Este material foi adaptado pelo
laboratório de acessibilidade da universidade federal do rio grande do norte,
em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998, capítulo IV, artigo 46.
Permitindo o uso apenas para fins educacionais de pessoas com deficiência
visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e utilizado com fins
comerciais.
Revisado por: Mariana Julia do
Nascimento Pereira.
Natal, agosto de 2018.
COELHO, Fábio Ulhoa. Constituição do crédito câmbiário. In:_____. Novo manual de direito comercial: direito de empresa.
29. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 18, p. 249-257.
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Capítulo 18
CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO CÂMBIÁRIO
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1. SAQUE
A
letra de câmbio é uma ordem de pagamento. Isto significa que do seu saque, de
sua criação, decorre o surgimento de três situações jurídicas distintas. São
três diferentes complexos de direitos e obrigações que nascem juntamente com o
titulo.
Em
primeiro lugar, tem-se a situação jurídica daquele que dá a ordem de pagamento,
que determina que certa quantia seja paga por uma pessoa a outra. Quem se
encontra nesta situação é chamado de sacador.
Em
segundo lugar, há a situação jurídica daquele para quem a ordem é dirigida, o
destinatário da ordem. Ele deverá, nas condições estabelecidas, realizar o
pagamento ordenado. A pessoa nesta situação é denominada sacado.
Finalmente,
existe a situação jurídica do beneficiário da ordem de pagamento, aquele em
favor de quem se fez dita ordem, e que, por isso, é o credor da quantia
mencionada no título. Quem se encontre nesta terceira situação jurídica é
conhecido como tomador.
São
três situações jurídicas distintas, que surgem com a prática de um ato cambial
chamado saque.
Saque
é o ato de criação, de emissão da letra de câmbio. Após este ato cambial, o
tomador estará autorizado a procurar o sacado para, dadas certas condições,
receber dele a quantia referida no título.
Mas
o saque produz outro efeito também: o de vincular o sacador ao pagamento
da letra de câmbio. O sacado é que se encontra na posição de destinatário da
ordem de pagamento; ele é que, em princípio, deverá pagar o título. No entanto,
se não o fizer, ou se não se realizarem as condições de sua vinculação ao
título, o tomador poderá cobrar a letra de câmbio do próprio sacador. Este,
ao praticar o saque, tornou-se codevedor do título (LU, art. 9.°).
Embora
o saque crie três situações jurídicas distintas, a lei faculta que a mesma
pessoa ocupe mais de uma dessas situações. Assim, a letra poderá ser sacada em benefício do próprio
sacador (a
mesma pessoa ocupando simultaneamente as situações jurídicas de sacador e
tomador); ou ainda sobre o próprio sacador (a mesma pessoa ocupando
simultaneamente as situações jurídicas de sacador e sacado)
(LU, art. 3.°).
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A
lei estabelece determinados requisitos para a letra de câmbio. São elementos
indispensáveis à produção, pelo documento, dos efeitos cambiais previstos por
lei. Ao documento a que falte algum desses requisitos não se pode aplicar a
disciplina do regime jurídico-cambial.
São
requisitos da letra de câmbio:
a) a expressão “letra de câmbio” inserta no próprio texto
do título, não bastando constar fora do texto, mesmo que com destaque; tal
expressão deverá ser na língua empregada na redação do título (LU, art. l.°, n.
1);
b) o mandato puro e simples (ou seja, não sujeito a
nenhuma condição) de pagar quantia determinada (LU, art. l.°, n. 2);
c) o nome do sacado (LU, art. l.°, n. 3) e sua
identificação pelo número de sua Cédula de Identidade, de inscrição no Cadastro
de Pessoa Física, do Título Eleitoral ou da Carteira Profissional (Lei
6.268/75, art. 3.°);
d) o lugar do pagamento ou a indicação de um lugar ao
lado do nome do sacado, que será tomado como lugar do pagamento e como
domicílio do sacado (LU, art. Io, n. 5, c/c o art. 2.°, terceira
alínea);
e) o nome do tomador, o que quer dizer que não se admite
letra de câmbio sacada ao portador (LU, art. l.°, n. 6);
f) local e data do saque, podendo ser a indicação deste
local substituída por menção de um lugar ao lado do nome do sacador (LU,
art. l.°, n. 7, c/c o art. 2.°, última alínea); e
g) assinatura do sacador (LU, art. l.°, n. 8).
A
época do vencimento deve também constar da letra, mas sua falta não
descaracterizará o instrumento como título de crédito porque a lei dispõe que a
letra será à vista neste caso (LU, art. 2.°, segunda alínea).
Alguns
autores distribuem os requisitos legais da letra de câmbio em essenciais ou não
essenciais, incluindo nesta última categoria aqueles que, nos termos do art. 2o
da LU, podem ser substituídos ou supridos. Não há, no entanto, maior interesse
nesta classificação.
Se
o sacador-como, de resto, qualquer outro obrigado cambial-não souber ou não
puder assinar, somente poderá praticar o ato cambial por procurador nomeado por instrumento público e com
poderes especiais. Por outro lado, não se admite, em relação à letra de câmbio,
a utilização de chancela mecânica.
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Os
requisitos da letra de câmbio - assim também de qualquer título de crédito -
não precisam constar do instrumento no momento do saque (CC, art. 891). Ela
poderá ser sacada e até mesmo circular incompleta. Os requisitos devem estar
totalmente cumpridos antes da cobrança ou do protesto do título. Entende-se que
o portador de boa-fé é procurador do sacador para
completar a letra de câmbio emitida com omissões. Claro, se preencher o título
em desacordo com o avençado ou com a realidade dos fatos, o
portador age de má-fé e deixa de ser considerado procurador do emitente do
título.
2. ACEITE
O
sacado de uma letra de câmbio naturalmente não tem nenhuma obrigação cambial
pelo só fato de o sacador ter-lhe endereçado a ordem de
pagamento. Estará vinculado ao pagamento do título apenas se concordar em
atender à ordem que lhe foi dirigida. O sacado, em nenhuma hipótese, está
obrigado a cumprir o ordenado por esta espécie de título de crédito.
O
ato cambial pelo qual o sacado concorda em acolher a ordem incorporada pela
letra se chama “aceite”. Nada o obriga a aceitar a letra de câmbio, nem sequer
a prévia existência de obrigação perante o sacador ou o tomador.
O sacado somente assumirá obrigação cambial, pelo aceite, se o desejar. E o
aceite ato de sua livre vontade. Se, por acaso, é ele devedor do sacador ou
do tomador, por obrigação derivada de ato, negócio, fato ou relação jurídica
diversa, caberá evidentemente a ação própria para a cobrança do devido, mas não
existe nenhuma forma de obrigá-lo juridicamente à prática do aceite. Quer
dizer, ele pode até ser devedor, mas só mediante sua vontade (expressa pelo
aceite) a dívida poderá ser representada por uma letra de câmbio.
O
aceite resulta da simples assinatura do sacado lançada no anverso do título,
mas poderá ser firmado também no verso, desde que identificado o ato praticado
pela expressão “aceito” ou outra equivalente.
O
aceitante é
o devedor principal da letra de câmbio. Isto significa que, no vencimento, o
credor do título deverá procurar inicialmente o aceitante para cobrar
o valor devido. Somente na hipótese de recusa de pagamento pelo devedor
principal, é que o credor poderá cobrar o título dos coobrigados, mesmo assim
em determinadas condições. Cada título de crédito tem o seu devedor principal,
em relação ao qual se aplica esta regra.
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Como
o sacado não está obrigado a aceitar a letra de câmbio, a recusa do aceite é
comportamento lícito. A lei, no entanto, reserva para a recusa do aceite uma
determinada consequência, com vistas a resguardar os interesses do tomador do
título. Trata-se do vencimento antecipado (LU, art. 43). Se o sacado não
aceitar a ordem de pagamento que lhe foi dirigida, o tomador (ou o credor do
título, se eleja tiver circulado) poderá cobrar o título de imediato do sacador, porque
o vencimento originariamente fixado para a cambial é antecipado com a recusa do
aceite.
Igual
consequência ocorre quando a recusa é parcial, ou seja, no caso de aceite limitativo ou
modificativo. Do primeiro tipo é o aceite em que o sacado concorda em pagar
apenas uma parte do valor do título; já modificativo é o aceite em que o sacado
adere à ordem alterando parte das condições fixadas na letra, como, por
exemplo, adiando o vencimento. Nas duas hipóteses, ocorre aceite parcial; mas
ocorre também recusa parcial do aceite. Estabelece, então, a lei que, em
virtude do aceite limitativo ou modificativo, o aceitante se
vincula ao pagamento do título nos exatos termos de seu aceite (LU, art. 26),
mas se opera o vencimento antecipado da letra de câmbio, que poderá, por isto,
ser cobrada de imediato do sacador.
Para
evitar que a recusa do aceite produza o vencimento antecipado da letra de
câmbio, o sacador deve inserir a cláusula “não
aceitável” (salvo nas hipóteses proibidas pelo art. 22 da LU). Uma letra de
câmbio com esta cláusula não poderá ser apresentada ao sacado para aceite. O
credor somente poderá apresentar o título ao sacado no seu vencimento, e para
pagamento, portanto. Com este expediente, a negativa do sacado em acolher a
ordem que lhe fora dirigida não importará em nenhuma consequência prática
excepcional em relação ao sacador, porque a recusa do aceite só poderá
ocorrer no vencimento do título, época em que ele já deveria estar preparado
para a eventualidade de honrá-lo. Uma solução intermediária, prevista em lei
também, é a proibição pelo sacador de apresentação da letra para aceite
antes de uma determinada data. Com isto, a eventual recusa do aceite e
consequente vencimento antecipado do título ficam postergados para a data
escolhida pelo sacador. Também é possível ao sacador fixar
um prazo máximo para a apresentação ao sacado, forçando assim a pronta
definição se haverá ou não aceite.
A
letra de câmbio, salvo nas hipóteses em que o sacador define um
prazo diverso, deve ser apresentada pelo tomador ao sacado até o máximo
previsto em lei. Se se tratar de letra de câmbio à vista, o tomador deverá
procurar o sacado até o máximo de 1 ano após o saque (art. 34). Neste caso, no
entanto, a letra não é, a rigor, apresentada a aceite, mas propriamente para
pagamento. Nada
impede, contudo, que a
letra à vista seja aceita pelo sacado e, em seguida, paga.
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Já a letra de
câmbio a certo termo da vista (o vencimento se opera com o transcurso de lapso
temporal em que a data do aceite é o termo a quo), o tomador deverá
apresentá-la ao sacado para aceite até o prazo de 1 ano após o saque (art. 23).
Neste tipo de letra de câmbio, não é possível ao sacador inserir a
cláusula “não aceitável” (art. 22). A letra de câmbio a certo termo da data (o
vencimento se opera com o transcurso de lapso temporal em que a data do saque é
o termo a quo) e a letra de câmbio em data certa devem ser apresentadas a
aceite pelo tomador até o vencimento fixado para o título (art. 21). A
inobservância desses prazos pelo credor acarreta a perda do direito de cobrança
do título contra os coobrigados (art. 53).
A
letra de câmbio não aceita não pode ser protestada por falta de pagamento.
Neste caso, o título só admite protesto por falta de aceite, em que o
protestado é o sacador do título (Lei 9.492/97, art. 21, §
5.°). Assim é porque o sacado não tem nenhuma obrigação e a falta do aceite
corresponde à frustração de ordem dada pelo sacador.
Apresentado
o título ao sacado, este tem o direito de pedir que ele lhe seja reapresentado
no dia seguinte (LU, art. 24). É o chamado prazo de respiro, que se destina a
possibilitar ao sacado a realização de consultas ou a meditação acerca da
conveniência de aceitar ou recusar o aceite.
3. ENDOSSO
A
letra de câmbio é título sacado, em regra, com a cláusula “à ordem". Isto
significa que o seu credor pode negociar o crédito por ela representado
mediante um negócio jurídico trasladador da titularidade do crédito, de efeitos
cambiais, chamado endosso. Conceitua-se, então, endosso como o ato cambiário
que opera a transferência do crédito representado por título “à ordem”. É
claro, a alienação do crédito fica ainda condicionada à tradição do título, em
decorrência do princípio da cartularidade.
A
cláusula “à ordem” pode ser expressa ou tácita. Ou seja, basta que não tenha
sido inserida a cláusula “não à ordem” na letra de câmbio para que ela seja transferível por
endosso (LU, art. 11).
O
alienante do crédito documentado por uma cambial é chamado de endossante ou
endossador, o adquirente, de endossatário. Com o endosso, o endossante evidentemente
deixa de ser credor do título, posição jurídica que passa a ser ocupada pelo
endossatário. Também é evidente que somente o credor pode alienar o crédito,
e, portanto, somente o credor pode ser endossante.
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O
primeiro endossante de qualquer letra de câmbio será
sempre o tomador; o segundo endossante necessariamente o endossatário do
tomador; o terceiro, o endossatário do segundo endossante e assim
sucessivamente. Não há qualquer limite para o número de endossos de um título
de crédito; ele pode ser endossado diversas vezes, como pode, simplesmente, não
ser endossado (aliás, a hipótese mais comum hoje).
O
endosso produz, em regra, dois efeitos: a) transfere a titularidade do crédito
representado na letra, do endossante para o endossatário; b) vincula o endossante ao
pagamento do título, na qualidade de coobrigado (LU, art. 15). Há endossos que
não produzem um ou outro destes efeitos, conforme se estudará em seguida.
O
endosso pode ser de duas espécies: “em branco”, quando não identifica o
endossatário, ou “em preto”, quando o identifica. Resulta o endosso da simples
assinatura do credor do título lançado no seu verso, podendo ser feita sob a
expressão “Pague-se a Antonio Silva” (endosso em preto), ou simplesmente
“Pague-se” (endosso em branco), ou sob outra expressão equivalente. O endosso
poderá também ser feito no anverso do título, mas, neste caso, é
obrigatória a identificação do ato cambiário praticado, ou seja, não poderá o endossante se
limitar a assinar a letra.
O
endosso em branco transforma a letra, necessariamente sacada nominativa, em
título ao portador. O endossatário de um título por endosso em branco poderá
transferir o crédito nele representado por mera tradição, hipótese em que não ficará coobrigado.
A
lei veda ao endossante limitar o endosso a uma parte do valor
da letra, considerando nulo o endosso parcial (LU, art. 12; CC, art. 912,
parágrafo único). Além disso, o endosso condicional (em que a transferência do
crédito fica subordinada a alguma condição, resolutiva ou suspensiva) não é
nulo, mas a condição será ineficaz porque a lei a considera não escrita (art.
12).
A
doutrina costuma reunir sob a rubrica de endosso impróprio aquele que não
produz o efeito de transferir a titularidade do crédito documentado pela letra
de câmbio, mas legitima a posse sobre a cártula exercida pelo seu detentor. Com
efeito, em determinadas circunstâncias, poderá o credor da letra transferir
legitimamente a sua posse a terceiro sem transferir-lhe a titularidade do
crédito representado. No caso de o credor da letra incumbir a seu procurador o
recebimento do título, deverá praticar ato cambiário específico destinado a
legitimar a posse do mandatário. Caso tal ato não seja praticado, na própria
letra, o devedor que efetuar o pagamento não se liberará validamente, em virtude
da aplicação dos princípios da
cartularidade e da literalidade. O endosso impróprio que legitima a posse do
procurador do credor é o endosso-mandato (LU, art. 18; CC, art. 917).
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Outro
exemplo de endosso impróprio é o endosso-caução, em que a letra, considerada bem
móvel, é onerada por penhor em favor do credor do endossante. No endosso-caução, o
crédito não se transfere para o endossatário, que é investido na qualidade de
credor pignoratício do endossante. Cumprida a obrigação garantida pelo
penhor, deve a letra retomar ao endossante. Somente na eventualidade de não
cumprimento da obrigação garantida, é que o endossatário por endossocaução
apropria-se do crédito representado pela letra. O endossatário por endosso-caução não
pode endossar o título, salvo para praticar o endosso-mandato (LU,
art. 19; CC, art. 918).
Já
o endosso que não produz o efeito de vincular o endossante ao pagamento
do título é o chamado endosso “sem garantia” (LU, art. 15). Com esta cláusula,
o endossante transfere
a titularidade da letra sem se obrigar ao seu pagamento. A regra, como visto, é
a da vinculação do endossante (lembre-se que o art. 914 do CC não se
aplica em razão do art. 903 do mesmo Código); o ato do endossante de inserir
no endosso a cláusula “sem garantia”, porém, afasta a vinculação prevista na
LU.
O
negócio jurídico trasladador da titularidade de crédito de efeitos não cambiais
é a cessão civil de crédito. Esta difere do endosso em dois níveis: quanto à
extensão da responsabilidade do alienante do crédito perante o adquirente e
quanto aos limites de defesa do devedor em face da execução do crédito pelo adquirente.
Quanto
ao primeiro aspecto, acentue-se que o endossante responde, em regra, tanto pela
existência do crédito quanto pela solvência do devedor. Em outros termos, o
endossatário poderá executar o crédito contra o endossante, caso o
devedor não tenha realizado o pagamento deste. Já o cedente responde, em
regra, apenas pela existência do crédito e não pela solvência do devedor (CC,
arts. 295 e 296). No tocante ao segundo aspecto, o devedor poderá defender-
-se, quando executado pelo cessionário, arguindo matérias atinentes a sua
relação jurídica com o cedente (CC, art. 294), mas não poderá
defender-se, quando executado pelo endossatário, arguindo matérias atinentes a
sua relação jurídica com o endossante (princípio da autonomia das obrigações
cambiais e subprincípio da inoponibilidade das exceções pessoais aos terceiros
de boa-fé, referidos
no art. 17 da LU e 916 do CC).
Há
alguns endossos que produzem efeitos de cessão civil de crédito. Ou seja,
endossos em que o endossante não responde, em regra, pela solvência
do devedor e em que o endossatário não
adquire obrigação autônoma.
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São
duas as hipóteses de endossos com efeitos de cessão civil de crédito, a saber:
a) endosso praticado após o protesto por falta de pagamento ou do transcurso do
prazo legal para a extração desse protesto (LU, art. 20); b) endosso de letra
de câmbio com a cláusula “não à ordem” (art. 11).
Em
relação a esta última hipótese de endosso com efeitos de cessão civil de
crédito, faz-se necessário observar que a letra pode ser emitida com a cláusula
“não à ordem”, ou seja, transmissível mediante apenas cessão civil de crédito.
Essa cláusula pode ser inserida pelo sacador e, assim, desnaturar todo e
qualquer endosso que venha a ser feito na letra de câmbio, ou pode ser
inserida por um endossante, proibindo que o título seja novamente
endossado. A forma de inserir na cártula tal proibição é por meio da cláusula
“não à ordem”; um título com esta cláusula só pode ser transferido por cessão
civil de crédito e não mais pelo endosso, com as consequências advindas das já
examinadas diferenças entre um e outro negócio jurídico. Por esta razão é que a
lei estabelece que o endosso de uma letra na qual foi inserida a cláusula “não
à ordem” tem, a rigor, os efeitos de cessão civil (art. 11). Ademais, como
forma de se desestimular situações como estas, o endossante que
inserir a cláusula “não à ordem” em seu endosso, ou seja, que proibir novos
endossos da letra, não garante o seu pagamento senão para o seu próprio
endossatário (LU, art. 15). Quem adquirir o crédito representado por uma letra
de câmbio endossada com a cláusula “não à ordem” ao alienante não terá a
garantia nem deste, que é cedente, nem do endossante anterior,
que proibira novos endossos.
O
pagamento de letra de câmbio pode ser, total ou parcialmente, garantido por
aval. Por este ato cambial de garantia, uma pessoa, chamada avalista, garante o
pagamento do título em favor do devedor principal ou de um coobrigado. O
devedor em favor de quem foi garantido o pagamento do título é chamado de
avalizado.
O
avalista é responsável da mesma forma que o seu avalizado (LU, art. 32; CC,
art, 899). Isto não significa, contudo, uma atenuação do principio da
autonomia. A obrigação do avalista é autônoma em relação à do avalizado, como
esclarece a própria lei. Eventual nulidade da obrigação do avalizado não
compromete a do avalista. Quando a lei equiparou as responsabilidades de um e de outro
coobrigado, pretendeu apenas prescrever que o avalista responde pelo pagamento
do título perante todos os credores do avalizado; e, uma vez realizando o pagamento, poderá
voltar-se contra o avalizado e todos os devedores do avalizado.
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Questão
altamente controvertida surge da autorização legal do aval antecipado,
constante do art. 14 do Decreto 2.044/1908. Teria o avalista
antecipado do sacado que recusa o aceite alguma obrigação cambial? Uma leitura
precipitada da LU, atinente à equiparação da responsabilidade do
avalista à do respectivo avalizado, poderia dar a entender que, inexistindo
obrigação por parte do avalizado (o sacado, lembre-se, não tem qualquer
responsabilidade cambial antes do aceite), também inexistiria por parte do
avalista. Não se poderá, contudo, esquecer o princípio da autonomia das
obrigações cambiais. O avalista antecipado de sacado que recusa o aceite
responde pelo valor do título na exata medida em que assumiu, com o aval, uma
obrigação autônoma, independente de qualquer outra representada no mesmo título
de crédito.
O
aval resulta da simples assinatura do avalista no anverso da letra de
câmbio, sob alguma expressão identificadora do ato praticado (“Por aval” ou
equivalente) ou não. Se o avalista pretender firmar o verso do título, somente
poderá fazê-lo identificando o ato praticado.
O
aval pode ser “em branco” ou “em preto”. Do primeiro tipo é o aval que não
identifica o avalizado; do segundo, o que o identifica. O aval em branco e dado
em favor do sacador (LU, art. 31). É ele o avalizado pelo
aval em branco.
O
ato de garantia de efeitos não cambiais é a fiança, que se distingue do aval
quanto à natureza da relação com a obrigação garantida. A obrigação do fiador é
acessória em relação à do afiançado (CC, art. 837), ao passo que a obrigação do
avalista é autônoma, independente da do avalizado (LU, art. 32). Como
consequência desta distinção, a lei concede ao fiador o benefício de
ordem (CC, art. 827), inexistente para o avalista.