subscritas em dinheiro. Na subscrição a prazo em dinheiro, pelo rnenos 1/10 do preço da ação deve ser integralizado como entrada. Em se tratando de instituição financeira, a porcentagem sobe para 50% (LRB, art. 27).

c)         Depósito das entradas em dinheiro no Banco do Brasil ou es tabele* cimento bancário autorizado pela CVM. Este depósito deverá ser feito pelo fundador, até 5 dias do recebimento das quantias, em nome do subscritor e em favor da companhia em constituição. Concluído o processo de constituição,*1 companhia levantará o montante depositado; se este processo não se concluir em 6 meses do depósito, o subscritor é que levantará a quantia por ele paga.

A lei prevê duas modalidades de constituição de sociedade anônima, de acordo com a existência ou não de apelo ao público investidor: a constituição por subscrição pública, em que os fundadores buscam recursos para a constituição da sociedade junto aos investidores; e a constituição por subscrição particular, em que inexiste esta preocupação por parte dos fundadores.

A caracterização de emissão pública de ações configura-se nos seguintes casos: “a) a utilização de listas ou boletins de venda ou subscrição, folhetos, prospectos ou anúncios destinados ao público; b) a procura de subscritores ou adquirentes para os títulos, por meio de empregados, agentes ou corretores; c) a negociação feita em loja, escritório ou estabelecimento aberto ao público, ou com a utilização dos serviços públicos de comunicação” (Lei 6.385/76, art. 19, § 3.°).

Sempre que o fundador de uma companhia pretender lançar mão de expedientes como os referidos, deverá observar as normas relativas à constituição por subscrição pública. Caso não pretenda lançar mão destes expedientes, deverá o fundador optar pela constituição por subscrição particular.

A constituição por subscrição pública é também denominada, doutrinariamente, de constituição sucessiva, por compreender várias etapas ou fases; e a constituição por subscrição particular, de constituição simultânea, por concentrar-se num único ato.

A constituição sucessiva tem início com o registro na CVM, cujo pedido deve estar instruído com o estudo de viabilidade econômica e financeira do empreendimento, o projeto dos estatutos e o prospecto. A CVM poderá condicionar a concessão do registro a alterações no prospecto ou no projeto de estatuto que não se revelarem satisfatórios. Se o estudo de viabilidade econômica e financeira do empreendimento, no entanto, não satisfizer aos critérios técnicos da CVM - revelando-se, segundo tais critérios, a inviabilidade ou temeridade da empresa -, não será o caso de se proceder a alterações nele, uma vez que este deve retratar uma realidade, e não dispor sobre ela, como é o caso dos outros dois instrumentos. Nesta hipótese, o único caminho a seguir é o indeferimento do registro. A CVM poderá, também, negar o registro baseada na inidoneidade dos fundadores.

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Para requerer o registro junto à CVM, o fundador da companhia deverá, necessariamente, contratar uma instituição financeira para intermediar a colocação das ações no mercado. O prospecto deverá, inclusive, conter a assinatura dela.

Concedido o registro da emissão e da sociedade, na CVM, passa-se à segunda fase da constituição sucessiva, que compreende a subscrição das ações representativas do capital social. O investimento é oferecido ao público pela instituição financeira intermediária. Quem pretender subscrever ações dessa companhia deve procurar a instituição financeira para assinar o boletim ou a lista de subscrição, que instrumentalizam o negócio jurídico. Também será possível a subscrição por carta que atenda aos requisitos fixados no prospecto. Em uma ou outra hipótese, sendo em dinheiro a integralização, o subscritor pagará a entrada.

            Quando todo o capital social estiver subscrito, os fundadores convocarão a assembleia de fundação para deliberar sobre a constituição da companhia e, se for o caso, avaliar os bens oferecidos para a integralização. Nesta assembleia, todas as ações, de qualquer espécie ou forma, conferirão ao seu titular o direito de voto. Confirmada a observância das formalidades legais e não se opondo subscritores representativos de mais da metade do capital social, será proclamada a sua constituição. Em seguida, elegem-se os primeiros administradores e fiscais. O projeto de estatuto somente poderá ser alterado, na assembleia de fundação, por deliberação unânime dos subscritores. Esta é a terceira e derradeira fase da constituição por subscrição pública.

Já a constituição por subscrição particular é significativamente mais simples. Poderá processar-se por deliberação dos subscritores reunidos em assembleia de fundação ou por escritura pública. Na primeira hipótese, todos os subscritores deverão assinar o projeto de estatuto; na segunda, todos assinarão a escritura pública, que conterá os requisitos fixados em lei (LSA,art. 88, § 2.°).

Em relação à constituição, independentemente da modalidade, previu a lei algumas regras comuns:

a) a escritura pública é dispensável para a incorporação de imóveis ao patrimônio social (LSA, art. 89);

 

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b) o subscritor poderá ser repi sentado por procurador com poderes especiais, na assembleia de fundação c na escritura pública (art. 90); c) a denominação da companhia, enquanto não concluído o seu processo de constituição, deverá ser aditada pela expressão “em organização” (art. 91); d) os fundadores e as instituições financeiras que participarem da constituição da companhia têm responsabilidade por todos os prejuízos decorrentes da inobservância de algum preceito legal e os fundadores! responderão, solidariamente, pelos danos decorrentes de culpa ou dolo em atos anteriores à constituição (art. 92 e seu parágrafo único); e) os fundadores devem entregar aos primeiros administradores eleitos os papéis, documentos e livros pertinentes à constituição da companhia ou de propriedade desta (art. 93).

Na seção referente às providências complementares, que são comuns às j duas modalidades de constituição, fixa a lei a necessidade de registro e publicação dos atos constitutivos da companhia. Somente após estas providências | é que a sociedade anônima poderá dar início à exploração de suas atividades! empresariais de forma regular.

Se houver incorporação de bem ao capital social, deverá ser providenciada] i por seus primeiros administradores a transferência da titularidade desse bem para a companhia, por meio do registro público competente (se bem imóvel] ; o Registro de Imóveis; se marca, o registro no INPI etc.). A certidão dos atos constitutivos expedida pela junta Comercial é documento hábil para instrumentalizar a transferência de propriedade ou titularidade.  

 

5.         VALORES MOBILIÁRIOS

 

Valores mobiliários podem ser definidos, inicialmente, como “títulos de investimento” que a sociedade anônima emite para obtenção dos recursos de que necessita. Além da ação, valor mobiliário representativo de unidade do capital social, que será objeto de estudo no próximo item, a companhia poderá emitir os seguintes principais valores mobiliários:

 a) debêntures (LSA, arts. 52 a 74);

 b) partes beneficiárias (arts. 46 a 51);

 c) bônus de subscrição (arts. 75 a 79);

 d) nota promissória (Inst. CVM 566/2015).

As debêntures são definidas, pela doutrina, como títulos representativos de um contrato de mútuo, em que a companhia é a mutuária e o debenturista o mutuante. Os titulares de debêntures têm direito de crédito, perante a companhia, nas condições fixadas por um instrumento elaborado por esta, a “escritura de emissão”. Nela, estabelece-se se o crédito do debenturista será monetariamente corrigido ou não, definem-se as garantias desfrutadas por eles, as épocas de vencimento da obrigação e demais requisitos determinados por lei (LSA, art. 59).

 

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A comunidade de interesses dos debenturistas pode ser representada por um agente fiduciário, nomeado pela escritura de emissão. Sempre que as debêntures forem distribuídas, ou admitidas no MVM, a nomeação de agente fiduciário é obrigatória. Se a negociação das debêntures não se fizer no MVM, será facultativa a sua existência. Pode exercer a função de agente fiduciário dos debenturistas a pessoa natural que preencher os requisitos que a lei fixa para os administradores e a instituição financeira especialmente autorizada pelo Banco Central do Brasil, observados certos impedimentos (LSA, art. 66, § 3.°).

As debêntures, de acordo com a garantia oferecida aos seus titulares, podem ser de quatro espécies: a) com garantia real, em que um bem, pertencente ou não à companhia, é onerado (hipoteca de um imóvel, por exemplo); b) com garantia flutuante, que confere aos debenturistas privilégio geral sobre o ativo da companhia, pelo qual terão preferência sobre os credores quirografários em caso de falência da companhia emissora; c) quirografária, cujo titular concorre com os demais credores sem garantia integrantes da massa falida; d) subordinada (ou subquirografária), em que o titular tem preferência apenas sobre os acionistas, em caso de falência da sociedade emissora.

As debêntures podem ter a cláusula de conversibilidade em ações e podem ser nominativas ou escriturais.

As partes beneficiárias (PB) são definidas como títulos negociáveis, sem valor nominal e estranhos ao capital social, que conferem aos seus titulares direito de crédito eventual, consistente na participação nos lucros da companhia emissora (LSA, art. 46 e seu § l.°). Somente a companhia fechada pode emitir estes valores mobiliários. Dos lucros da sociedade anônima não poderá ser destinado às partes beneficiárias mais que 10%.

As PB poderão ser alienadas ou atribuídas. A atribuição, por sua vez, poderá ser onerosa (em pagamento a prestação de serviços) ou gratuita (sem contrapartida em favor da emissora).

As PB terão a duração estabelecida pelos estatutos. No caso de atribuição gratuita, o prazo está limitado a 10 anos, salvo se a PB tiver sido emitida em favor de associação ou fundação beneficente de empregados da companhia.

Estes valores mobiliários podem conter também a cláusula de conversibilidade em ações, devendo, neste caso, ser constituída uma reserva especial para capitalização.

 

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A alteração dos estatutos que importe em modificação ou redução das vantagens conferidas aos titulares das PB somente terá eficácia após sua aprovação no mínimo pela metade deles, reunidos em assembleia.

Os bônus de subscrição (BS) conferem aos seus titulares o direito de subscreverem ações da companhia emissora, se houver futuro aumento de capital social. O titular de um bônus não estará dispensado do pagamento do respectivo preço de emissão. São valores mobiliários emitidos pela sociedade anônima para alienação onerosa ou atribuição gratuita como vantagem adicional aos subscritores de suas ações ou debêntures.

Por fim, a CVM disciplinou, em 1990, a emissão de notas promissórias destinadas à distribuição pública. Trata-se de valor mobiliário destinado à captação de recursos para restituição a curto prazo (até 360 dias, em regra). Conhecido por Commercial Paper, este valor mobiliário somente poderá ser negociado mediante endosso em preto com a cláusula sem garantia.

6.         AÇÕES

 

As ações são valores mobiliários representativos de unidade do capital social de sociedade anônima, que conferem aos seus titulares um complexo de direitos, deveres e obrigações.

Classificam-se as ações segundo três critérios distintos: espécie, classe e forma.

Segundo a espécie, as ações são:

a)        Ordinárias - aquelas que conferem aos seus titulares os direitos que a lei reserva ao acionista comum. São ações de emissão obrigatória. Não há sociedade anônima sem ações desta espécie. O estatuto não precisará disciplinar esta espécie de ação, uma vez que dela decorrem, apenas, os direitos normalmente concedidos ao sócio da sociedade anônima.

b)        Preferenciais - ações que conferem aos seus titulares um complexo de direitos diferenciado, como, por exemplo, a prioridade na distribuição de dividendos ou no reembolso do capital, com ou sem prêmio etc. As ações preferenciais podem ou não conferir o direito de voto aos seus acionistas. Para serem negociadas no MVM, os direitos diferenciados das preferenciais devem ser pelo menos um de três definidos na LSA (art. 17, § 1 °).

O máximo de ações preferenciais sem direito a voto, ou com restrições a esse direito, tolerado por lei, é de 50% das ações emitidas (art. 15, § 2.°).

c)         De fruição - são aquelas atribuídas aos acionistas cujas ações foram totalmente amortizadas. O seu titular estará sujeito às mesmas restrições ou desfrutará das mesmas vantagens da ação ordinária ou preferencial amortizada, salvo se os estatutos ou a assembleia geral que autorizar a amortização dispuserem em outro sentido.

 

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Em relação às classes, as ações podem ser nelas distribuídas pelos estatutos, segundo os direitos, deveres ou obrigações que conferem aos acionistas. Cada classe será identificada por uma letra na sequência do alfabeto (A, B, C..).

As ações preferenciais se dividem em classes de acordo com o complexo de direitos ou restrições que, nos termos dos estatutos, forem conferidos aos seus titulares. As ações ordinárias, em tese, não deveriam ser divisíveis em classes, na medida em que se conceituam justamente por conferirem um mesmo conjunto de direitos aos seus titulares. No entanto, a lei possibilita aos estatutos da companhia fechada a previsão de classes de ações ordinárias, em função de sua conversibilidade em ações preferenciais, exigência de nacionalidade brasileira do acionista ou direito de eleger, em separado, membros dos órgãos de administração (art. 16). As ações ordinárias das companhias abertas não poderão ser divididas em classes (art. 15, § l.°).

Quanto à forma, as ações são nominativas ou escriturais.

O critério de diferenciação entre uma forma ou outra leva em conta o negócio jurídico que opera a transferência de titularidade da ação; ou seja, a maneira pela qual ela é transmissível. As ações nominativas circulam mediante registro no livro próprio da sociedade emissora, denominado “Livro de Transferência de Ações Nominativas”. Já as ações escriturais são mantidas, por autorização ou determinação dos estatutos, em contas de depósito em nome de seu titular. Essas ações são desprovidas de certificado e sua circulação se opera por lançamento da operação nos registros próprios da instituição financeira depositária, a débito da conta de depósito do alienante e a crédito da conta de depósito do adquirente.

Além da classificação, convém assentar mais três observações sobre as ações: a) limitação à circulação;

b) certificado de ações;

c) custódia de ações fungíveis.

Em princípio, por ser representativa de participação em sociedade de capital, a ação é livremente negociável. Contudo, os estatutos da companhia fechada podem estabelecer limites à livre circulação das ações, desde que não impeçam a sua negociação nem sujeitem o acionista ao arbítrio dos órgãos de administração ou à maioria dos acionistas (LSA, art. 36). O exemplo mais corrente de aproveitamento dessa faculdade legal enco ntra-se na previsão do direito de preferência para a compra de ações, reconhecido aos demais acionistas da companhia.

 

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Nesse caso, aquele que pretender alienar suas ações estará obrigado a oferecê-las, inicialmente, aos demais integrantes do quadro de acionistas. A circulação das ações da companhia aberta, reforço, não poderá sofrer qualquer restrição por parte dos estatutos.

As ações nominativas são documentadas em um certificado, em regra de emissão da companhia, cujos requisitos se encontram fixados em lei (art. 24). Poderá, no entanto, a companhia contratar os serviços de escrituração e guarda dos livros de registro e transferência de ações, bem como os de expedição de certificados, de uma instituição financeira autorizada pela CVM, chamada pela lei de agente emissor de certificados. Nesta hipótese, caberá exclusivamente ao agente a prática dos atos relativos aos registros e emissão de certificados.

A lei possibilita, também, às instituições financeiras autorizadas para este fim, pela CVM, prestarem serviços de custódia de ações fungíveis, recebendo em depósito, como valores fungíveis, as ações de cada espécie, classe e companhia. Neste caso, a instituição financeira representará, perante a companhia, os titulares das ações depositadas em custódia, para recebimento de dividendos e ações bonificadas, bem como exercício de direito de preferência na subscrição de novas ações.

7.         CAPITAL SOCIAL

 

O capital social de uma sociedade anônima, como ocorre em relação às demais sociedades empresárias, pode ser integralizado pelo acionista em dinheiro (hipótese mais comum), bens ou créditos,

Para a integralização do capital social em bens é necessário realizar-se a avaliação desses bens, feita com observância de determinadas regras (LSA, art. 8.°). Assim, devem ser contratados três peritos, ou uma empresa especializada, para a elaboração de um laudo fundamentado com indicação dos critérios e dos elementos de comparação utilizados e instruído pelos documentos relativos ao bem. Este laudo será objeto de votação por assembleia geral da companhia. Se o valor obtido pelo laudo pericial for aprovado pelo órgão social e aceito pelo subscritor, perfaz-se a integralização do capital social pelo bem avaliado. Qualquer bem, corpóreo ou incorpóreo (registro de marca, patente etc.), móvel ou imóvel, pode ser usado para a integralização do capital social da companhia. O bem transfere-se a título de propriedade, salvo estipulação diversa (usufruto, por exemplo), e a responsabilidade do subscritor equipara-se à do vendedor.

No tocante à integralização por créditos de que seja titular o subscritor, há de se observar a responsabilidade deste pela existência do crédito e pela solvência do devedor.

 

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Mesmo em se tratando de cessão civil (em que, em regra, o cedente não responde pela solvência do devedor - a rt. 296do CC), será sempre possível demandar o subscritor quando o devedor não honrar o título junto à companhia cessionária (LSA, art. 10, parágrafo único). A mesma responsabilidade tem o subscritor na hipótese de endosso “sem garantia”, sendo ineficaz perante a companhia a cláusula exoneratória de responsabilidade do acionista endossante. Além disso, o certificado de ação integralizada por transferência de crédito somente poderá ser expedido após a sua realização (LSA, art. 23, § 2.°).

O capital social pode ser aumentado. O aumento do capital social, no entanto, nem sempre decorre de ingresso de novos recursos na companhia. São hipóteses de aumento do capital social:

a)        Emissão de novas ações - em que há ingresso de novos recursos no patrimônio social. O aumento é deliberado em assembleia geral extraordinária (LSA, art. 166, IV) e tem por pressuposto a realização de, pelo menos, 3/4 do capital social então existente (art. 170). Mas pode também ser feito por deliberação da assembleia geral ou do conselho de administração, nos limites do capital autorizado (LSA, art. 166, II).

b)        Valores mobiliários - a conversão de debêntures ou partes beneficiárias conversíveis em ações, bem como o exercício dos direitos conferidos por bônus de subscrição ou opção de compra, importam em aumento de capital social, com emissão de novas ações (LSA, art. 166, III).

c)         Capitalização de lucros e reservas - a assembleia geral ordinária pode destinar uma parcela do lucro líquido ou de reservas para reforço do capital social, emitindo-se, ou não, novas ações (LSA, art. 169), mas sempre sem o ingresso de novos recursos.

O estatuto da companhia pode autorizar o aumento do capital social, dentro de certo limite, sem necessidade de sua alteração. A medida visa a agilizar o processo de decisão e emissão de novas ações. Este limite é chamado de capital “autorizado”. O estatuto deverá, quando fixar o capital autorizado, definir se o órgão competente para decidir a emissão das novas ações será a assembleia geral ou o conselho de administração (LSA, art. 168).

O capital social da companhia pode, também, ser reduzido. Duas são as causas que a lei considera para permitir a redução: excesso do capital social, quando se constata o seu superdimensionamento; e irrealidade do capital social, quando houver prejuízo patrimonial (LSA, art. 173). Quando ocorre redução do capital social com restituição aos acionistas de parte do valor das ações (ou diminuição do valor destas, se não integralizadas, à importância das entradas já feitas), a lei busca proteger os interesses dos credores da companhia, sujeitando a eficácia da deliberação da assembleia geral ao transcurso do prazo de 60 dias após a publicação de sua correspondente ata.

 

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Durante este lapso temporal, os credores quirografários existentes à data da publicação terão direito de manifestar oposição à redução deliberada, hipótese em que o arquivamento da ata da assembleia geral fica condicionado ao pagamento ou ao depósito judicial do crédito do oponente. Ademais, nesta mesma hipótese, a aprovação da maioria de seus debenturistas, reunidos em assembleia especial, será necessária para a validade da pretendida redução (LSA, art. 174).

8. ÓRGÃOS SOCIAIS

 

Quatro são os principais órgãos da companhia: a assembleia geral, o conselho de administração, a diretoria e o conselho fiscal. Além destes, o estatuto poderá prever livremente a existência de órgãos técnicos de assessoramento ou de execução.

8.1. Assembleia geral

A assembleia geral é o órgão máximo da sociedade anônima, de caráter exclusivamente deliberativo, que reúne todos os acionistas com ou sem direito a voto. A assembleia geral pode ser ordinária (AGO) ou extraordinária (AGE).

Todos os acionistas, mesmo os que não têm direito a voto, podem participar da assembleia geral. Como se sabe, os acionistas titulares de ações preferenciais nominativas podem ter o direito de voto limitado ou suprimido pelo estatuto. Eles poderão exercer o direito a voto somente em casos excepcionalmente previstos, como a deliberação da constituição, eleição em separado de membros do conselho de administração ou fiscal, não pagamento de dividendos fixos ou mínimos etc. Salvo, pois, tais casos, os titulares das ações destas categorias terão apenas direito de voz na discussão das matérias em pauta (LSA, art. 125, parágrafo único).

A lei exige a realização de uma assembleia geral nos quatro meses imediatamente seguintes ao término do exercício social, para fins de apreciação de um conjunto de matérias específicas. Esta é a assembleia geral ordinária (AGO) que se realiza anualmente. Sua competência está restrita aos temas elencados no art. 132 da LSA, a saber: a) tomar as contas dos administradores, examinar, discutir e votar as demonstrações financeiras; b) deliberar sobre a destinação do lucro líquido e a distribuição de dividendos; c) eleger os administradores e fiscais, se for o caso. Qualquer outro tema não poderá ser objeto de deliberação da assembleia geral ordinária, fazendo-se indispensável a convocação de uma AGE.

 

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Fixa a lei um quorum para validade das deliberações da assembleia. Primeiro, cogita-se de um quorum de instalação, ou seja, que define a presença mínima de acionistas para validade dos trabalhos. O quorum de instalação é de 1/4 do capital social votante, em primeira convocação (LSA, art. 125). Em constando, porém, da pauta a apreciação de proposta de reforma dos estatutos, o quorum de instalação em primeira convocação passa a ser de acionistas representantes de 2/3, no mínimo, do capital social votante (art. 135). Independentemente da pauta, a AGO ou AGE se instala, em segunda convocação, com a presença de qualquer número de acionistas.

O quorum de deliberação diz respeito à aprovação ou rejeição de cada matéria discutida e votada em assembleia. Para a aprovação, é necessária, em regra, a convergência dos votos de mais da metade do total de ações com direito a voto presentes à assembleia, descontados os proferidos em branco. É este o sentido do conceito de maioria absoluta constante do art. 129 da LSA. Existem, entretanto, hipóteses em que a lei fixa um quorum mais elevado para a deliberação. Trata-se do quorum qualificado do art. 136, que impõe, para a aprovação das matérias nele elencadas, a concordância de acionistas que representem metade, no mínimo, do capital social votante. Para a deliberação de assunto listado pelo legislador neste dispositivo, é necessária a aprovação de acionistas titulares de, no mínimo, 50% das ações com direito a voto.

Note-se bem que o percentual do quorum qualificado de deliberação é necessário para a aprovação, mas nem sempre será suficiente', no caso de a proposta contar com a aprovação de metade dos acionistas com direito a voto e com a reprovação da outra metade, ocorrerá empate. O desempate será alcançado aplicando-se o art. 129, § 2.°, da LSA.

O quorum de deliberação, simples ou qualificado, poderá ser aumentado pelos estatutos da companhia fechada, mas não pode ser alterado no caso de sociedade anônima aberta.

8.2.     Conselho de administração

 

O conselho de administração é órgão, em regra, facultativo. Trata-se de colegiado de caráter deliberativo, ao qual a lei atribui parcela da competência da assembleia geral, com vistas a agilizar a tomada de decisões de interesse da companhia. Este órgão só é obrigatório nas sociedades anônimas abertas, nas de capital autorizado e nas de economia mista (LSA, arts. 138, § 2.°, e 239).

 

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Cabe ao estatuto fixar, observado o mínimo legal de três, o número de conselheiros, podendo optar pela fixação de mínimo ou máximo permitidos. Deve, também, fixar o prazo de duração do mandato de seus integrantes, nunca superior a 3 anos; e estabelecer normas regimentais do órgão, notadamente no que se refere à escolha e substituição de seu presidente, substituição de seus membros, convocação, instalação, funcionamento e deliberação. O conselho delibera por maioria de votos, se o estatuto não prevê quorum qualificado para uma ou mais matérias (art. 140) e somente pessoa natural é elegível para o cargo de conselheiro (art. 146).

Quem elege e pode, a qualquer tempo, destituir os membros do conselho de administração é a assembleia geral.

8.3.     Diretoria

 

A diretoria é órgão de representação legal da companhia e de execução das deliberações da assembleia geral e do conselho de administração. O estatuto deverá prever, em relação à diretoria: a) número de membros, nunca inferior a dois, ou o mínimo e máximo permitidos; b) duração do mandato, não superior a 3 anos; c) modo de substituição dos diretores; d) atribuições e poderes de cada diretor (art. 143).

Os diretores precisam ser, necessariamente, pessoas naturais. Se houver conselho de administração, os diretores são eleitos por este órgão; não havendo, pela assembleia geral. São, a qualquer tempo, destituíveis pelo órgão competente para a eleição. Até 1/3 dos membros do conselho de administração poderá integrar, também, a diretoria.

A representação legal cabe àquele diretor ao qual for atribuída esta competência específica pelo estatuto, ou, omisso este, por deliberação do conselho de administração. Se inexistir previsão estatutária nem deliberação do conselho, a representação legal competirá a qualquer dos diretores da companhia (LSA, art. 144).

Tanto os integrantes do conselho de administração quanto os da diretoria são, sempre, reelegíveis (LSA, arts, 140,111, e 143, III).

8.4.     Conselho fiscal                              

O conselho fiscal é órgão de existência obrigatória, mas de funcionamento facultativo, composto de no mínimo três, e, no máximo, cinco membros, acionistas ou não.

 

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Quando se tratar de órgão que, pelo estatuto, tem funcionamento facultativo, este deverá ocorrer por deliberação da assembleia geral, por proposta de acionista que represente, na sociedade fechada, 10% das ações com direito a voto ou 5% das ações sem direito a voto (art. 161, § 2.°) ; nas abertas, os percentuais são menores, fixados pela CVM em função do capital social.

Os mesmos requisitos, impedimentos e deveres que a lei estabelece para os administradores são extensíveis aos membros do conselho fiscal. Além disso, não pode ser eleito fiscal o membro de órgão de administração, empregado da companhia ou de sociedade por ela controlada, ou do mesmo grupo, bem como o cônjuge ou parente até terceiro grau de administrador da companhia (LSA, art. 162 e § 2.°).

Os titulares de ações preferenciais sem direito a voto, ou com restrições desse direito, poderão eleger, em separado, um membro do conselho fiscal. Igual direito têm os acionistas minoritários que representem 10% ou mais do capital votante. Assim, se o conselho fiscal tinha três membros, o órgão passa a ter cinco se ambos os grupos minoritários exercerem os seus direitos de eleição de fiscal em separado, em virtude do disposto no art. 161, § 4.°, da LSA.

O conselho fiscal é órgão destinado à fiscalização dos órgãos de administração, atribuição que exerce para a proteção dos interesses da companhia e de todos os acionistas. Sua competência vem detalhada no art. 163 da LSA.

9.         ADMINISTRAÇÃO DA SOCIEDADE

 

Sob a rubrica de “administradores”, a lei reúne tanto o membro do conselho de administração quanto o da diretoria (LSA, arts. 145 a 160).

São os seguintes os deveres impostos por lei aos administradores

a)        Dever de diligência - pelo qual o administrador deve empregar, no desempenho de suas atribuições, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo, costumeiramente, emprega na administração de seus próprios negócios (LSA, art. 153). Para melhor nortear o cumprimento deste dever, determina a lei que o administrador exerça suas atribuições com vistas à realização dos fins e interesses da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa (art. 154, caput).

b)        Dever de lealdade - o administrador não pode usar, em proveito próprio ou de terceiro, informação pertinente aos planos ou interesses da companhia e à qual teve acesso em razão do cargo que ocupa, agindo sempre com lealdade para com aquela (LSA, art. 155). Deve, pois, abster-se de intervir em qualquer operação social em que tiver interesse conflitante com o da sociedade anônima, bem como na deliberação que a respeito tomar o órgão no qual tenha assento (art. 15 6).

 

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O descumprimento do dever de lealdade pode caracterizar, em alguns casos, crime de concorrência desleal (LPI, art. 195, XI e § l.°).

c)         Dever de informar - o administrador de companhia aberta tem o dever de informar, imediatamente, à Bolsa de Valores e divulgar pela imprensa qualquer deliberação dos órgãos sociais ou fato relevante que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários de emissão da companhia (LSA, art. 157, § 4.°). Outro aspecto do dever de informar diz respeito aos interesses que o administrador de companhia aberta possua nos negócios sociais, os quais têm os acionistas o direito de conhecer (LSA, art. 157e § l.°).

O administrador não é responsável pelas obrigações assumidas pela companhia por ato regular de gestão, mas responderá por ato ilícito seu, pelos prejuízos que causar, com culpa ou dolo, ainda que dentro de suas atribuições ou poderes, ou com violação da lei ou do estatuto (LSA, art. 158). A companhia pode promover a responsabilização judicial de seu administrador, por prejuízo que este lhe tenha causado, necessariamente mediante prévia deliberação da assembleia geral. A deliberação poderá ser tomada em assembleia ordinária, ou, se constar da ordem do dia, ou tiver relação direta com matéria em apreciação, pela assembleia extraordinária. Em qualquer caso, o administrador será destituído do cargo de administração e substituído, nos termos estatutários.

Se os órgãos de administração retardarem a propositura da competente ação por mais de 3 meses, qualquer acionista poderá fazê-lo em nome da companhia. É hipótese de substituição processual derivada (LSA, art. 159, § 3.°). Se, porém, a assembleia geral decidiu não promover a responsabilização do administrador, os acionistas que possuam ações representativas de 5% ou mais do capital social poderão, em nome da companhia, promover a ação judicial. É hipótese de substituição processual originária (art. 159, § 4.°).

A ação para responsabilização dos administradores prescreve em 3 anos, contados da data da publicação da ata da assembleia geral que votar o balanço referente ao exercício em que o ilícito ocorreu. O mesmo prazo conta-se, no entanto, da prescrição da ação penal ou da sentença penal definitiva, caso o fato ensejador da ação de responsabilidade civil deva ser objeto de apuração na esfera criminal (LSA, arts. 287, II, b, 2 e 288).

Além da responsabilidade civil e penal, têm os administradores responsabilidade de caráter administrativo perante a CVM. Esta autarquia pode impor-lhes, por infração a dever prescrito na legislação do anonimato, sanções que variam de multa ou advertência até suspensão do exercício do cargo ou inabilitação (Lei 6.835/76, art. 11).

 

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Até aqui, estudamos os deveres e responsabilidades dos administradores em relação à própria sociedade anônima que administram. Eles, no entanto, também podem ser responsabilizados por danos que causam a terceiros, no exercício da função. Os consumidores, por exemplo, têm ação contra os administradores que conduziram a companhia fornecedora à falência ou inatividade, em decorrência de má administração (CDC, art. 28). Os administradores de operadoras de planos de assistência à saúde respondem subsidiariamente pelos direitos contratuais e legais de consumidores, prestadores de serviço e fornecedores, bem como pelas obrigações fiscais e trabalhistas da sociedade (Lei 9.656/98, art. 35-J).

10.      O ACIONISTA

O dever principal do acionista é o de pagar o preço de emissão das ações que subscrever (LSA, art. 106). O vencimento das prestações será o definido pelo estatuto ou pelo boletim de subscrição. Se omissos tais instrumentos, os órgãos da administração procederão à chamada dos subscritores, por avisos publicados na imprensa, por três vezes pelo menos, estabelecendo prazo não inferior a 30 dias para o pagamento. O acionista que deixar de pagar a prestação devida, no prazo assim fixado, estará constituído em mora independentemente de qualquer interpelação. Nesta situação, deverá pagar o principal de seu débito acrescido de juros, correção monetária e multa estatutária de, no máximo, 10% Estas três parcelas são devidas apenas se existir previsão estatutária.

A companhia poderá promover, contra o acionista em mora (chamado pela lei de “remisso”), a cobrança judicial do devido, por ação de execução servindo o boletim de subscrição, acompanhado, se for o caso, da chamada como título executivo extrajudicial. Poderá, também, optar pela venda das ações subscritas pelo acionista remisso em Bolsa. Esta regra, porque a venda referida se faz mediante leilão especial, também se aplica às companhias fechadas. Do produto arrecadado nessa venda serão descontadas as despesas com a operação e os juros, correção monetária e multa previstos em estatuto, ficando o saldo à disposição do ex-acionista. A lei faculta à companhia promover a venda em Bolsa mesmo após o ajuizamento da execução judicial, assim como promove esta em caso de se revelar frustrada a venda em leilão especial da Bolsa. Baldadas no entanto, ambas as providências, a companhia pode declarar a caducidade da ações, apropriando-se das entradas porventura já realizadas. Se, então, possui fundos ou reservas (exceto a legal) disponíveis, poderá integralizar a ação, para vendê-la, se e quando desejar.

 

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 Se não possuir fundos ou reservas suficientes para a integralização, terá a companhia o prazo de 1 ano para conseguir um comprador para as ações em questão, findo o qual, o capital social deverá ser reduzido, por decisão da assembleia geral, em importância correspondente.

O art. 109 da LSA elenca os direitos essenciais do acionista, a saber:

a)        Participação nos resultados sociais - o acionista tem direito de receber o dividendo, que é a parcela dos lucros sociais que lhe cabe, bem como participar do acervo da companhia, em caso de liquidação (art. 109,1 e II). Este direito não pode ser exercido se a sociedade anônima é devedora do INSS, já que a lei proíbe a distribuição de lucros nas sociedades com débito previdenciário (Lei 8.212/91, art. 52).

b)        Fiscalização da gestão dos negócios sociais - a legislação do anonimato prevê formas de fiscalização direta e indireta dos negócios sociais. Do primeiro caso é exemplo a exibição dos livros sociais aos acionistas que representem 5% ou mais do capital social, nos casos de violação da lei ou do estatuto ou fundada suspeita de grave irregularidade (art. 105); do segundo, é exemplo o conselho fiscal.

c)         Direito de preferência - os acionistas têm direito de preferência na subscrição de ações e de valor mobiliário conversível em ação, segundo os critérios do art. 171, § l.°, da LSA. Trata-se de um direito cedível.

d)        Direito de retirada- o acionista dissidente de determinadas deliberações da assembleia geral (arts. 136,1 a VI, e IX, 136-A, 221,230 e 252) ou de companhia cujo controle foi desapropriado (art. 236, parágrafo único) tem o direito de se retirar da sociedade, recebendo o reembolso de suas ações (art. 45). A base para o cálculo do reembolso é o valor patrimonial das ações do acionista dissidente. Assim, o acionista que se retira terá direito de receber da sociedade, por ação que titulariza, a importância equivalente à divisão do patrimônio líquido da companhia pelo número de ações. Em princípio, o patrimônio líquido da sociedade é o constante do último balanço aprovado. Pode-se verificar, no entanto, a defasagem desse valor, caso em que inevitavelmente ocorreria uma injustiça (em desfavor do dissidente, se o valor histórico é inferior ao atual, ou em desfavor da sociedade, se é superior). Para evitar a injustiça contra o acionista dissidente, a lei admite que ele peça o levantamento de um balanço especial (LSA, art. 45, § 2.°); para evitar a injustiça contra a sociedade, ela faculta aos estatutos a previsão de pagamento, a título de reembolso, do valor econômico das ações (LSA, art. 45, §§ 3.° e 4.°).

 

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O direito de voto, conforme já assinalado, não é direito essencial, posto existirem ações que não o conferem a seus titulares. A lei disciplina o exercício do direito de voto, e coíbe o voto abusivo e o conflitante. Voto abusivo é aquele em que o acionista tem em vista causar dano à companhia ou a outro acionista, ou obter, para si ou para outrem, vantagem indevida e da qual resulte ou possa resultar prejuízo para a sociedade ou outro acionista. O acionista responde, civilmente, pelos danos que causar com o voto abusivo. Já o voto conflitante, cuja caracterização dispensa qualquer elemento subjetivo, vem elencado em lei. O acionista não pode votar nas deliberações sobre o laudo de avaliação de bens com os quais pretende integralizar suas ações, nem na aprovação das suas contas como administrador, nem nas questões que possam beneficiá-lo de modo particular ou nas que tiver interesse conflitante com o da companhia (LSA, art. 115, § l.°). A decisão tomada em função de voto conflitante é anulável, sem prejuízo da responsabilidade civil do acionista por eventuais danos decorrentes.

11.      ACORDO DE ACIONISTAS

 

Os acionistas podem, livremente, compor seus interesses por acordo que celebrem entre si. Terão, em decorrência, a proteção que a lei dispensa aos contratos em geral. Caso, entretanto, tais acordos versem sobre três temas determinados, a seguir referidos, e estejam arquivados na sede da companhia, tais acordos estarão sujeitos a uma proteção especificamente liberada pela LSA.

Assim, se o acordo tem por objeto o exercício do poder de controle ou do direito de voto, a compra e venda de ações ou a preferência de sua aquisição, o seu arquivamento junto à companhia impede que ela pratique atos que contrariem o conteúdo do acordo. Se um acionista concordou em conceder direito de preferência a outro, mas vendeu suas ações a terceiro, descumprindo o acordo arquivado na companhia, esta não poderá registrar a transferência de titularidade das ações. Não há, no entanto, como a própria sociedade tomar efetivo o direito de preferência, por parte do acionista prejudicado. Este deve se socorrer do Poder Judiciário que, substituindo a vontade do acionista alienante, concederá a preferência ao demandante.

No tocante ao acordo de acionista que tenha por objeto o exercício do direito de voto, não pode ocorrer a venda deste, fato tipificado como crime. O acordo de acionista, assim, só pode versar sobre o exercício do “voto-vontade^ (eleição de administradores, aumento de capital social etc). O “voto-verdade (votação das contas dos administradores ou do laudo de avaliação de bens para integralização do capital social) não pode ser objeto de acordo de acionistas, porque importaria em venda de voto.

 

 

 

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12.      PODER DE CONTROLE

 

O acionista (ou grupo de acionistas vinculados por acordo de voto) titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria de votos na assembleia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores e usa, efetivamente, desse poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos da companhia é considerado o “acionista controlador” (LSA, art. 116). Para a sua configuração, é necessária a convergência destes dois elementos: ser maioria societária (não no sentido de necessariamente titularizar a maior parte do capital social, mas no de possuir ações que lhe garantam a maioria nas decisões tomadas pelas 3 últimas assembleias) e fazer uso dos direitos decorrentes desta situação para dirigir a sociedade.

O acionista controlador responde pelos danos que causar por abuso de poder, exemplificando a lei o exercício abusivo do poder de controle no art. 117. Dentre as hipóteses ali encontradas, destacam-se o desvio de finalidade da companhia, a liquidação de sociedade próspera, a eleição de administrador ou fiscal sabidamente inapto, moral ou tecnicamente etc. Se de qualquer destes atos, ou outros que configurem abuso de poder, decorrer dano à companhia, seus acionistas e empregados, ou à comunidade em que atua, o controlador responderá pela respectiva indenização.

Para responsabilizar o controlador pelos danos advindos do exercício abusivo do poder de controle, não é necessário provar a sua intenção. Entende a doutrina que exigir tal prova (diabólica) poderia significar o esvaziamento do direito à indenização reconhecido pelo legislador, dada a extrema dificuldade de sua produção.

Cabe mencionar, ainda, outras hipóteses em que a lei imputa responsabilidade ao controlador da sociedade anônima. Por exemplo, ele pode ser responsabilizado, em caso de dolo ou culpa, se a sociedade anônima é instituição financeira, na hipótese de decretação, pelo Banco Central, do regime de administração especial temporária (Decreto-lei 2.321/85, art. 15), liquidação extrajudicial ou intervenção (Lei 9.447/97). Igual responsabilidade tem o controlador de seguradora, entidade de previdência privada aberta e companhia de capitalização (Lei 10.190/2001).

As ações que dão sustentação ao poder de controle costumam ser negociadas por valor substancialmente maior que o das demais, inclusive ordinárias emitidas pela mesma sociedade. A diferença é chamada, no mercado, de “prêmio de controle”.

 

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Quando alguém adquire ações que lhe possibilitam passar a controlar a sociedade anônima, não está apenas acrescendo ao seu patrimônio o direito de participar dos seus dividendos e resultados, mas também vários outros, como o de eleger os administradores, definir a estratégia geral da empresa, reestruturar a sociedade, aumentar o capital social, estabelecer a destinação não vinculada dos resultados etc. É racional e justo que, em razão disso, pague mais pelas ações de sustentação do controle.

Algumas vezes, porém, no “prêmio de controle” está embutida retribuição a valor agregado à companhia não pelo controlador, mas por minoritários. Se a sociedade havia captado recursos no mercado de capitais, com a emissão de ações preferenciais não votantes, pouco antes da alienação do controle, o caixa elevado da companhia decorrente desta operação certamente será considerado na negociação do preço das ações do controlador. A liquidez da companhia, no entanto, é valor agregado pelos que subscreveram as preferenciais, e não pelo controlador. Está ocorrendo apropriação, via “prêmio de controle”, de valor que o controlador não agregou ao negócio.

Para evitar esta distorção, os acionistas minoritários devem condicionar o ingresso na sociedade à cláusula de saída conjunta, no estatuto ou em acordo de acionistas (em inglês, tagalong). Quando prevista esta cláusula, o controlador não pode vender suas ações isoladamente. Quer dizer, só poderá vendê-las a quem se comprometa a adquirir também as dos beneficiados pela cláusula. Viabiliza-se, deste modo, a distribuição do “prêmio de controle” entre os acionistas com direito de saída conjunta.

Nas companhias abertas, a cláusula de saída conjunta está prevista na lei em favor dos acionistas com direito a voto. Nelas, a alienação das ações que dão sustentação ao poder de controle só pode ser feita mediante condição (suspensiva ou resolutiva) de o adquirente adquirir, por oferta pública, as demais ações com direito a voto daquela sociedade, pagando no mínimo 80% do preço pago pelas do controlador (LSA, art. 254-A). Os preferencíalistas sem direito a voto só têm direito de saída conjunta se previsto como vantagem estatutária.

13.      DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS

 

A LSA estabelece o dever de a companhia levantar, ao término do exercício social, um conjunto de demonstrações contábeis, com vistas a possibilitar o conhecimento, pelos acionistas e por terceiros, de sua situação patrimonial, econômica e financeira, bem como dos resultados positivos ou negativos alcançados pela empresa.

 

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Essas demonstrações não são úteis apenas para o direito societário comercial. Servem também a finalidades preceituadas pela legislação tributária. São instrumentos valiosos, por outro lado, para a administração da sociedade e o controle gerencial, desempenhando, desse modo, funções não jurídicas também. O estudo dessas demonstrações pelo direito comercial restringe-se aos dados relevantes para o tratamento das relações entre os acionistas e destes com os órgãos de administração.

Exercício social é o período de um ano definido pelos estatutos (LSA, art. 175). Para a sua fixação, pode-se optar por qualquer lapso anual, embora, na grande maioria dos casos, e por estrito critério de conveniência, defina-se o fim do exercício social em 31 de dezembro. No ano em que a companhia foi constituída ou em que houve alteração estatutária, o exercício social poderá ser menor ou maior.

Findo o exercício social, a diretoria deve providenciar o levantamento das demonstrações financeiras. Quando a companhia é fechada, são quatro instrumentos contábeis a serem providenciados: a) balanço patrimonial; b) lucros ou prejuízos acumulados; c) resultado do exercício; d) fluxos de caixa (LSA, art. 176,1 a IV). Sendo aberta a companhia, exige-se, além dessas demonstrações, também a do “valor adicional” (art. 176, V). Tais demonstrações, chamadas pela lei de financeiras, devem basear-se na escrituração mercantil da sociedade anônima e serão publicadas para oportuna apreciação na Assembleia Geral Ordinária (art. 132,1), juntamente com o relatório dos administradores.

Na escrituração mercantil da companhia, prevê a lei, deverá ser observado o regime de competência. Trata-se de conceito fundamental da Contabilidade, pelo qual se define que as apropriações contábeis das operações e as mutações patrimoniais decorrentes serão feitas no exercício correspondente ao da constituição da obrigação e não ao de sua liquidação. Não se admite, portanto, a adoção do regime de caixa (também denominado regime de gestão), em que a apropriação contábil coincide com o pagamento da obrigação e não com o seu nascimento.

O Balanço Patrimonial é a demonstração financeira que informa o ativo, o passivo e o patrimônio líquido da sociedade anônima. Tem importância jurídica, por exemplo, no cômputo do reembolso pelo valor patrimonial das ações.

 

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A Demonstração de Lucros ou Prejuízos Acumulados informa as parcelas dos lucros aferidos pela companhia e não distribuídos aos acionistas ou os prejuízos  não absorvidos por sua receita. É instrumento de grande importância para a definição da política empresarial de investimentos, a ser adotada na sociedade.

A Demonstração do Resultado do Exercício apresenta dados sobre o desempenho da companhia durante o último exercício e possibilita ao acionista avaliar não somente o grau de retorno de seu investimento, como a eficiência dos atos da administração. Os seus elementos contábeis básicos são a receita e a despesa, discriminadas de acordo com a respectiva natureza (receita bruta e líquida, despesa operacional e não operacional etc.).

A Demonstração dos Fluxos de Caixa visa a evidenciar os ingressos e desembolsos do caixa da sociedade anônima, isto é, suas disponibilidades líquidas. Quando a sociedade anônima é fechada e possui o patrimônio líquido inferior a R$ 2.000.000,00, a lei a dispensa de levantar essa demonstração contábil.

A Demonstração de Valor Adicionado, por fim, é a medida contábil da riqueza gerada pela companhia. Só as companhias abertas estão obrigadas ao seu levantamento, e trata-se de instrumento de pouco interesse para os profissionais do direito.

 

14.      LUCROS, RESERVAS E DIVIDENDOS

O resultado do exercício, revelado na respectiva demonstração financeira, tem a sua destinação em parte definida pela lei. Desse modo, após a absorção de prejuízos acumulados, a provisão para o Imposto de Renda (LSA, art. 189) e o pagamento das participações estatutárias de empregados, administradores e partes beneficiárias (art. 190), o lucro líquido gerado pela empresa durante o último exercício terá dois possíveis destinos: ficará em mãos da própria sociedade ou será distribuído entre os acionistas, a título de dividendos. Aliás, uma parcela dos lucros permanecerá obrigatoriamente na companhia (por meio da reserva legal) e outra será necessariamente distribuída aos acionistas (dividendo obrigatório), restando à Assembleia Geral Ordinária deliberar quanto à destinação do restante do resultado, aprovando ou rejeitando a proposta da diretoria (LSA, art. 192). Para tanto, abrem-se três alternativas: constituição de reserva de lucro, distribuição de dividendos ou capitalização (aumento ao Capital social).

Há seis categorias de reservas de lucro:

a)        reserva legal - ela é constituída por 5% do lucro líquido, desde que não ultrapasse 20% do capital social (LSA, art. 193). A companhia deve obrigatoriamente manter esta reserva, que somente poderá ser utilizada para aumento do capital social ou absorção de prejuízos.

 

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b)        reserva estatutária - como o nome indica, é definida pelos estatutos! para o atendimento de necessidades específicas da sociedade anônima, ou por j cautelas próprias dos seus acionistas.

c)         reserva para contingências - é destinada à compensação, em exercício futuro, de diminuição de lucro derivada de evento provável, como, por exemplo, a | condenação da sociedade anônima em demanda judicial. A reversão dessa reserva I será feita no exercício em que ocorrer o evento ou afastar-se a possibilidade de| sua verificação.

d)        reserva de incentivos fiscais - ela se destina a excluir da base de cálculo  dos dividendos a parcela do lucro da sociedade proveniente de doações ou subvenções governamentais para investimento.

e)        reserva de retenção de lucros - esta reserva tem o objetivo de atender às despesas previstas em orçamento de capital previamente aprovado em Assembleia Geral. Normalmente é utilizada para prover recursos para investimentos  em exercícios futuros.

f)         reserva de lucros a realizar- visa a impedir a distribuição entre acionistas de recursos que somente irão ingressar no caixa da sociedade em exercícios futuros, embora devam estar já contabilizados em razão da adoção legal do regime de competência.

Além das reservas de lucro, há, ainda, a de capital.

Na reserva de capital, encontram-se contas que, embora não integrem! o capital social da companhia, guardam alguma relação com ele. Devem ser classificadas como reservas de capital contas como as seguintes: ágio na subscrição de novas ações e o produto da venda de partes beneficiárias e bônus na subscrição, doações (LSA, art. 182, § l.°). Estes recursos somente poderão ser utilizados pela companhia em determinadas situações, como, por exemplos para a absorção de prejuízos, após o exaurimento dos lucros acumulados e das| reservas de lucros, utilizando-se a legal por último (art. 189, parágrafo único)  o resgate de partes beneficiárias ou o pagamento de dividendos preferenciais» se prevista tal possibilidade pelos estatutos (art. 200, III e V).

 

Os dividendos obrigatórios são a parcela do lucro líquido da sociedade que a lei determina seja distribuído entre os acionistas (LSA, art. 202). Inovação| interessante da lei brasileira de 1976, os dividendos obrigatórios asseguram! aos acionistas minoritários algum retorno de seus investimentos, impedindo] que o controlador reinvista na própria companhia todos os resultados gerados, 3

A parcela mínima dos lucros a ser necessariamente distribuída entre o$j acionistas será a definida pelo estatuto. Na hipótese de omissão deste, prevê | a lei a distribuição de pelo menos metade do lucro líquido ajustado. Além do percentual do lucro liquido da sociedade previsto no estatuto (ou na lei), também deve ter a destinação de dividendo obrigatório a parcela deste lucro não apropriada em reservas legais ou estatutárias (LSA, art. 202, § 6.°).

 

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A distribuição do dividendo obrigatório somente não será feita em duas hipóteses: se os órgãos da administração informarem à Assembleia Geral Ordinária que a situação financeira da companhia não é compatível com o seu pagamento; ou por deliberação da Assembleia Geral de companhia fechada, se não houver oposição de qualquer dos acionistas presentes. Nestas situações, os lucros não distribuídos constituirão reserva especial, e serão atribuídos aos acionistas se e quando o possibilitar a situação financeira da companhia.

Os dividendos prioritários são os devidos aos titulares de ações preferenciais; podem ser, de acordo com a previsão estatutária, fixos ou mínimos.

Os dividendos prioritários fixos atribuem ao acionista o direito ao recebimento de determinado valor, estipulado em moeda nacional ou em percentual do capital social ou do preço de emissão. Já os dividendos prioritários mínimos atribuem o direito ao recebimento de valor nunca inferior a certa importância ou percentual. Desse modo, o acionista titular de ação preferencial com direito a dividendo fixo poderá receber menos ou mais que o pago aos acionistas titulares de ação ordinária, enquanto o beneficiado por dividendo mínimo receberá valor igual ou superior ao pago às ordinárias.

O dividendo prioritário deve ser apropriado contabilmente após a constituição da reserva legal, mas antes da constituição das demais reservas de lucro. Por outro lado, poderá o estatuto estipular o pagamento de dividendos prioritários à conta de reserva de capital, regulando a matéria. Se o pagamento dos dividendos prioritários consumir toda a parcela dos lucros destinada à distribuição entre os acionistas, os titulares de ações ordinárias não receberão qualquer soma naquele exercício. Essa situação não contraria a previsão legal dos dividendos obrigatórios, desde que aos titulares de ações preferenciais tenha sido pago o percentual correspondente do lucro líquido ajustado definido pelos estatutos.

Por fim, lembre-se que a legislação previdenciária proíbe a sociedade anônima de distribuir dividendos entre os acionistas enquanto se encontrar em débito perante o INSS (Lei 8.212/91, art. 52). Em se verificando a hipótese, no entanto, a autarquia previdenciária não terá direito de reclamar dos acionistas os valores que estes receberam indevidamente. A sanção para o descumprimento da proibição legal, no caso, é apenas a imposição de uma multa a ser suportada pela companhia. Assim, se a fiscalização do INSS constatar, pelo exame da escrituração de uma sociedade anônima, que ela distribuiu lucros a despeito da existência de débito previdenciário, esta — e não os acionistas - será apenada.

 

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15.      DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO

Diz o art. 219 da LSA que a sociedade anônima se extingue pelo encerramento da liquidação, que se segue à dissolução, ou pela incorporação, fusão e cisão com versão de todo patrimônio em outras sociedades.

A sociedade anônima, em virtude de sua natureza institucional, está sujeita ao regime dissolutório previsto nos arts. 206 a 218 da LSA. Segundo este regime, a dissolução da companhia pode dar-se de pleno direito, por decisão judicial ou por decisão de autoridade administrativa competente. São causas determinantes da primeira modalidade de dissolução o término do prazo i duração, os casos previstos em estatuto, a deliberação da assembleia geral por acionistas detentores de, no mínimo, metade das ações com voto, por unipessoalidade incidente, e, finalmente, pela extinção da autorização para funcionar.   São causas da dissolução judicial a anulação da constituição da companhia proposta por qualquer acionista, a irrealizabilidade do objeto social, prova em ação proposta por acionista que represente 5% ou mais do capital social» finalmente, a falência.

Deve-se acentuar que a dissolução por vontade dos acionistas não exige a unanimidade, decorrência natural do caráter institucional da sociedade anônima. Esta dissolução poderá ser decidida por quem represente metade, pelo menos, do capital votante (LSA, art. 136, VII). À dissolução segue-se a liquidação, que será judicial sempre que aquela o for e mais nas hipóteses de pedido de qualquer acionista, ou do representante do Ministério Público, quando a liquidação amigável não for processada a contento.

Se a liquidação for irregular, poderá ser responsabilizado o liquidante ou mesmo o acionista, prescrevendo a correspondente ação judicial em 1 ar contado da publicação da ata de encerramento da liquidação (LSA, art. 287,1, b)

16.      TRANSFORMAÇÃO, INCORPORAÇÃO, FUSÃO E CISÃO

 

Os procedimentos de reorganização das empresas que envolverem pelo menos uma sociedade anônima devem atender à disciplina da LSA. Não havendo na operação sociedade deste tipo, a disciplina é a do CC (arts. 1.113 a 1.122) São quatro operações, pelas quais as sociedades mudam de tipo, aglutinam-se dividem-se, procurando os seus sócios e acionistas dotá-las do perfil mais adequado à realização dos negócios sociais.

 

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A transformação é a operação de mudança de tipo societário: a sociedade limitada torna-se anônima, ou vice-versa. Pode dizer respeito aos cinco tipos de sociedades personalizadas do direito brasileiro e não acarreta a dissolução e liquidação do ente societário. Aliás, a transformação não extingue a pessoa jurídica da sociedade, nem cria outra nova. É o mesmo sujeito de direito coletivo anterior à transformação que permanece.

O procedimento da transformação deve obedecer às mesmas formalidades preceituadas para a constituição da sociedade do tipo resultante. A sua deliberação exige a aprovação unânime de todos os sócios ou acionistas (inclusive os titulares de ações preferenciais sem voto), salvo se o ato constitutivo já admite a possibilidade da transformação. Na hipótese de previsão contratual ou estatutária da transformação da sociedade, no entanto, os sócios dissidentes poderão exercer o direito de retirada (LSA, art. 221).

A incorporação é a operação pela qual uma sociedade absorve outra ou outras, as quais deixam de existir; a fusão consiste na união de duas ou mais sociedades, para dar nascimento a uma nova; e a cisão é a transferência de parcelas do patrimônio social para uma ou mais sociedades, já existentes ou constituídas na oportunidade. Estas três operações submetem-se a regras comuns de procedimento, cabendo a deliberação ao órgão societário competente para alteração do ato constitutivo.

A incorporação não se confunde com a incorporação de ações. Esta última está disciplinada no art. 252 da LSA e importa a conversão de sociedade anônima em subsidiária integral. Na incorporação de ações, todas as ações do capital social de uma companhia são transferidas ao patrimônio de uma sociedade I empresária, que passa à condição de sua única acionista. É indispensável que essa sociedade, detentora de todo o capital social da anônima, seja brasileira.

Tem início a incorporação, a fusão ou a cisão com versão patrimonial para sociedade existente com a formalização de um protocolo pelos órgãos de administração das sociedades envolvidas ou seus sócios. Se uma sociedade anônima f for interessada na operação, a lei exige também a apresentação à Assembleia Geral de justificação (LSA, art. 225). Em seguida, procede-se à avaliação do patrimônio a ser vertido, mediante perícia técnica, de modo a assegurar a equivalência entre o seu valor e o capital a realizar.

 

A lei faculta o direito de retirada aos acionistas cuja sociedade foi incorporada em outra. Note-se que o acionista da sociedade incorporadora não tem esse direito, na hipótese em que discorda da operação. Também no caso de fusão de sociedades terão os dissidentes direito de retirada. Deve-se atentar, contudo, que há certas condições para o recesso, isto é, o acionista só poderá retirar-se da companhia se, sendo aberta a sociedade, as ações desta não compuserem índices gerais de bolsas de futuro ou se mais da metade das ações estiver em mãos do controlador.

 

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Nessas duas situações, consideram-se ilíquidas as ações emitidas pela companhia (isto é, são ações difíceis de se negociarem, mesmo no MVM), e por isso o acionista não tem uma real alternativa econômica ao reembolso. Na cisão, só há direito de retirada se a operação societária acarretar a participação do acionista em sociedade com objeto essencial diferente ou dividendos obrigatórios menores que os da cindida, ou integrante de grupo a que não pertencia a cindida.

Os direitos dos credores, nessas operações, estão claramente definidos: Na transformação eles continuam titularizando as mesmas garantias dadas pelo tipo societário anterior, até integral satisfação de seus créditos. Assim, à transformação de sociedade em nome coletivo em comandita por ações não impede que o credor anterior à operação responsabilize os sócios ilimitada mente. Na incorporação e na fusão, o credor prejudicado pela nova situação ’ sociedade devedora poderá pleitear em juízo a anulação da operação. Falindo a sociedade incorporadora ou a resultante de fusão, os credores anterior poderão requerer no juízo falimentar a separação das massas. Finalmente, m cisão, define a lei a solidariedade entre as sociedades resultantes da operação por todas as obrigações da cindida. Se o instrumento da cisão estabelecer que a sociedades resultantes obrigar-se-ão somente pelas dívidas a elas transferidas, o credor poderá opor-se a essa definição de distribuição de responsabilidade no prazo de 90 dias (LSA, art. 233).

A incorporação, a fusão ou a cisão de sociedade anônima emissora debêntures não poderão ocorrer sem a prévia aprovação dos debenturistas reunidos em assembleia, a menos que se assegure o resgate do valor mobiliário nos 6 meses seguintes à operação (LSA, art. 231).

A incorporação e a fusão de sociedades estão condicionadas à aprovação pelo CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica sempre que pelo menos um dos grupos envolvidos tiver faturamento bruto anual ou volume negócios no País igual ou maior que R$ 400.000.000,00 e o outro, maior igual a R$ 30.000.000,00 (LIOE, art. 88).

17.      GRUPOS DE SOCIEDADE E CONSÓRCIO

A associação de esforços empresariais entre sociedades, para a realização de atividades comuns, pode resultar em três diferentes situações: os grupos de fato, os de direito e os consórcios.

 

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Os grupos de fato se estabelecem entre sociedades coligadas ou entre controladora e controlada. Coligadas são aquelas em que uma tem influência significativa sobre a outra, sem, contudo, controlá-la. Já controladora é aquela que detém o poder de controle de outra companhia. Em regra, a lei veda a par­ticipação recíproca entre a sociedade anônima e suas coligadas ou controladas, abrindo exceção somente para as hipóteses em que a companhia pode adquirir as próprias ações (LSA, arts. 244 e 30, § l.°, b).

Uma hipótese específica de controle de sociedade por outra se revela na constituição de subsidiária integral, a única sociedade unipessoal originária admitida pelo direito brasileiro. A outra previsão legal de unipessoalidade diz respeito à sociedade anônima com mais de um sócio no momento da consti­tuição, mas que, temporariamente, tem todas as suas ações reunidas nas mãos de uma só pessoa (LSA, art. 206,1, d). Subsidiária integral é, de acordo com a previsão legal, a sociedade anônima constituída por escritura pública cujo único acionista é uma sociedade. Esta última pode ser de qualquer tipo (anônima ou não), mas necessariamente brasileira.

Em relação aos grupos de fato, preocupou-se o legislador, basicamente, em garantir maior transparência nas relações entre as coligadas e entre as contro­ladas e sua controladora, por meio de regras próprias sobre as demonstrações financeiras (LSA, arts. 247 a 250).

Grupo de direito, ao seu turno, é o conjunto de sociedades cujo controle é titularizado por uma brasileira (a sociedade comandante, ou holding) e que, mediante convenção acerca de combinação de esforços ou participação em ativi­dades ou empreendimentos comuns, formalizam essa relação interempresarial. Os grupos devem possuir designação, da qual constará palavra identificadora da sua existência (“grupo” ou “grupo de sociedades”: art. 267 da LSA), e devem estar devidamente registrados na Junta Comercial.

Registre-se que o grupo não tem personalidade jurídica própria, sendo apenas uma relação interempresarial formalizada. Por outro lado, entre as sociedades integrantes do mesmo grupo não há, em regra, solidariedade, exceto perante as autoridades antitruste (LIOE, art. 33) e pelas dívidas trabalhistas (CLT, art. 2.°, § 2.°) e previdenciárias (Lei 8.212/91, art. 30, IX). Não , tam­bém, em regra, subsidiariedade entre as sociedades de um mesmo grupo, salvo quanto às obrigações relacionadas a contrato de consumo (CDC, art. 28, § 2.°). Os grupos podem contar com estrutura administrativa própria, consistente em órgãos colegiados e cargos de direção-geral.

 

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Por fim, se duas sociedades quiserem combinar seus esforços e recurso para o desenvolvimento de empreendimento comum, elas podem contratar a formação de um consórcio. As consorciadas respondem pelas obrigações especificadas no instrumento de consórcio, já que este não tem personalidade jurídica própria. Não há, por outro lado, solidariedade presumida entre ela% exceto nas obrigações relacionadas com os direitos do consumidor (CDC, aflj, 28, § 3.°) e nas licitações (Lei 8.666/93, art. 33, V).

O acionista que discorda da deliberação da assembleia geral, no sentido de vir a companhia a participar de grupo societário, tem direito de retirada se as ações que titulariza não possuírem liquidez (LSA, art. 137,11). A falta de liquidez das ações se caracteriza, de acordo com a lei, em duas hipóteses :

a) quando as ações de emissão da sociedade anônima a que pertence o dissidente não integram índice geral de bolsa de futuro; b) se mais da metade das ações emitidas pela sociedade aberta se encontra centralizada em mãos dos controladores. Desse modo, se as ações têm liquidez e são, portanto, facilmente negociáveis nos mercados abertos de capital, o acionista não terá direito dl recesso, exatamente porque as poderá vender no MVM.

18.      SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA

 

A sociedade de economia mista (S.E.M.) é a sociedade anônima cujo capital social é constituído por recursos provenientes, em parte majoritária, do poder público e, em parte minoritária, dos particulares. Sua constituição depende de lei, que poderá, evidentemente, estabelecer normas diferentes das previstas pela legislação do anonimato. Tais normas, no entanto, aplicam-se, tão somente, á; sociedade de economia mista em particular. As companhias de economia mista abertas estão, por outro lado, sujeitas ao controle e fiscalização da CVM.

A pessoa jurídica que controla a S.E.M. tem as mesmas responsabilidades do acionista controlador, porém a própria lei ressalva que a orientação dos negócios sociais pode ser feita de molde a atender ao interesse público que justificou a criação da sociedade. O que há, em particular, é a possibilidade de comprometimento dos recursos sociais em atividades relativamente deficitárias, importando em diminuição global do lucro líquido da sociedade, em virtude dá realização do bem comum que inspirou a sua constituição. O acionista particular de sociedade de economia mista está ciente, ao ingressar no quadro associativo da companhia, desta particularidade, ou seja, de que, eventualmente, seja obrigado a suportar ligeira diminuição na rentabilidade de seu investimento, por força do atendimento de interesse maior que o seu. É claro que esta diminuição não poderá ser de tal porte que implique a descaracterização do investimento feito como negócio de conteúdo privado.

 

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Não cabe ao acionista suprir, com o seu patrimônio, graves defasagens na prestação do serviço público. O acionista controlador poderá, portanto, vira ser responsabilizado pelos demais acionistas particulares da sociedade de economia mista, sempre que, em decorrência do cumprimento do disposto no art. 238 da LSA, desenvolver atividade empresarial altamente deficitária. A fundamentação deste entendimento se vale, inclusive, da responsabilidade objetiva da Administração Pública.

As sociedades de economia mista terão conselho de administração obrigatoriamente e o conselho fiscal em funcionamento permanente (arts. 239 e 240).

A administração destas sociedades está disciplinada em lei específica (Lei n. 13.303/16), que estabelece, entre outras, as seguintes regras: (a) só pode ser administrador quem tiver experiência profissional ou acadêmica na área de atuação da S.E.M. por um período mínimo (que varia de 4 a 10 anos); (b) no conselho de administração, haverá conselheiro independente; (c) os diretores devem assumir o compromisso de atingir metas e resultados específicos; (d) é obrigatória, na estrutura societária, a existência de Comitê de Auditoria.

19.      SOCIEDADE EM COMANDITA POR AÇÕES

 

O derradeiro tipo societário é a sociedade em comandita por ações, à qual se aplicam todas as normas relativas à sociedade anônima, com as alterações previstas nos arts. 1.090 a 1.092 do CC (LSA, arts. 280 a 284). Algumas dessas alterações têm em vista a peculiar posição em que se encontram os diretores da sociedade em comandita por ações. São desta categoria as seguintes disposições legais:

a)        Responsabilidade dos diretores - o acionista diretor da sociedade em comandita por ações (também chamado gerente) tem responsabilidade ilimitada pelas obrigações da sociedade (art. 1.091). Por essa razão, somente o acionista poderá fazer parte da diretoria. Ademais, os diretores serão nomeados pelo estatuto, por prazo indeterminado, e somente podem ser destituídos por deliberação de acionistas que representem, no mínimo, 2/3 do capital social.

b)        Nome empresarial - a sociedade em comandita por ações pode adotar firma ou denominação, sendo que, no primeiro caso, não poderá compor seu nome empresarial aproveitando o nome civil de acionista que não seja diretor. Em ambas as hipóteses, o nome empresarial deverá conter expressão identificativa do tipo societário (CC, art. 1.161).

c)         Deliberações sociais - ainda em razão da responsabilidade ilimitada dos diretores, a assembleia geral não tem poderes para, sem a anuência destes, mudar o objeto essencial da sociedade, prorrogar o seu prazo de duração, aumentar ou reduzir o capital social, criar debentures ou partes beneficiárias (art, 1.092).

 

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Feitas as ressalvas, portanto, aplicam-se às sociedades em comandita por ações todas as demais normas pertinentes às sociedades anônimas, tais as relativas às espécies, forma e classe de ações, debentures, partes beneficiárias, constituição e dissolução, poder de controle, direitos essenciais do acionista, e assim por diante.