Este
material foi adaptado pelo laboratório de acessibilidade da universidade
federal do rio grande do norte, em conformidade com a lei 9.610 de 19/02/1998,
capítulo IV, artigo 46. Permitindo o uso apenas para fins educacionais de
pessoas com deficiência visual. Não podendo ser reproduzido, modificado e
utilizado com fins comerciais.
Revisado
por: Mariana Julia do Nascimento Pereira.
Natal,
agosto de 2018.
COELHO,
Fábio Ulhoa. Teoria geral do direito comercial. In______Novo manual de
direito comercial: direito de empresa. 29. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. cap. 8, p. 122-131.
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O
EMPRESÁRIO E OS DIREITOS DO CONSUMIDOR
Página 123
1. INTRODUÇÃO
Antes da entrada em vigor do
Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), as relações e contratos dos
consumidores com os empresários estavam disciplinadas pelo direito civil ou
comercial, observados os limites da teoria dos atos de comércio. Quando eram
consumidos produtos que, por esta teoria, tinham a natureza de mercantis,
aplicavam-se as normas do Código Comercial. Caso contrário, sujeitava-se o
negócio ao Código Civil. Com o advento do CDC, as relações e contratos de
consumo passaram a contar com regime jurídico próprio, cujas normas visam a proteção dos consumidores.
Aplica-se, assim, o CDC
sempre que os sujeitos de direito se encontram numa relação de consumo
legalmente caracterizada.
A relação de consumo envolve
sempre, em um dos polos, alguém enquadrável no
conceito legal de fornecedor (CDC, art. 3.°) e, no
outro, no de consumidor (art. 2.°).
Fornecedor é a pessoa que
desenvolve atividade de oferecimento de bens ou serviços ao mercado, e
consumidor aquela que os adquire ou utiliza como destinatária final. Sempre que
a relação jurídica ligar exercente de atividade de
oferecimento de bens ou serviços ao mercado e o destinatário final destes, ela
é uma relação de consumo e sua disciplina será a do regime de tutela do
consumidor.
Os contratos de compra e
venda, nesse sentido, podem ser de duas naturezas distintas, segundo o direito
privado brasileiro da atualidade. Será compra e venda ao consumidor se
configurada a relação de consumo, isto é, se o vendedor puder caracterizar-se
como fornecedor e o comprador como consumidor (no caso, por exemplo, da
aquisição de automóvel na concessionária); mas será mercantil, se o comprador
não for o destinatário final da coisa (compra de automóveis pela concessionária
junto à fábrica), ou civil se o vendedor não exercer atividade de fornecimento
do bem em questão (venda do automóvel usado a um amigo, por exemplo). No
primeiro caso, aplica-se o CDC; nos dois últimos, o Código
Civil, respeitadas as especificidade dos contratos empresariais.
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A definição da natureza da
relação ou do contrato e, por via de consequência, do regime jurídico aplicável
repercute em diversos aspectos, notadamente quanto aos direitos do comprador,
aos prazos para o seu exercício, obrigações do vendedor, garantias, cláusulas
do contrato etc.
O conceito de empresário,
núcleo do moderno direito comercial (Cap. 1, item 4),
está compreendido no de fornecedor. Todo empresário é fornecedor. Desse modo,
os deveres e responsabilidades previstos pelo CDC para os fornecedores são
também pertinentes aos empresários nas suas relações com os consumidores.
2.
QUALIDADE DO PRODUTO OU SERVIÇO
Ao disciplinar a qualidade
dos produtos ou serviços, o CDC introduziu três conceitos: fornecimento
perigoso, defeituoso e viciado.
2.7.
Fornecimento perigoso
O fornecimento é perigoso se
da utilização dos produtos ou serviços decorre dano, motivado pela insuficiência
ou inadequação das informações prestadas pelo fornecedor sobre os riscos a que
se expõe o consumidor. Todo produto ou serviço pode expô-lo a variados graus de
risco à vida, saúde ou integridade física. Se inexiste
defeito no produto ou serviço, então o dano é consequência de sua má utilização
pelo consumidor. Ora, a má utilização pode ter sido motivada pela insuficiência
ou inadequação das informações prestadas pelo fornecedor, situação em que o
fornecimento perigoso se caracteriza.
Certo desinfetante pode ser
tóxico para pessoas alérgicas. A rigor, o produto não apresenta nenhum problema
(defeito ou vício), mas apenas produz efeitos nocivos em determinados
consumidores. O fornecedor tem o dever de informar a possibilidade de tais
efeitos na embalagem ou no rótulo da mercadoria. Ele somente está dispensado de
alertar os consumidores acerca dos riscos amplamente conhecidos pelas pessoas
em geral (o legislador, no art. 8.° do CDC, fala em
“riscos considerados normais e previsíveis”). O fabricante de facas, por
exemplo, não precisa informar sobre o potencial letal do produto,
suficientemente difundido entre os consumidores (as crianças aprendem, desde
cedo, as cautelas necessárias ao seu manuseio).
Todas as questões
relacionadas com o fornecimento perigoso resolvem-se na análise da suficiência
e adequação das informações prestadas pelo fornecedor, acerca dos riscos do
produto ou serviço. Proíbe a lei (CDC, art. 10) o fornecimento com alto grau de
nocividade ou periculosidade a saúde ou segurança do usuário.
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O produto ou serviço possuirá essa característica
apenas se for impossível prestar adequadamente aos consumidores as informações
que os capacitem à sua utilização sem riscos. Não é qualquer característica
intrínseca a mercadoria ou ao serviço que ira torna-los mais ou menos seguros,
mas sem a suficiência e adequabilidade das informações prestadas pelo
fornecedor.
Pelos danos decorrentes de
fornecimento perigoso respondem, objetiva- mente, o
fabricante, o produtor, o construtor, o importador (CDC, art. 12, m fine) e o
prestador de serviços (art. 14).
2.2.
Fornecimento defeituoso
Fornecimento defeituoso é
aquele em que o produto ou serviço apresenta alguma impropriedade danosa ao
consumidor. Porém, aqui, o dano não se origina da má utilização do produto ou
serviço, ocasionada pela insuficiência ou inadequação das informações sobre os
seus riscos, mas em razão de problema intrínseco ao fornecimento. Por problema
no envasamento do refrigerante, por exemplo, ocorreu maior concentração de gás,
e desta resultaram a quebra da garrafa e ferimentos no consumidor.
A responsabilidade do
fabricante, produtor, construtor e importador dos produtos ou do prestador de
serviços pela indenização dos danos decorrentes de fornecimento defeituoso é objetiva (CDC, arts. 12 e 14).
Ou seja, independe de culpa. Na verdade, o empresário pode antecipar em certa
medida alguns dos possíveis acidentes de consumo (dimensionando, por cálculos
estatísticos, a probabilidade de alguns refrigerantes, durante o ano, serem
envasados com concentração superior de gás, por exemplo). Esses defeitos não
decorrem de culpa do empresário, mas de limitação da capacidade e do
conhecimento humanos. Isto é por mais cauteloso e diligente que seja o
fornecedor, por mais que invista em controle de qualidade e em aperfeiçoamento
tecnológico de sua empresa, alguma inevitável margem de defeituosidade no
fornecimento e inevitável, graças à falibilidade dos homens e mulheres.
Na teoria tradicional da
responsabilidade civil, o agente só deve indenizar a vítima se agiu com culpa.
Assim, no passado, a explosão da garrafa aqui exemplificada seria tida por caso
fortuito ou força maior, hipótese em que a própria vítima arcava com os custos
do infortúnio. A legislação consumerista opera uma inversão na hipótese. Se o
fornecedor pode antecipar a probabilidade de defeitos e seus desdobramentos
danosos, ele poderá então considerar a indenização correspondente como item de
custo, para, em seguida, repassá-lo ao preço do fornecimento, socializando
entre todos os consumidores as repercussões econômicas do evento danoso.
Exatamente por possuir as condições para proceder à socialização dos custos
relacionados aos acidentes de consumo, ao empresário pode-se atribuir
responsabilidade objetiva.
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São excludentes da
responsabilidade objetiva desses fornecedores (CDG, art. 12, § 3.°): a) a prova de que não houve fornecimento (detectado o
defeito, o produto foi separado para inutilização, mas terceiros o furtaram e o
comercializaram, por exemplo); b) inexistência do defeito (situação em que os
danos somente podem ser atribuídos a outros fatores, como a força maior ou o
caso fortuito posteriores ao fornecimento); c) culpa exclusiva do consumidor ou
de terceiro (anotando-se que a culpa concorrente não exonera o fornecedor).
O empresário comerciante
responde pelo acidente de consumo apenas se conservou inadequadamente produto
perecível ou se o fabricante, o produtor, o construtor ou o importador não
puderem ser facilmente identificáveis (CDC, art. 13).
Por sua vez, o profissional liberal responde de modo subjetivo, ou seja,
somente em caso de culpa (CDC, art. 14, § 4.°).
O prazo prescricional para a
responsabilização do fornecedor é de 5 anos (CDC, art.
27).
2.3.
Fornecimento viciado
O fornecimento viciado, por
fim, é aquele em que o produto ou serviço apresenta impropriedade inócua, isto
é, da qual não decorre dano considerável ao consumidor. A mesma impropriedade
pode ser defeito ou vício, dependendo da circunstância de causar, ou não,
prejuízo. Se o automóvel apresenta problema em seu sistema de freios, mas isto
é detectado pelo consumidor antes de qualquer acidente, verifica-se
fornecimento viciado; se, contudo, o problema não é detectado a tempo, e, em
razão dele, ocorre acidente de trânsito, verifica-se fornecimento defeituoso.
Diante de vício no
fornecimento, o consumidor pode optar, grosso modo, por uma de três
alternativas: a) desfazimento do negócio, com a devolução dos valores já pagos,
devidamente corrigidos (ação redibitória); b) redução proporcional do preço (ação
estimatória); c) eliminação do vício, se necessário com a substituição do
produto ou a reexecução do serviço (ação executória específica). Na compra e
venda civil e na comercial, o comprador de coisa viciada dispõe apenas da
alternativa entre a ação redibitória e a estimatória.
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A legislação consumerista
trata de três espécies de fornecimentos viciados: vício de qualidade ou de
quantidade dos produtos e de qualidade dos serviços. Caracteriza-se vício de
qualidade do produto se este é impróprio ao consumo, tem impropriedade que lhe
reduz o valor ou se há disparidade entre a sua realidade e as informações do
fornecedor (CDC, art. 18). O produto é impróprio ao
consumo se está vencido o seu prazo de validade, se há adulteração, alteração,
avaria, falsificação, inobservância de normas técnicas ou se, por qualquer
razão, não atende às finalidades a que se destina (CDC, art. 18, § 6.°).
No fornecimento viciado de
produtos, sendo o vício de qualidade, tem o fornecedor direito de tentar o
saneamento da impropriedade (CDC, art. 18). Esse
direito não existe se o produto for essencial ao consumidor ou se a eliminação
do vício não for possível sem o comprometimento da sua eficácia,
características ou valor (CDC, art. 18, § 4.°).
O vício de quantidade dos produtos
ocorre se o seu conteúdo líquido é inferior às indicações constantes da
rotulagem, embalagem ou publicidade, salvo as variações próprias de sua
natureza. Diante de vício deste tipo, pode o consumidor pleitear, de imediato,
o seu saneamento, mediante a complementação do peso ou medida (CDC, art.
19,11), além da ação redibitória e estimatória.
Há viciamento de qualidade
no serviço se este é inadequado para o fim que razoavelmente dele se espera, ou
ocorrer inobservância de normas regulamentares de prestabilidade (CDC, art. 20,
§ 2.°).
O direito de reclamar por
vícios no fornecimento decai no prazo de 30 dias (produtos e serviços não
duráveis) ou de 90 dias (produtos e serviços duráveis). Alimentos e bebidas são
produtos não duráveis; já a lavagem de automóvel é exemplo de serviço não
durável; o eletrodoméstico é produto durável, enquanto a pintura de casa é
serviço durável. O termo inicial para a fluência desse prazo é a entrega do
produto ou o término da execução do serviço, quando o vício é aparente ou de
fácil constatação (CDC, art. 26, § l.°), e é a sua manifestação, na hipótese de
vício oculto (art. 26, § 3.°).
3.
PROTEÇÃO CONTRATUAL
A legislação civil sobre
contratos pressupõe a existência de partes livres e iguais que transigem sobre
os seus respectivos interesses, com pleno domínio da vontade. As pessoas, neste
contexto, contratam sequerem, com quem querem e como
querem. A ideia de ser o contrato lei entre as partes corresponde a este
cenário pressuposto das normas civis e empresariais.
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A realidade das relações de
consumo, no entanto, é bem diferente. O consumidor não contrata se quiser, com quem quiser e como quiser, mas se vê muitas
vezes obrigado a contratar bens e serviços essenciais, de um ou poucos
fornecedores e sem a menor possibilidade de discutir os termos da negociação.
Pense-se, por exemplo, no contrato de fornecimento de energia elétrica, na
aquisição de alimentos e utensílios básicos etc. O consumidor encontra-se,
perante o fornecedor, numa clara situação de vulnerabilidade. Em geral, ele tem
relativamente ao produto ou serviço que consome muito menos informações do que
o fornecedor.
O Código de Defesa do
Consumidor confere ao consumidor os meios jurídicos para atenuar as distorções
derivadas da vulnerabilidade em que se encontra perante o fornecedor. Cinco
princípios podem ser destacados nessa matéria:
a) Irrenunciabilidade de direitos - são
nulas as cláusulas contratuais que importem, tácita ou expressamente, renúncia,
pelo consumidor, dos direitos que lhe são assegurados. Em termos gerais, este
princípio se encontra inscrito no art. 51, I, do CDC. Outras disposições,
contudo, são exteriorizações desta concepção básica, segundo a qual a proteção
jurídica do consumidor é de ordem pública, com caráter cogente. São exemplos de
aplicação específica do princípio: nulidade da desconsideração do direito de
optar pelo reembolso da quantia paga, quando autorizado por lei (art. 51, II),
vedação da transferência de responsabilidade (art. 51, III), impossibilidade de
inversão do ônus de prova em detrimento do consumidor (art. 51, VI), imposição
de arbitragem necessária (art. 51, VII) e invalidade de cláusulas em desacordo
com o sistema legal de proteção ao consumidor (art. 51, XV). Em virtude desse
princípio, não tem validade qualquer disposição contratual, mesmo que
indubitavelmente assinada pelo consumidor, que importe limitação ou frustração
do exercício de direito legalmente reconhecido. No contrato de consumo, não é
admitida a renúncia a direito nem mesmo por meio de cláusula adicionada a
contrato de adesão, como permite a lei relativamente aos contratos cíveis: o
art. 424 do CC considera nula a renúncia do aderente apenas se for antecipada,
ou seja, constar já do formulário ou de outro instrumento do contrato de adesão
preparado pelo estipulante.
b) Equilíbrio contratual - a equidade nas
relações de consumo é um dos valores fundamentais presentes no sistema de
proteção contratual. Nenhuma oneração excessiva será imposta aos consumidores,
que não podem ficar em situação desvantajosa perante o empresário. Com este
espirito, o legislador fulminou com a nulidade o estabelecimento de faculdades
ao empresário que não sejam correspondentes às reconhecidas aos consumidores (CDC, art. 51, XI e XII). Também não se encontram respaldadas
juridicamente as disposições contratuais autorizando o empresário,
unilateralmente, a alterar as condições do negócio (art. 51, X e XIII).
Igualmente são inválidas as cláusulas com exigências injustificáveis da parte
do empresário (art. 51, VII e VIII).
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c) Transparência
- as relações de consumo devem pautar-se na mais absoluta transparência, ou
seja, o consumidor deve ter prévio e completo conhecimento da exata extensão
das obrigações assumidas por ele e pelo empresário, em decorrência do contrato.
Neste sentido, o consumidor não estará vinculado se não lhe for dada ciência
prévia do conteúdo do instrumento ou se este for redigido de modo a dificultar
a compreensão do seu alcance (CDC, art. 46). Por outro
lado, as informações precisas constantes de mensagem publicitária, transmitida
por qualquer meio de comunicação, integram o contrato (art. 30). Por fim, o
legislador determina que os contratos de adesão escritos devem
ser redigidos de forma clara e compreensível e elaborados com destaque para as
cláusulas limitativas de direitos do consumidor (art. 54, §§ 3.° e 4.°). Como
se nota, a transparência nas
relações de consumo significa a possibilidade de o consumidor ter acesso às
informações relativas às condições do negócio que está realizando ou pretende
realizar. Nenhum expediente poderá ser validamente utilizado pelo empresário
para impedir que o consumidor celebre contrato ignorando parcialmente as
obrigações ou os direitos assumidos.
d) Interpretação
favorável ao consumidor - como o instrumento contratual é elaborado
unilateralmente pelo fornecedor, a lei (CDC, art. 47) estabelece que a sua
interpretação deve favorecer o consumidor, de modo que eventual tentativa de
redação ambígua ou obscura do contrato resulte ineficaz. Segundo este princípio,
se a disposição do contrato comportar mais de uma interpretação, a que trouxer
maiores vantagens ao consumidor deve ter preferência sobre as demais.
e) Execução
específica dos contratos de consumo - os contratos de consumo comportam
execução específica, ou seja, pode o juiz adotar toda e qualquer medida que
viabilize o atingimento do efeito concreto pretendido pelas partes. Em regra,
as obrigações de fazer decorrentes de contrato de consumo se resolvem em perdas
e danos, somente por opção do autor da demanda ou por impossibilidade material
da tutela específica ou de resultado prático correspondente (CDC,
art. 84). A mesma proteção é deferida a toda manifestação escrita de
vontade, recibos e pré-contratos (art. 48). Tanto o
empresário como o consumidor encontram-se sujeitos a esta regra, de
sorte que o primeiro pode, por exemplo, obter ordem judicial que o autorize a
realizar, por conta do consumidor, as revisões no bem vendido, se este último
assumiu a obrigação de as fazer.
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Convém notar, afinal, que
aos dois últimos princípios de tutela dos consumidores foram transformados, com
a entrada em vigor do Código Civil em 2003, em regras gerais do direito
contratual. Também os contratos cíveis, não 1 sujeitos
ao CDC, devem ser interpretados em favor do aderente (quando são j de adesão) e
comportam, em regra, execução específica (CC, arts.
423 e 475). 1
4.
PUBLICIDADE
Há três formas de
publicidade ilícita previstas pelo Código de Defesa do I Consumidor: a simulada,
a enganosa e a abusiva.
Publicidade simulada é a que
procura ocultar o seu caráter de propaganda. A veiculação da publicidade deve
ser feita de modo que o consumidor possa percebê-la, fácil e imediatamente,
adotando as cautelas próprias diante da natureza necessariamente parcial da
mensagem transmitida (CDC, art. 36). São exemplos de
publicidade simulada a inserção, em jornais e periódicos, de propaganda com a
aparência externa de reportagem, ou a subliminar, captável I pelo inconsciente,
mas imperceptível ao consciente.
O parágrafo único do art. 67
do projeto de CDC aprovado pelo Legislativo previa como crime a realização de
publicidade simulada, mas houve veto presidencial, e, assim, inexiste qualquer
tipo de sanção para essa hipótese de publicidade ilícita.
Publicidade enganosa é
aquela capaz de induzir o consumidor em erro. Na lei (CDC, art. 37, § l.°),
menciona-se a transmissão de informação parcial ou totalmente falsa, mas o
conceito não é correto. A publicidade pode ser falsa e não ser necessariamente
enganosa. Isso porque o instrumento principal da veiculação publicitária é a
mobilização do imaginário do consumidor, com o objetivo de tomar o produto ou
serviço desejado. Ora, o fantasioso (necessariamente falso) nem sempre induz ou
é capaz de induzir o consumidor em erro. A promoção, por exemplo, de um
chocolate por meio de filme publicitário com pessoas levitando ao consumi-lo
implica a veiculação de informações falsas (o produto não tem o efeito
apresentado), mas evidentemente é insuscetível de enganar o consumidor. Não é
necessário que exista dolo do fornecedor, para se caracterizar a enganosidade, Esta é aferida de modo objetivo, isto é, a
partir do potencial de enganosidade apresentado pelo
anúncio.
Já a publicidade abusiva
(CDC, art. 37, § 2.°) é aquela que agride os valores
sociais. O fabricante de armas não pode promover o seu produto reforçando a
ideologia da violência como meio de resolução de conflitos, ainda que esta
solução resultasse eficiente, em termos mercadológicos, junto aos segmentos da
sociedade composta pelos consumidores de armamentos. Também e abusiva a
publicidade racista, sexista, discriminatória e a lesiva ao meio ambiente. Na
avaliação da abusividade, no entanto, é necessário não confundir agressão a
valores sociais com desconfortos derivados de problemas pessoais. O palavrão, a
nudez, o erotismo não são necessariamente abusivos, dependendo do contexto de
sua apresentação pelo anúncio.
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Como se relaciona com os
valores socialmente aceitos, a publicidade considerada abusiva em determinado
momento histórico pode deixar de se em outro e vice-versa. Se, nos anos 1960,
era aceitável a publicidade de eletrodomésticos apresentando mulheres como as
únicas responsáveis pelas tarefas do lar, hoje em dia isto caracterizaria um
reprovável sexismo e abusividade.
A realização de publicidade
enganosa ou abusiva gera responsabilidade civil penal e administrativa. Assim,
o fornecedor que as promover deve indenizar material e moralmente o consumidor.
Além disso, respondera pela pratica de crime (CDC, art. 67) e deverá veicular
contrapropaganda, que destaca os efeitos do engano ou do abuso (arts. 56, XII, e 60).
Em virtude do princípio da
transparência, as informações precisas que o empresário veicula por meio da
publicidade integram o contrato que vier a ser celebrado com o consumidor (CDC, art. 30). Têm estas informações caráter vinculativo e
obrigam, também, aqueles que, embora não patrocinem a publicidade dela se
utilizam. É o caso do comerciante que reforça a propaganda do fabricante da
mercadoria. Anote-se, contudo, que apenas as informações suficientemente
precisas têm este caráter vinculativo. As genéricas podem eventualmente dar ensejo à
caracterização de algum tipo de publicidade ilícita, mas não constituem
condição de negócio.
Se o empresário negar
cumprimento ao veiculado pela publicidade, pode o consumidor exigir a
observância estrita das condições anunciadas ou optar por produto ou serviço
semelhante ou pela resolução do contrato com indenização (CDC,
art. 35). As mesmas consequências são previstas em relação à oferta ou
apresentação do produto ou serviço.